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ANO 1
Nº 2
JUNHO/JULHO
2021
RONALDO MAGALHÃES
Salvador-Bahia
Mestre dramaturgia
(UFBA). Escreve
poesias,
artigos, ensaios, contos, roteiros.
Participou de várias
antologias. Colabora: Jornal
Fuxico-UEFS; Soteroprosa
Olhares Contemporâneos;
SG Magazine-Portugal.
CAFÉ MÜLLER
Na cidade nua |o café vazio| submerge na penumbra.
Há cadeiras, mesas. Cadeiras e mesas. Há cadeiramesas desordenadas no caos.
Caosss completamente árido e despovoado, onde o silêncio e a solidão reinam.
De súbito, tateando as paredes cinzentas, ela titubeia contida.
A outra em constante movimento rumo ao desconhecido, dá volteios na escuridão. Se desprende
e se esbarra.
Ele a protege.
Ela e seu duplo, no fluxo cadenciado, se projeta no espaço e, desbrava os limites do instante
numa relação solene de embalo sonoro, trágico e intenso-profundo.
O moço gentilmente segue a rearranjar o espaço como num preâmbulo amoroso para o reencontro
ad infinitum.
Ela se aventura no vácuo.
No
encontro
moldam-se
movimentos.
Eles se encontram todos os dias, no mesmo lugar, na mesma hora.
Eles se encontram, todos os dias, no mesmo lugar, na mesma hora.
Eles, se encontram todos os dias no mesmo lugar na mesma hora
Eles se encontram...
Marionetes do desejo.
Ele quer partir. Ela, perdida, atravessa o real e com pressa, não flui a vida.
Ele pede o café para dois.
As portas do tempo giram vertiginosamente e corroem, corroem, corroem...
Dor e solidão.
Corpos moventes fluem, volitam, extenuam-se em espasmos profundos no cumprimento do
dever cotidiano. São tormentos em tempos de sonhos.
Respiram num átimo o princípio do prazer.
Provocam, atiçam, insistem e suportam [a vã tentativa de serem imortais].
Os corpos mergulham numa catarse de gestos divinos, porém óbvios. Corpos vagabundos que
se entregam ao acaso, frenéticos, numa confusa fronteira do devir, plasmada no aqui e agora
de uma existência.
Passagem dilacerante que asfixia mais do mesmo entre confrontos e ardis.
Limite entre o jogo e o não-jogo que é espelho do real imaginado.
Metas, fases, metamorfoses.
Eles, porém, impávidos, seguem a caminho do fim.
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