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(Projecção de slides relativos a diversas obras).<br />
As obras que vos trago foram concebidas utilizando diversas técnicas e materiais.<br />
Na maioria dos meus trabalhos parto do papel como suporte para desenvolver a<br />
obra na tela. É um processo talvez não muito usual, o de não pintar directamente<br />
sobre a tela. Começo a criar através do papel; despoleto reacções através do uso de<br />
materiais de algum modo “incompatíveis”, como óleos, acrílicos, tintas industriais,<br />
vernizes sintéticos e diluentes; deixo-os agir e reagir, actuando entre si e no papel,<br />
até aquele instante em que determino que “é”, e paro o processo de acção e<br />
deterioração do acaso controlado. Procedo depois à colagem, na sua totalidade ou<br />
fragmentada - em módulos, como um puzzle – e componho.<br />
Com as sobreposições de papeis, vou criando uma outra dimensão, que não é possível<br />
apenas com a tela e as tintas, já que, durante o processo de colagem e reacções<br />
aos diferentes materiais, são criadas texturas, rugosidades, reentrâncias e saliências…,<br />
que têm um objectivo e das quais tiro partido.<br />
Intervenho também desenhando, normalmente elementos pictóricos de forte carga<br />
simbólica.<br />
E de novo um composto químico de materiais com características e reacções diferentes,<br />
até que as marcas deixadas sejam as pretendidas.<br />
Noutros trabalhos utilizo escorrências de tinta, como motivos para uma escrita<br />
aparentemente espontânea. Sobreponho camadas e direcciono os percursos que a<br />
tinta irá traçar, para que, no final, a ideia de texto subjaza.<br />
Também trabalho directamente sobre a tela, mas sempre através de processos que<br />
impliquem uma acção aparentemente acidental, como um acaso; como o acaso que<br />
rege as leis do universo.<br />
Agrada-me bastante este fenómeno, pois, por um lado, ele proporciona-me um<br />
ponto de partida – manchas, marcas inscritas na tela ou no papel que são a origem,<br />
que me inspiram sentidos e uma continuidade.<br />
Por outro lado, confere à obra uma ideia de acção da Natureza. É como se o processo<br />
fosse natural. A obra nasce do espontâneo, como é espontânea a Natureza. E<br />
isso tem a ver com a concepção da obra de arte como algo que emerge. A obra<br />
surge, emerge dos fundos da inspiração do ser e depois, sim, depois há o processo<br />
de racionalização.<br />
O resultado de todo este processo com diferentes tempos e durações, reflecte, também<br />
ele, o tempo, o passar do tempo pelas coisas. A tela ganha cicatrizes, sulcos<br />
como rugas, fendas. Poeiras, vapores e fluidos como que envolvem o espaço e os<br />
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