12No caso do tráfico internacional <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> para fins <strong>de</strong> exploração sexual, ou seja, o tráficoque ocorre do Brasil para o exterior, as mulheres e meninas são as maiores vítimas. Mesmoas <strong>pessoas</strong> que vão para o exterior sabendo que irão trabalhar no mercado do sexo, ao chegarema outro país, elas se <strong>de</strong>param com situações <strong>de</strong> trabalho bem diferentes daquelasque foram propostas. Muitas vezes são enganadas e submetidas a condições <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>liberda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> exploração que caracterizam trabalho forçado e escravo, e que <strong>de</strong>finem asituação <strong>de</strong> tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>. Há casos nos quais os passaportes das vítimas são retidos eelas são submetidas a um regime <strong>de</strong> servidão por dívida 8 para pagarem os custos da viagem(emissão <strong>de</strong> passaporte, passagem etc.), ou seja, trabalham por um período <strong>de</strong> tempo semreceber nenhuma remuneração. Em outras situações, mulheres e meninas são enganadassobre que tipo <strong>de</strong> trabalho realizarão no exterior. Recebem propostas falsas para trabalharemcomo mo<strong>de</strong>los, dançarinas, garçonetes e trabalhadoras domésticas e acabam sendocolocadas em uma situação <strong>de</strong> exploração sexual 9 .Uma questão importante na configuração do tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> é o consentimento,ou seja, a concordância da pessoa em submeter-se a <strong>de</strong>terminada situação. O Protocolo<strong>de</strong> Palermo faz uma diferenciação neste quesito entre crianças e adolescentes<strong>de</strong> um lado, e adultos, <strong>de</strong> outro. Segundo o Protocolo, para crianças e adolescenteso consentimento é consi<strong>de</strong>rado irrelevante para a configuração do tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>.Para adultos, o Protocolo <strong>de</strong> Palermo consi<strong>de</strong>ra o consentimento relevante. Assim,se em um <strong>de</strong>terminado caso for comprovado que a pessoa traficada concordou coma situação com a qual estaria sendo submetida, po<strong>de</strong>ria haver a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>exclusão da responsabilização <strong>de</strong> crime <strong>de</strong> tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>. A menos que fossecomprovada ameaça, coerção, frau<strong>de</strong>, abuso <strong>de</strong> autorida<strong>de</strong>, abuso <strong>de</strong> situação <strong>de</strong>vulnerabilida<strong>de</strong>, bem como a oferta <strong>de</strong> vantagens para quem tenha autorida<strong>de</strong> sobreoutrem.A Política Nacional <strong>de</strong> Enfrentamento ao Tráfico <strong>de</strong> Pessoas do Brasil diferencia-se doProtocolo <strong>de</strong> Palermo nesse sentido, pois compreen<strong>de</strong> que consentimento também éirrelevante para adultos, ou seja, mesmo que a vítima <strong>de</strong>monstre concordar com a situação<strong>de</strong> tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>, as <strong>pessoas</strong> envolvidas po<strong>de</strong>rão ser responsabilizadas porfacilitarem, promoverem ou, <strong>de</strong> fato, realizarem o tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>.Devemos nos questionar se o consentimento realmente reflete uma escolha livre ou umasubmissão voluntária <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um esquema <strong>de</strong> dominação naturalizado, no qual ofato <strong>de</strong> se obter consentimento anula quase toda responsabilida<strong>de</strong> do opressor. Dessaforma, a posição da Política Nacional <strong>de</strong> Enfrentamento ao Tráfico <strong>de</strong> Pessoas parte doprincípio <strong>de</strong> que ninguém po<strong>de</strong> consentir em ser traficado, pois ninguém faz uma opçãopor ser explorado ou escravizado, nem por renunciar aos seus <strong>direitos</strong> <strong>humanos</strong>.No caso do tráfico interno para fins <strong>de</strong> exploração sexual, ou seja, o tráfico que ocorre <strong>de</strong>ntrodo País, a maioria das vítimas é <strong>de</strong> crianças e adolescentes cujas famílias estão em situação <strong>de</strong>pobreza. É importante <strong>de</strong>stacar, ainda, que o trabalho doméstico também é uma ativida<strong>de</strong> naqual são encontradas situações <strong>de</strong> tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> para fins <strong>de</strong> trabalho forçado e escravo.8NAÇÕES UNIDAS. Organização Internacional do Trabalho. Conferência Internacional do Trabalho. 89ª Reunião. Não ao TrabalhoForçado. Relatório Global do Seguimento da Declaração da OIT Relativa a Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. 2001.9NAÇÕES UNIDAS. Organização Internacional do Trabalho. Tráfico <strong>de</strong> Pessoas para Fins <strong>de</strong> Exploração Sexual. 2. ed. Brasília:OIT, 2006, p.13.CIDADANIA, DIREITOS HUMANOS E TRÁFICO DE PESSOASManual para Promotoras Legais Populares2ª edição revisada e ampliada
