Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
Memorabilia CACO 90 ANOS de HISTORIA - UFRJ
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
216<br />
<strong>CACO</strong> - <strong>90</strong> anos <strong>de</strong> História Série <strong>Memorabilia</strong> - <strong>UFRJ</strong><br />
gitimida<strong>de</strong>. Depois fomos proibidos <strong>de</strong> entrar<br />
também. Era uma maluquice, eu quase<br />
fui presa não sei quantas mil vezes na porta<br />
da faculda<strong>de</strong>. Um <strong>de</strong>sgaste filho da mãe.<br />
<strong>CACO</strong>: Como era a Direção da FND?<br />
MACR: O diretor, Hélio Gomes era um louco,<br />
um tarado. Ele babava quando nos via.<br />
Era um histérico.<br />
<strong>CACO</strong>: Conte um pouco mais sobre sua<br />
prisão em São Paulo.<br />
MACR: Sobre a troca com o embaixador<br />
norte-americano eu não sabia <strong>de</strong> nada,<br />
porque estava isolada, numa cela solitária,<br />
no pavilhão <strong>de</strong> presos comuns. Tenho muitas<br />
histórias sobre esse período; eu tinha<br />
um companheiro, na cela ao lado, cujo apelido<br />
era “Tortura”. Eu nunca o vi. A gente<br />
se falava pelo boi, o buraco <strong>de</strong> fazer xixi.<br />
Eles me apelidaram <strong>de</strong> “Política”. Tortura<br />
era falador, me distraía muito, porque eu<br />
não tinha nada para fazer e sentia dor por<br />
todo corpo. Os presos ficavam muito revoltados<br />
com tudo aquilo que se passava<br />
ali, aqueles homens “grandões”, pegarem<br />
uma menina, levarem para torturar e jogar<br />
lá <strong>de</strong> volta. Eles gritavam e xingavam na<br />
hora que me tiravam da cela. Os políciais<br />
diziam que iam dar porrada, jogavam água.<br />
Uma vez, o Tortura me acordou falando: –<br />
“Política, mataram um <strong>de</strong> vocês!” Ele não<br />
sabia ler, só soletrar. Pedi, então, para ele<br />
soletrar e ele começou: “H, O”. E eu pensava:<br />
“Horácio..., Homero... Ai meu Deus,<br />
nome estranho...” Eu pedia para ele ler as<br />
letras certinhas e o nome era Hochimin. Eu<br />
<strong>de</strong>satei a chorar, e contei para ele quem<br />
havia sido Hochimin. Depois <strong>de</strong> contar a<br />
vida toda <strong>de</strong>le, Tortura disse: “Vocês são<br />
mesmo tudo doido”. Foi ele que me disse,<br />
no dia seguinte, que estava havendo algum<br />
problema, porque haviam dobrado o<br />
número <strong>de</strong> policiais da guarda. Eu tinha<br />
pedido para ele me avisar sempre que houvesse<br />
algum movimento <strong>de</strong> tropa. Eu fiquei<br />
aguardando e, naquele dia, o Tortura não<br />
tinha conseguido jornal, mas <strong>de</strong>pois disse<br />
que iriam tirar ele <strong>de</strong> lá, para me isolar totalmente.<br />
Tinham uns homossexuais que<br />
faziam a limpeza, para quem eu tinha dado<br />
tudo o que tinha quando cheguei na<br />
ca<strong>de</strong>ia. Eles pegaram, na administração,<br />
tudo que era meu, e conseguiam coisas<br />
como uma latinha <strong>de</strong> café e outras coisinhas,<br />
porque eu passava muita fome lá.<br />
Um <strong>de</strong>les me disse: “O negócio tá feio pro<br />
seu lado. Ouvi o teu nome no meio <strong>de</strong> um<br />
monte <strong>de</strong> caras diferentes, fardados com<br />
outra farda”. Eu pensei que tinha ocorrido<br />
um contragolpe, alguma coisa assim,<br />
porque tinha saído no jornal que Costa e<br />
Silva estava doente. Sabia, por meio do Tortura,<br />
que lia as manchetes para mim, que o<br />
triumviratum tinha tomado o po<strong>de</strong>r, que o<br />
embaixador americano havia sido seqüestrado.<br />
Só fui saber da troca dos presos<br />
políticos pelo embaixador quando cheguei<br />
ao DOPS. Eu era a única mulher, então,<br />
ficava em camburão separada, mas vi, pela<br />
fresta, quando o camburão parou no<br />
pavilhão dos meninos. E era um tal <strong>de</strong> nego<br />
cantando a Internacional, que eu pensei<br />
que íamos ser fuzilados. Quando chegamos<br />
no DOPS encontrei os meninos, mas<br />
sempre afastada. A gente só sabia que havia<br />
uma lista <strong>de</strong> troca e foi uma emoção muito<br />
gran<strong>de</strong>.<br />
<strong>CACO</strong>: Você <strong>de</strong>scobriu quem realmente<br />
colocou o seu nome na lista?<br />
MACR: Foi o Cláudio Torres, ele conta no<br />
filme. Porque a Dissidência fez a lista com<br />
a...<br />
<strong>CACO</strong>: MR-8?<br />
MACR: Não. A Dissidência, que virou MR-<br />
8 nesse manifesto, para sacanear a repres-