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traz as marcas de suas lutas consigo mesmo; ele não era nenhum São Paulo. E a veia <strong>da</strong><br />
tempestuosi<strong>da</strong>de morbi<strong>da</strong>mente excessiva com que ele amparava sua fé cristã tinha sua<br />
origem numa autopunição: nunca ousava afrouxar o freio sobre seus próprios sentimentos<br />
e impulsos, nem podia ficar à vontade na companhia de publicanos e pecadores.<br />
A conversão de Agostinho ao cristianismo tinha raízes pessoais remotas; não somente<br />
vinha ao encontro de todos os seus anseios de ordem espiritual, mas o punha, além disso,<br />
em condições de voltar ao regaço materno, ao qual ansioso seio ele se via plenamente<br />
restituído pelo fato de abraçar o cristianismo. Porém sua conversão, apesar de tudo, não<br />
deixava de ser um gesto heróico <strong>da</strong> parte de um homem no auge de seu vigor sexual e<br />
intelectual: exigia uma dupla renúncia. Sua atitude implacável diante <strong>da</strong> amante, que era<br />
mãe de seus filhos, mostra bem a força exigi<strong>da</strong> pela conquista; essa separação foi em sua<br />
vi<strong>da</strong> um episódio difícil.<br />
Não é assim, de estranhar que os livros que ele escreveu já no fim de sua maturi<strong>da</strong>de<br />
ain<strong>da</strong> denunciem a vibração de suas antigas paixões; e não se pode deixar de sentir a<br />
violência e o tumulto de seu coração, batendo em fortes ritmos à medi<strong>da</strong> que se vai<br />
convertendo em majestosa retórica.<br />
Agostinho foi um dos maiores pensadores do cristianismo e, talvez, tenha sido o autor que<br />
mais tenha influenciado não só o pensamento, mas a própria cultura ocidental. A partir <strong>da</strong><br />
leitura de Plotino, Agostinho abandona sua visão materialista e sua concepção<br />
maniqueísta do mal, como sendo uma reali<strong>da</strong>de que subsistia em si mesma. O<br />
neoplatonismo o fez ver o mundo e o homem sob um prisma totalmente novo e o predispôs<br />
a compreender e aceitar a ver<strong>da</strong>de revela<strong>da</strong> pelo cristianismo. A fé em Cristo transformou<br />
completamente sua vi<strong>da</strong>; ela se tornou o horizonte não só de seu viver, mas também de<br />
seu pensar. Viver para ele era viver a fé, a ver<strong>da</strong>de revela<strong>da</strong>. Para ele viver a dimensão<br />
divina era a mesma coisa que viver a dimensão humana porque pelo batismo o homem se<br />
diviniza. Por isso, o filosofar, o explicitar do sentido de nossa existência, só podia<br />
acontecer a partir e dentro dessa experiência viva <strong>da</strong> fé. A razão para Agostinho era muito<br />
importante, mas em caso de conflito entre ver<strong>da</strong>de racional e a ver<strong>da</strong>de revela<strong>da</strong>, sempre<br />
esta tinha primazia sobre aquela.<br />
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claudiordutra@hotmail.com