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— Mil desculpas, mil desculpas — murmurou fracamente —, mas hoje estou
sem qualquer moeda de cobre ou de prata. Me dê mais um tempo.
— Ora, vamos lá — insistiu Dabasir. — Então não pode arranjar algumas
moedas de cobre e uma moeda de prata para pagar pela generosidade de um
velho amigo de seu pai, que o ajudou quando você se achava necessitado?
— Ainda não lhe paguei porque o azar tem me perseguido.
— O azar! Não responsabilize os deuses por sua própria fraqueza. O azar
persegue todo homem que pensa mais em pedir emprestado do que em pagar.
Venha fazer-me companhia, rapaz, enquanto almoço. Estou com fome e quero
contar-lhe uma história.
Tarkad vacilou devido à franqueza brutal de Dabasir, mas aqui estava
finalmente um convite para entrar na casa de pasto.
Dabasir conduziu-o até um dos cantos da sala, onde se sentaram sobre
pequenos tapetes.
Quando Kauskor, o proprietário, apareceu sorrindo, o negociante de camelos
dirigiu-se a ele com a familiaridade de sempre.
— Gordo lagarto do deserto, traga-me uma perna de cabra bem tostadinha, com
muito molho, pão e todas as verduras que tiver, pois estou com fome e preciso de
muita comida. Não esqueça de meu amigo aqui. Traga para ele um copo d'água.
Bastante fria, por favor, pois está fazendo um calorbabilônico.
Tarkad quase sentiu um desfalecimento. Devia ficar ali, bebendo água,
enquanto o outro devorava diante de seus olhos uma perna de cabra inteira? Não
disse nada. Não pensava em nada que pudesse dizer.
Dabasir, entretanto, não sabia o que era o silêncio. Sorrindo e acenando com
naturalidade para os outros fregueses, que o conheciam, continuou:
— Ouvi de um viajante recém-chegado de Urfa informações sobre um homem
muito rico que tem uma peça de pedra cortada tão fina que se pode ver através
dela. Ele colocou-a na janela de sua casa para barrar a chuva. Segundo o
viajante, é amarela, e, quando ele mesmo olhou através dela, todo o mundo do
outro lado pareceu-lhe estranho e diferente da realidade. O que diz sobre isso,
Tarkad? Acha que o mundo pode parecer a alguém de uma cor diferente
daquela que normalmente possui?
— Ouso dizer que sim — respondeu o jovem, mais interessado na gorda perna
de cabra que acabavam de colocar na frente de Dabasir.
— Bem, sei que isso pode ser verdade porque eu mesmo vi o mundo numa cor
totalmente diferente daquela que ele geralmente apresenta, e a história que vou