Será que o Objetivo na Áfricaé “Matar e Quebrar”?Reflexões de um historiador sobre o <strong>AFRICOM</strong>Tenente-Coronel Robert B. Munson, USAFR, PhDUM MANTRA comum dentro das forçasarmadas é que a missão é “matare quebrar”. Em última análise, asforças armadas formam uma organizaçãomuito bem suprida, dedicada à proteçãodos Estados Unidos, fuzilando inimigos edestruindo seus meios de combate. Foi o queocorreu durante as duas Guerras Mundiais.Mas, o que dizer do Vietnã ou mesmo da guerraatual no Iraque? Ganhamos no Vietnã <strong>ao</strong> finalda missão? Será que assim venceremos no Iraque?Embora esse slogan motive os militares, atarefa de “matar e quebrar”, na maioria das vezes,não é a missão que o governo transmite àsforças armadas.Gostaria de justapor essa visão a algo queme tocou durante a época em que passei naÁfrica Ocidental, na Embaixada dos EstadosUnidos em Abuja, Nigéria. Em dezembro de2001, durante as operações militares no Afeganistão,estava trabalhando no Gabinete deCooperação em Defesa. Além dos aspectos decooperação militar das funções, também supervisavaa execução de dois projetos de assistênciahumanitária que haviam iniciado commeus antecessores. Um desses projetos foi aconstrução de pequena ala para a maternidadeadministrada pela Igreja Católica nosarredores de Abuja. Quando chegou o momentode inauguração, ajudei a diocese a organizaruma grande festa. Um dos oradoresprincipais foi o Arcebispo local. Ao final dodiscurso, captou não só a atenção do público,como também a minha, quando declarou quenunca havia pensado que os militares norteamericanos“fizessem outra coisa além delançar bombas. Agora sei que também constroemclínicas para o povo.”Quebrar ou auxiliar? É questão importante,quando temos em mente a formaçãodo novo Comando Militar dos EUA na África(<strong>AFRICOM</strong>). O presidente Bush outorgou <strong>ao</strong>Secretário de Defesa, Robert Gates, a responsabilidadede criar o novo comando e o GeneralWilliam E. Ward foi nomeado seu primeirocomandante. O <strong>AFRICOM</strong> passou a funcionartotalmente como comando unificado independenteno dia 1º de outubro de 2008. Quebrarou auxiliar? Esses dois objetivos [díspares]da missão militar devem, <strong>ao</strong> final, chegar a umacordo sobre um propósito que a tudo engloba.Essa nova organização deve, em todosos casos, apoiar as metas traçadas pela políticaexterior do país. O ponto de vista do Arcebispoilustra como a política norte-americana receberáo benefício do novo <strong>AFRICOM</strong>, baseadoem operações multilaterais, mantendo as condiçõesda África em mente, excluindo a visãoantiga, um tanto errônea, dos militares comoorganização armada que existe apenas paralutar grandes guerras. A fim de apoiar essasoperações multilaterais o comando deve, defato, possuir uma estrutura interinstitucional enão organização militar, que inclui um punhadode participantes de outras agências. Éimperativo que as autoridades políticas competentesreconheçam esse fato e mudem aênfase da organização durante a fase inicial dedesenvolvimento do <strong>AFRICOM</strong>, antes que setorne uma organização militar solidificada ede vida própria, quando então será difícil alterarseu rumo.Por que? E Como?As duas questões importantes são “por que?”e “como?” a organização completa deve sercriada e estruturada. Já de início, o objetivodeve ser a elaboração de uma organização quenão só apoie a política exterior americana, mas46
