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1823 Sant'Ana do Livramento - Filhos de Santana

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sempre <strong>de</strong> cores claras e vivas. São muito pitorescos quan<strong>do</strong> entram a flutuar a mercê <strong>do</strong> vento<br />

sobre o cavalo a galope, com os arreios muito enfeita<strong>do</strong>s <strong>de</strong> prata; mas parecem-me ter pouca<br />

utilida<strong>de</strong> prática para viagem.<br />

Faz-se a “sesteada”, das 10 horas às 3, na pobríssima casa <strong>de</strong> um alemão chama<strong>do</strong> Malm,<br />

conheci<strong>do</strong> por João Alemão. Está ausente; é seu cunha<strong>do</strong>, também alemão, que faz as honras da<br />

casa e sustenta a conversa sobre varia<strong>do</strong>s assuntos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a batalha <strong>de</strong> Waterloo, em que entrou<br />

seu pai, até um combate nas margens <strong>do</strong> Inhanduhí, em que ele próprio tomou parte, no tempo da<br />

guerra civil.<br />

Tempo excelente, nem quente, nem frio; mas terra árida; pois durante três horas e meia <strong>de</strong> viajem<br />

(quatro léguas brasileiras) a partir da casa <strong>de</strong> João Alemão, não vimos uma só árvore! Às seis<br />

horas e meia chegamos a casa <strong>do</strong> Sr. Trinda<strong>de</strong>. Mostra-nos um animalzinho chama<strong>do</strong> zorrilho,<br />

que me parece ter uma analogia com o texugo, mas que tem a particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exalar um<br />

cheiro execrável. A esposa oferece ao impera<strong>do</strong>r um sua<strong>do</strong>uro, pequena coberta para cavalo,<br />

feita, <strong>de</strong> ponto <strong>de</strong> meia, por sua mão.<br />

Dia 09 <strong>de</strong> outubro – O terreno torna-se mais pedregoso e aci<strong>de</strong>nta<strong>do</strong>; às vezes aparecem<br />

capõezinhos no fun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s vales, que vamos <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> à direita ou à esquerda.<br />

Às 3 horas chegamos à casa <strong>de</strong> uma senhora <strong>de</strong> apeli<strong>do</strong> Cunha, viúva <strong>do</strong> coronel Miguel<br />

Cunha. Apresenta-se acompanhada <strong>de</strong> sete <strong>de</strong> suas filhas e <strong>de</strong>clara ter ainda mais três nos<br />

arre<strong>do</strong>res, duas casadas e uma viúva. As sete que vemos trazem vesti<strong>do</strong>s <strong>de</strong> casa <strong>de</strong> ramagens. A<br />

casa é <strong>de</strong> uma elegância absolutamente <strong>de</strong>susada nestes <strong>de</strong>sertos; sobre tu<strong>do</strong> a sala ostenta o<br />

extraordinário luxo <strong>de</strong> um piano. Este piano torna-se como era natural, um excelente objeto <strong>de</strong><br />

conversação com toda esta socieda<strong>de</strong> feminina. O impera<strong>do</strong>r convida logo as meninas a mostrar<br />

seu talento musical. O repertório não é varia<strong>do</strong>: Limita-se ao “Souvinir <strong>de</strong> Ba<strong>de</strong>n-Ba<strong>de</strong>n”, e a duas<br />

mocinhas brasileiras. Além disso, o piano está horrivelmente <strong>de</strong>safina<strong>do</strong>. Desculpam-se dizen<strong>do</strong><br />

que seu mestre alemão as <strong>de</strong>ixou para regressar ao Rio Gran<strong>de</strong>. Suponho que é o mesmo que está<br />

agora lecionan<strong>do</strong>, com melhor resulta<strong>do</strong> as meninas <strong>do</strong> Sr. Euphrasio.<br />

O jantar compensa o concerto. Nada falta, nem mesmo um esplendi<strong>do</strong> aparelho: vidros<br />

<strong>do</strong>ura<strong>do</strong>s e bela porcelana <strong>de</strong> beira ver<strong>de</strong> com o nome <strong>do</strong> faleci<strong>do</strong> esposo da <strong>do</strong>na da casa em<br />

letras <strong>de</strong> ouro.<br />

Esta tar<strong>de</strong> os solda<strong>do</strong>s da escolta apanharam ovos <strong>de</strong> ema inteiramente amarelos, que<br />

logo foram fura<strong>do</strong>s e cuida<strong>do</strong>samente acondiciona<strong>do</strong>s para com eles se ornarem os aposentos <strong>do</strong><br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

Dia 10 <strong>de</strong> outubro – Partida às 5 horas por uma manhã extraordinariamente fria. Às 4 horas<br />

chegamos a casa <strong>do</strong> Sr. Macha<strong>do</strong>, que está convalescen<strong>do</strong> <strong>do</strong> tifo. A sua casa ocupa a encosta <strong>de</strong><br />

uma espécie <strong>de</strong> colina a que, por sua forma, chamam o “Cerro Chato” e que fica inteiramente<br />

isola<strong>do</strong> no meio <strong>de</strong> um vasto planalto, limitan<strong>do</strong> por vários la<strong>do</strong>s com outras colinas que<br />

terminam igualmente em mesas ou terraços. É uma formação bem singular e, da total ausência<br />

<strong>de</strong> árvores, não <strong>de</strong>ixa a paisagem <strong>de</strong> ter certo encanto, assim iluminada pelo sol poente e animada<br />

por milhares <strong>de</strong> bois dissemina<strong>do</strong>s pela superfície ver<strong>de</strong> e plana <strong>do</strong> campo. Correm as águas <strong>de</strong>ste<br />

<strong>1823</strong> - Carlos Alberto Potoko - 104 -

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