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Mas, feita a travessia, nos tornamos estranhos na<br />

outra margem. Costumes, hábitos diversos. Um<br />

outro mun<strong>do</strong>. E então, paulatinamente, se formos<br />

suficientemente inteligentes, apren<strong>de</strong>mos e apreen<strong>de</strong>mos<br />

traços <strong>da</strong> nova cultura. Vamos tecen<strong>do</strong> sobre<br />

nossa pele uma nova tatuagem. Vamos nos transforman<strong>do</strong><br />

num arlequim <strong>de</strong> roupa multicolori<strong>da</strong>. Um<br />

ser híbri<strong>do</strong>. Uma colcha <strong>de</strong> retalhos. Enfim, um ser<br />

culto. Antes neto <strong>de</strong> uma índia Kaigang com um<br />

português, nasci<strong>do</strong> em Esteio, cria<strong>do</strong> em <strong>Porto</strong><br />

Alegre, gaúcho, gremista, brasileiro; hoje também<br />

tripeiro, portista, português. Somos duplos? É claro<br />

que não somos duplos. Somos, isso sim, um ser por<br />

inteiro, mais humano, mais solidário, mais comunitário.<br />

Sou, sim, um gaúcho mais português, um<br />

sujeito mais universal, um ser mais humano.<br />

Senhores e senhoras: Pe<strong>da</strong>gogia. A viagem <strong>do</strong>s<br />

filhos, legítima aprendizagem.<br />

Partir. Sair. Deixar-se um dia seduzir. Tornar-se em vários,<br />

enfrentar o exterior, bifurcar em qualquer direção. Não<br />

existe aprendizagem sem exposição, muitas vezes perigosa.<br />

Não existe aprendizagem sem errância.<br />

(Michel Serres)<br />

Lua, espa<strong>da</strong> nua<br />

Banha no céu imensa e amarela<br />

Tão re<strong>do</strong>n<strong>da</strong> a lua<br />

Como flutua<br />

Vem navegan<strong>do</strong> o azul <strong>do</strong> firmamento<br />

E num silêncio lento<br />

Um trova<strong>do</strong>r cheio <strong>de</strong> estrelas<br />

(Tom Jobim)<br />

Sim, navegan<strong>do</strong> num silêncio lento. Um trova<strong>do</strong>r<br />

cheio <strong>de</strong> estrelas. Um estu<strong>da</strong>nte cheio <strong>de</strong> sonhos e<br />

expectativas. Em sua bagagem muito é o que contar.<br />

Seu conhecimento científico, sua história, sua vi<strong>da</strong>,<br />

sua cultura. Mas, no retorno, sua bagagem é muito<br />

mais pesa<strong>da</strong>. Traz consigo suas aprendizagens <strong>da</strong><br />

nova terra. Novos conhecimentos científicos, novas<br />

histórias, uma vi<strong>da</strong> que, submeti<strong>da</strong> ao <strong>de</strong>safio <strong>de</strong><br />

uma nova cultura, a<strong>da</strong>pta-se. É uma nova vi<strong>da</strong>.<br />

Bifurcou. Aquele que foi não é o mesmo que volta. É<br />

um mestiço, arlequim, um híbri<strong>do</strong>, uma colcha <strong>de</strong><br />

retalhos.<br />

Assim como os estu<strong>da</strong>ntes portugueses colam em<br />

suas capas negras os escu<strong>do</strong>s que representam<br />

locais, instituições ou algo que lhes é significativo,<br />

os viajantes tatuam em sua pele as experiências e<br />

histórias vivi<strong>da</strong>s nos diversos <strong>de</strong>stinos. Enfim,<br />

somos arlequins, mestiços, híbri<strong>do</strong>s. Viajantes. Uma<br />

colcha <strong>de</strong> retalhos. Somos, na parti<strong>da</strong>, como cera,<br />

ma<strong>de</strong>ira, bronze, mármore bruto, on<strong>de</strong> se mol<strong>da</strong>m as<br />

mais sofistica<strong>da</strong>s obras <strong>de</strong> arte. Carregamos, em<br />

nosso ser, um infindável ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> folhas em branco<br />

sempre prontas a receber novos contos, poesias,<br />

histórias reais ou <strong>de</strong> ficção. Somos uma tela on<strong>de</strong><br />

pintamos imagens e recor<strong>da</strong>ções. Somos uma pauta<br />

on<strong>de</strong> a canção <strong>da</strong> existência faz eterno o fa<strong>do</strong> <strong>de</strong> nossas<br />

vi<strong>da</strong>s.<br />

Pe<strong>da</strong>gogia <strong>de</strong> encontros e <strong>de</strong>spedi<strong>da</strong>s.<br />

Meu caro Jorge Bento<br />

Mobili<strong>da</strong><strong>de</strong> estu<strong>da</strong>ntil é uma expressão muito pobre<br />

para representar to<strong>do</strong> o significa<strong>do</strong> <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />

pe<strong>da</strong>gogia que nossas instituições subscrevem neste<br />

lega<strong>do</strong> <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>, soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong><strong>de</strong>, companheirismo.<br />

Nesta aprendizagem sobre os valores culturais mais<br />

significativos <strong>de</strong> nossa existência. Repito. Somos<br />

arlequins, mestiços, híbri<strong>do</strong>s. Uma colcha <strong>de</strong> retalhos.<br />

Pois, em ca<strong>da</strong> regresso ao <strong>Porto</strong> cantamos:<br />

Quem vem e atravessa o rio<br />

Junto à Serra <strong>do</strong> Pilar<br />

Vê um velho casario<br />

Que se esten<strong>de</strong> até ao mar<br />

(Rui Veloso)<br />

E quan<strong>do</strong> retornamos, ain<strong>da</strong> no avião, ao avistar o<br />

Cristo Re<strong>de</strong>ntor, cantamos com Tom Jobim:<br />

Minha alma canta<br />

Vejo o Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

Estou morren<strong>do</strong> <strong>de</strong> sau<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong> viagem<br />

Mobili<strong>da</strong><strong>de</strong> estu<strong>da</strong>ntil uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira pe<strong>da</strong>gogia.<br />

Uma pe<strong>da</strong>gogia <strong>de</strong> encontros e <strong>de</strong>spedi<strong>da</strong>s.<br />

Meu caro Jorge Bento<br />

Peço-lhe <strong>de</strong>sculpas se minha fala, <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong>,<br />

frustrou suas expectativas. E, enfim, aos estu<strong>da</strong>ntes<br />

que já foram e voltaram, aos que ain<strong>da</strong> irão e aqui<br />

chegarão, <strong>de</strong>dico os versos <strong>de</strong> Milton Nascimento:<br />

Rev Port Cien Desp 6(2) 249–252 251

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