SERÁ QUE O OBJETIVO NA ÁFRICA É “MATAR E QUEBRAR”? 47que também leve em consideração as condiçõessingulares do continente africano. Nãopodemos simplesmente adaptar uma estrutur<strong>ao</strong>u método de operações de outra parte domundo, com alterações mínimas (i.e., recriaro Comando Europeu ou o do Pacífico), semlevar em consideração a história, cultura e diversidaderegionais. Só então poderemos proporuma estrutura coerente e lógica.Por que necessitamos o <strong>AFRICOM</strong>? A respostapura e simples é “para apoiar a política americanana África”. Antigamente, a política norteamericanapara com a África, em todas as fasesdo governo, era desarticulada, devido <strong>ao</strong> fatode que poucos funcionários pensavam ser oContinente estrategicamente importante. Emboraisso possa mudar no futuro, não devemosantecipar grande transformação política. Significariaque os Estados Unidos colocariam delado a ênfase em laços tradicionais com a Europa,com maiores vínculos para com a Ásia econflitos no Oriente Médio. Uma vez não serprovável que isso aconteça, o melhor que sepode esperar é que a África venha a ser umelemento importante na esfera de interesseexpansionista americano no exterior. Certamenteum <strong>AFRICOM</strong> que coordenaria as diretrizesmilitares em todo o Continente seria valioso,mas é apenas pequeno elemento dainteração total da nação com a África.O ex-presidente Bush na Estratégia de SegurançaNacional de março de 2006, coloca oenfoque na África: “A estratégia é promover odesenvolvimento econômico e a expansão degovernos democráticos efetivos para que asNações Africanas assumam a liderança em reação<strong>ao</strong>s próprios desafios.” 1 Esses objetivosrepousam em eficaz interação de vários elementosda política externa, não apenas emforças armadas. Os países africanos democráticose economicamente prósperos não requeremmuita assistência de segurança e serãomelhores parceiros, quando necessitarmos deapoio em política ou outros setores. Assim, aconcentração exclusiva do <strong>AFRICOM</strong> na Áfricadeve ajudar a tecer muitos elementos dissimilaresda política externa do país em entidademais coerente. Entretanto, isso só é possívelquando a estrutura do <strong>AFRICOM</strong> incluir todosos elementos importantes dessa diretriz. 2Como estabelecer o <strong>AFRICOM</strong>? Aqui, a questãomais importante é a análise dos atuais e futurosmeios financeiros. O nosso governo, emgeral, possui orçamento limitado e um novocomando em área estrategicamente menosimportante (pelo menos do ponto de vista americano)provavelmente não seria diferente.Tudo indica que a importância da África oscilaráem função da política cotidiana. Contudo,para fins de consistência e planejamento, devemossupor, de forma realista, que os meiosfinanceiros serão limitados. Portanto, será imperativomaximizar a eficiência e cooperaçãocom outras nações. Incluiria os aliados europeuse amigos tipicamente mais próximos,como o Senegal e o Quênia, bem como as potênciasregionais da Nigéria e África do Sul,que conscientemente seguem os próprios interesses.Com esses dois fatores em mente,gostaria de propor dois princípios (ou “realidades”)sobre os quais estruturar o Comando:1. As tentativas e interesses americanos devemcoincidir com os dos aliados e parceirosnormais.2. Deve-se integrar o empreendimento militar<strong>ao</strong>s políticos e <strong>ao</strong>s de desenvolvimentoem todo o continente.<strong>No</strong>rmalmente, o segundo princípio deriva-sedo primeiro, <strong>ao</strong> levarmos em consideração arealidade dos recursos financeiros limitados.Essa suposição é especialmente valiosa, porqueforça o novo comando a trabalhar em sinergiadentro do governo do país e com osparceiros estrangeiros.Comando InterinstitucionalCom esses dois princípios em mente, a primeiraproposta é que a organização passe aevoluir a verdadeiro comando interinstitucional,sem permanecer como mera instituição militarcom certas problemáticas não-militares.Possuiria três componentes principais de similarimportância: o militar, o político e uma seçãodedicada <strong>ao</strong> desenvolvimento. Apesar dotítulo militar “comando”, bem como o enfoqueatual do Secretário de Defesa, devemosreorientá-lo para também incluir todos os elementosimportantes da política exterior. Se