Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
142<br />
<strong>CACO</strong> - <strong>90</strong> anos <strong>de</strong> História Série <strong>Memorabilia</strong> - <strong>UFRJ</strong><br />
da Declaração Universal dos Direitos do<br />
Homem. Esse <strong>de</strong>creto vigorou 10 anos no<br />
Brasil, <strong>de</strong> 69 a 78. Em 78, surgiu a Lei <strong>de</strong><br />
Segurança Nacional que estabelecia o<br />
seguinte, que essa incomunicabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
10 dias seria reduzida para oito dias. Alguns<br />
setores consi<strong>de</strong>raram isso um gran<strong>de</strong><br />
avanço! Agora vocês imaginem uma<br />
pessoa, um cidadão, levado para a masmorra<br />
da ditadura, incomunicável por 10 ou<br />
oito dias! 3 Nós sabemos que uma pessoa<br />
só po<strong>de</strong> ser presa em flagrante <strong>de</strong>lito ou<br />
mediante or<strong>de</strong>m da autorida<strong>de</strong> judiciária<br />
competente. Acho que as faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
Direito do país inteiro <strong>de</strong>veriam fazer um<br />
estudo <strong>de</strong>sse Decreto-lei, convocar juristas<br />
para esclarecer bem isso nas faculda<strong>de</strong>s,<br />
porque é esta falta <strong>de</strong> consciência que leva<br />
à prática <strong>de</strong> tais abusos. Acho que esse<br />
<strong>de</strong>creto resume a situação vivida pelo país.<br />
A outra lei, a Lei 6.620, durou <strong>de</strong> 78 até<br />
83. Então, o país ficou <strong>de</strong> 69 a 83 sob a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma pessoa ser presa<br />
nessas condições. Isso é uma barbárie.<br />
Quer dizer, o país não respondia sequer à<br />
Declaração Universal dos Direitos do<br />
Homem. Lembro quando o Brandão<br />
Monteiro foi preso, por volta <strong>de</strong> 70. Eu era<br />
advogado, Brandão também, e se encontrava<br />
no nosso escritório o Walter Oaquim.<br />
4 Brandão foi preso sem estar em flagrante<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, sem mandado <strong>de</strong> prisão.<br />
Foi levado para um estabelecimento militar<br />
e <strong>de</strong>pois foi brutalmente torturado. A verda<strong>de</strong><br />
é que o país atravessou um período<br />
<strong>de</strong> covardia inominável, porque nós não<br />
tivemos condições, e é importante fazer esta<br />
autocrítica, nem <strong>de</strong> sustentar uma <strong>de</strong>mocracia<br />
liberal.<br />
<strong>CACO</strong>: Sobre esse assunto, o senhor fez<br />
um discurso que, durante as comemorações<br />
dos 85 anos do <strong>CACO</strong>, lembraram a<br />
história da luta pela <strong>de</strong>mocracia, uma<br />
história <strong>de</strong> coragem, <strong>de</strong> pessoas e atitu<strong>de</strong>s<br />
corajosas.<br />
FB: Eu acho que existe uma coragem individual,<br />
que a gente po<strong>de</strong> chamar <strong>de</strong> coragem<br />
<strong>de</strong> pit-bull, mas existe uma outra, é<br />
a coragem <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r princípios. Essa é<br />
muito importante. Não é uma coragem típica.<br />
É algo espiritual, uma coragem muito<br />
mais <strong>de</strong>sprendida. Defen<strong>de</strong>r a <strong>de</strong>mocracia<br />
e a liberda<strong>de</strong>, lutar contra a opressão, lutar<br />
contra a tortura, enfim, lutar por um mundo<br />
melhor. Essa é a gran<strong>de</strong> coragem. As<br />
pessoas não po<strong>de</strong>m abrir mão <strong>de</strong>sses<br />
princípios. Hoje se fala muito em cidadania,<br />
mas fala-se muito mais <strong>de</strong> um Direito do<br />
Consumidor do que daqueles da cidadania.<br />
Essa questão política no Brasil, hoje, está<br />
sufocada. E isso precisa ser revertido. As<br />
pessoas têm que compreen<strong>de</strong>r a importância<br />
da <strong>de</strong>mocracia e <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r não uma<br />
<strong>de</strong>mocracia formal, mas uma <strong>de</strong>mocracia<br />
social.<br />
<strong>CACO</strong>: Houve durante o seu ingresso na<br />
faculda<strong>de</strong>, uma gran<strong>de</strong> polarização entre<br />
os estudantes entre a Reforma e a Aliança<br />
Libertadora Acadêmica (ALA). Como<br />
era a postura <strong>de</strong>ssas forças diante da ditadura<br />
militar?<br />
FB: Na época, eu representava um grupo<br />
<strong>de</strong> alunos organizados da faculda<strong>de</strong> que<br />
queriam enfrentar a ditadura. Com a polarização,<br />
o ambiente da faculda<strong>de</strong> se tornou<br />
um ambiente <strong>de</strong> <strong>de</strong>lação. A ALA queria<br />
<strong>de</strong>latar colegas, queria que colegas fossem<br />
expulsos. Foi por esse motivo que<br />
começamos a nos organizar para criar<br />
uma resistência. E convocávamos assembléias.<br />
Essa questão me incomodou tanto,<br />
que eu cheguei até a falar nas escadas da<br />
entrada da faculda<strong>de</strong> com uma metralha-<br />
D 3 Lei n o 6.620, <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1978.<br />
D 4 Sobre Walter Oaquim, v. entrevista p. 127.