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Retorno_a_Historia_Do_Pensamento_Cristao_-_Justo_Gonzalez

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Para ele, o importante é descobrir por trás da narrativa bíblica as<br />

verdades eternas que se escondem no simbolismo do texto. Apesar<br />

de nosso teólogo aparentemente não ter conhecido os escritos de<br />

Tertuliano, podemos estar seguros, com base no que ele mesmo<br />

nos diz em casos parecidos, que o literalismo do cartaginês lhe<br />

teria parecido semelhante demais àquele que atribuía aos judeus,<br />

carecendo da profundidade espiritual do verdadeiro filósofo cristão.<br />

Mas Tertuliano, por sua vez, responderia que aquilo que Orígenes<br />

pretende descobrir no texto bíblico, por meio de sua interpretação<br />

alegórica, é por demais parecido com o que os filósofos dizem, sem<br />

necessidade de texto bíblico algum.<br />

Justamente aqui se encontra o ponto fraco da interpretação alegórica:<br />

como é o intérprete que determina o simbolismo que deve<br />

ser achado nas Escrituras, o próprio intérprete também determina,<br />

por meio de sua própria seleção de símbolos, o que a Escritura deve<br />

dizer. Tal interpretação se assemelha ao mágico que introduz um<br />

coelho na cartola sem que ninguém o veja, para depois o tirar em<br />

meio ao assombro e admiração de todos. Quando se chega a esse<br />

ponto, o texto bíblico é reduzido à categoria de espelho no qual o<br />

intérprete enxerga sua própria imagem. Eis aí a razão pela qual o<br />

filósofo Orígenes encontra na Bíblia uma mensagem muito parecida<br />

com os ensinamentos dos filósofos platônicos’‘^<br />

Tipo C. De sua parte, Irineu aborda as Escrituras de um modo<br />

diferente dos de Tertuliano e Orígenes. A visão fundamental de<br />

Irineu a respeito de um Deus pastor que conduz seu povo através<br />

da história o leva a levar a narração bíblica muito a sério. É ela que<br />

testemunha essa obra de Deus que leva a cabo seus propósitos. Se a<br />

Bíblia se toma mera alegoria, não nos resta nada dessa obra nem de<br />

seu testemunho. O que a Bíblia nos ensina não é uma série de verdades<br />

eternas que poderíamos descobrir à parte de nossas circunstâncias<br />

históricas ou da revelação de Deus na história. O que a Bíblia<br />

nos ensina é, ao contrário, como Deus se relaciona com a humanidade<br />

— o que Irineu chama de “economia” divina^“ —, para onde<br />

” N este p o n to , talv ez não seja excessiv am en te severo o ju íz o de H an so n : O ríg en es “faz<br />

da B íblia um jo g o de palavras cruzadas divino cuja solução se esconde no seio do próprio<br />

O rígenes” (op. cit., p. 248).<br />

“ A, B enoit, op, c it, p. 219-27.

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