01.06.2021 Views

Traços 2

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

ANO 1

Nº 2

JUNHO/JULHO

2021

GERALDO MAGELA

DE FARIA

Belo Horizonte - MG

O ESPELHO DE BRANCA

enquanto dure’. Assim, outros como Zé Humberto,

Moacir, Alfredo etc., e põe et cetera aí,

atestam o tal do ‘dedo podre’, como costumam

dizer”.

Branca ficou chateada até porque o espelho tinha

sido tão sincero a ponto de ser rude com

ela. Mas, depois do almoço, mais calma, voltou

até ele e disse: “Seu espelho”, sendo logo interrompida:

“Espelho não, meu nome é Nestor,

escolhido carinhosamente por sua mãe. Que, a

propósito, me procurava muito pouco. Fui seu

conselheiro. Por exemplo, quando ela quis se

se separar de seu pai, que a traiu com outra,

eu a convenci e as coisas se ajeitaram. Quando

o Juninho foi para o exterior, provei que era o

melhor para ele. Por ocasião do seu casamento,

com que ela não concordava, dei alguns conselhos,

usei palavras de estímulo. Não ficava bem

para um consulente do meu gabarito, mas” ...

Foi aí que ela notou que seu rosto havia mudado

e continha a figura de... um psiquiatra com

divã e tudo. Ante o susto de Branca, ele disse,

com voz grave e pausada, bem diferente da voz

caricata do bonequinho: “Vi que a amiga precisa

não de um conselheiro e, sim, de um especialista

na mente humana. Talvez agora possa ajudar

mais”. E Branca disse que queria saber se,

algum dia, encontraria um grande amor. Nestor

pediu para pensar e que o procurasse na manhã

seguinte.

E, de novo, lá estava Branca. Novo susto, quando

viu Nestor, agora com um turbante, um rosto

com barba e bigode com pontas. E ele disse,

com outro tipo de voz: “Cheguei à conclusão de

que você precisa é de um vidente, por isso trouxe

minha bola de cristal”. Em seguida, fez movimentos

com braços e mãos e, apontando para

Branca, asseverou: “Ainda hoje você conhecerá

o homem de sua vida”. Branca se assustou, disse

um obrigado nada convincente e ficou pensativa.

Se nem pensava em sair, como conheceria

um homem naquele mesmo dia?

Lá pelas duas da tarde, tocou a campainha; ela

atendeu e, surpresa, deparou com um homem

de cinquenta e poucos anos, alto, olhos azuis,

como se tivesse Sinatra à sua frente. Vendo sua

reação, ele disse: “Muitos me acham parecido

com ele. E meu nome ainda é Francis”.

Ela o convidou a entrar e ouviu sua história recente.

Veio de Porto Alegre, com a missão de

dirigir a área de negócios internacionais da multinacional

em que trabalhava. Passou a ocupar

o apartamento vizinho ao dela, já mobiliado,

reservado pela empresa. Desde que se separou

da esposa, pensava em mudar de cidade. Só que

não conhecia nada em Belo Horizonte e perguntou

se, no início, poderia ajudá-lo.

Claro que a resposta foi positiva. Primeiro, o

supermercado, depois o shopping, pois queria

comprar ternos para assumir o novo cargo na

empresa. Um jantar em um restaurante e, após,

ele, meio sem jeito, comentou que uma das músicas

mais famosas do Sinatra era Strangers in

the Night. Como na canção, os dois ainda eram

estranhos um ao outro, mas a noite estava linda,

convidativa... Ela entendeu, concordou e

foram a um motel. No dia seguinte, combinou

com ele de mostrar-lhe a cidade.

Antes de dormir, foi procurar o espelho. De

novo como Nestor, que, surpreendendo-a mais

uma vez, surgiu com uma trouxinha nas costas,

como quem estava indo embora, por já ter

cumprido sua missão com ela. Desapareceu, de

repente, e Branca não o encontrou mais.

Logo no início da manhã de domingo, Branca

tocou o interfone no prédio da Sílvia para entregar-lhe

o espelho. A ex-vizinha, cinquenta e

cinco anos, bonita, sozinha, inteligente, história

semelhante à dela. Só que, a partir de agora,

com o Nestor...

62

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!