13No Brasil, a exploração <strong>de</strong> crianças e adolescentes no trabalho infantil doméstico ainda é umproblema grave presente em diferentes regiões do País e, muitas vezes, as vítimas são traficadas<strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> para outra. Situações também já foram <strong>de</strong>tectadas envolvendo mulheresadultas contratadas como trabalhadoras domésticas em outros países.Os homens também são vítimas do tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> no Brasil e são explorados em trabalhosrealizados em condições <strong>de</strong> escravidão. Geralmente são homens pobres que, em função danecessida<strong>de</strong> do sustento da família, acreditam em falsas promessas <strong>de</strong> emprego em regiõesisoladas do País, principalmente na área da Floresta Amazônica. Há casos, ainda, <strong>de</strong> trabalhoforçado e escravo em gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s brasileiras, com a exploração <strong>de</strong> trabalhadores e trabalhadoras<strong>de</strong> países como a Bolívia e o Peru. Essas situações têm sido mais encontradas nacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, geralmente em oficinas <strong>de</strong> costura.TRÁFICO DE PESSOAS E MIGRAÇÕESSão três as formas pelas quais as <strong>pessoas</strong> po<strong>de</strong>m se <strong>de</strong>slocar para <strong>de</strong>ntro ou para fora do País:migração, contrabando <strong>de</strong> migrantes e tráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>. Essas três modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamento<strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> possuem diferenças fundamentais.A migração é o <strong>de</strong>slocamento <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> para residir em outro lugar. A migração po<strong>de</strong> serinterna, no próprio país, ou internacional, para outro país. Migrar é um direito humano. AConvenção Americana sobre Direitos Humanos 10 prevê o direito à circulação e residência eestabelece que “toda pessoa tem direito <strong>de</strong> sair livremente <strong>de</strong> qualquer país, inclusive do próprio”(ar tigos 2 e 22), bem como estabelece toda uma série <strong>de</strong> proibições rela tivas a práticascontrárias aos <strong>direitos</strong> internacionalmente reconhecidos como <strong>direitos</strong> das <strong>pessoas</strong> estrangeirasresi<strong>de</strong>ntes (artigos 5, 6, 8, 9 e 22).Diversos fatores po<strong>de</strong>m estimular que as <strong>pessoas</strong> mu<strong>de</strong>m <strong>de</strong> seu lugar <strong>de</strong> origem como apobreza, violência, perseguição, guerras, secas e a falta <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s e tentem construira vida em outro local que apresente um cenário mais favorável, como as expectativas <strong>de</strong> emprego,segurança ou mesmo a proximida<strong>de</strong> <strong>de</strong> familiares.Quando as <strong>pessoas</strong>, objetivamente ou subjetivamente, não têm outra escolha para garantirsua integrida<strong>de</strong> física a não ser migrar, fala-se em migração forçada.O contrabando <strong>de</strong> migrantes ocorre quando <strong>pessoas</strong> são impedidas <strong>de</strong> entrar legalmenteem um país e outras as ajudam (por pagamento ou não) a atravessar a fronteira. É consi<strong>de</strong>radapela legislação <strong>de</strong> muitos países como uma forma irregular <strong>de</strong> migração. Nesse caso, os/asmigrantes po<strong>de</strong>m ser acusados/as <strong>de</strong> <strong>de</strong>srespeito às leis migratórias do país no qual entrarame po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>portados/as para seus países <strong>de</strong> origem.Quando a migração consiste no <strong>de</strong>slocamento <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong> por meio do engano, coerção, coaçãoou abuso da situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>, com o objetivo <strong>de</strong> exploração, falamos emtráfico <strong>de</strong> <strong>pessoas</strong>.10Também conhecida como Pacto <strong>de</strong> São José da Costa Rica, entrou em vigor no Brasil por meio do Decreto nº 678, <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong>novembro <strong>de</strong> 1992.CIDADANIA, DIREITOS HUMANOS E TRÁFICO DE PESSOASManual para Promotoras Legais Populares2ª edição revisada e ampliada
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