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ANO 1
Nº 2
JUNHO/JULHO
2021
PAULO RAS
PARANAGUÁ - PR
Utópico, tem certeza
de que a arte salva,
a literatura liberta
e a cultura oferece
meios para que cada pessoa
se entenda, para que cada um
ouça e decifre o grito contido
na própria voz.
OLÍVIA
Eu poderia ter
desfeito o nó
na gravata e
ter te esperado
cru no espaldar
da cama desarrumada.
Mas neguei a mim
mesmo este desfrute
feito para os tolos e
para os fracassados.
Tenho em meu sangue a genética da prole Albuquerque Vilemond, não me dou
por cansado nem por vencido, afinal o ouro é o meu deus, meu Jeová, minha
profissão de fé. Eu poderia ter afrouxado o cinto, sentado no sofá de couro de
bisão-europeu, enchido meu copo com uma bela dose de Ouzo e esperado o
mundo se achegar a mim. Porém fiquei alerta, atento. Bolsa, dólar, juros, euro. A
vida é essa avalanche de cifrões fazendo cachoeira sobre o meu corpo enquanto
entro na sauna para aproveitar mais um instante de negócios. Eu poderia ter tirado
a roupa e dormido o sono dos justos, contudo os justos padecem na pobreza,
enquanto nós, os focados, esperamos a abertura das bolsas de Tóquio e a de
Shanghai. A vida é essa eterna roda da fortuna que esmaga os desafortunados.
Eu poderia... Está me ouvindo, Olívia? Olívia? Está me ouvindo?
O ressonar da mulher ecoou mais alto na vaidade do homem do que no quarto
vazio de motel. Tentou acordá-la. Perda de tempo. Sono profundo, enrodilhada
na roupa que nem se dera ao trabalho de tirar. Praxedes a cobriu. Beijou sua
testa. Deixou o dinheiro combinado e um extra pela noite que ela perdera. Ele
poderia muito, ele poderia tudo, menos com Alice, a Olívia que dormia cansaços
e solidões em um corpo sem dono, em um coração livre que nem mesmo Praxedes
de Albuquerque Vilemond poderia comprar.
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