Retorno_a_Historia_Do_Pensamento_Cristao_-_Justo_Gonzalez
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sincretismo religioso e um ecletismo político. Eles rejeitavam<br />
ainda a teoria segundo a qual os deuses haviam feito Roma poderosa,<br />
questionando, com isso, a própria visão que Roma tinha de si<br />
mesma e de sua história.<br />
<strong>Do</strong> mesmo modo, a afirmação de que o Senhor do Universo<br />
era um carpinteiro galileu, executado como subversivo pelas autoridades<br />
imperiais, punha em dúvida a justiça romana da qual as<br />
autoridades tanto se orgulhavam — embora se deva acrescentar<br />
que muitos cristãos se esquivavam dessas consequências culpando<br />
os judeus,e não os romanos, pela morte de Jesus. Pode-se supor<br />
que os ensinamentos de Jesus acerca dos pobres também tenham<br />
chegado aos ouvidos das autoridades. A inclinação de muitos<br />
cristãos para o pacifismo — e suas objeções ao serviço militar<br />
por outras razões — minavam a força de um Império que se via<br />
constantemente ameaçado pelos “bárbaros” em suas fronteiras®.<br />
A esperança cristã de um reino de Deus que suplantaria todos<br />
os reinos humanos e produziria verdadeira paz e justiça era uma<br />
crítica implícita à paz e à justiça de que os romanos se ufanavam.<br />
Portanto, as autoridades romanas não estavam tão erradas assim<br />
em perseguir o cristianismo. Como alguém já disse, “o movimento<br />
cristão era revolucionário, não porque tivesse o pessoal e os recursos<br />
para entrar em guerra contra as leis do Império Romano, mas<br />
porque criava um grupo social que produzia suas próprias leis e<br />
seus próprios padrões de comportamento”’.<br />
Disso se depreende que uma aproximação entre o cristianismo<br />
e o Império não poderia acontecer sem toda uma série de transformações<br />
no primeiro, no segundo ou em ambos. E é por isso que<br />
Eusébio se esforça para embotar os contrastes e, em particular,<br />
mostrar que as perseguições não tinham verdadeiro fundamento<br />
nos interesses do Império.<br />
C om o disse C elso, dirigindo-se a um cristão: “ [...] ainda que todos os hom ens façam com o<br />
tu, nada im pedirá que o im perador fique só e abandonado, que todos os bens da terra caiam<br />
sob o p oder dos bárbaros m uito iníquos e selvagens, e que já n ão se ouça falar na terra nem d a<br />
religião nem da verdadeira sabedoria” (O ngenes, Contra Celso, 8.68, op. cit., p. 675),<br />
’ R obert L. W ilken, The Christians as the Romans Saw Them, N ew H aven: Yale U niversity<br />
Press, 1984, p. 119.