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História Geral

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homem no Exército do general Dumouriez (1739-1823),<br />

na fronteira da atual Bélgica. Fora da batalha, passeavam<br />

com roupas de mulher e carabina ao ombro. Tornaram-se<br />

heroínas nacionais. Quando sua casa foi arrasada pelos<br />

“ferozes austríacos”, o governo da Convenção Nacional<br />

(1792-1795) propôs que a reconstrução ficasse por conta<br />

da República.<br />

Antes da Revolução, os oficiais da nobreza<br />

desprezavam os soldados. Já os líderes revolucionários<br />

valorizaram o serviço militar como a forma mais elevada<br />

de compromisso do cidadão com o Estado. O discurso da<br />

defesa dos homens livres contra os tiranos da Europa<br />

atraiu as cidadãs mais destemidas que aliavam o<br />

sentimento patriótico ao gosto pela aventura. Era<br />

também uma forma de integração oficiosa à cidadania.<br />

Reine Chapuy, de 17 anos, declarou que se alistara pelo<br />

desejo ardente de combater os tiranos e compartilhar da<br />

glória de fulminá-los. Outras foram à guerra para<br />

acompanhar os maridos, amantes e irmãos, e acabaram<br />

lutando ao lado deles, unindo o sacrifício pela pátria ao<br />

devotamento conjugal e familiar. Algumas haviam<br />

“nascido na caserna”, e a carreira militar era seu caminho<br />

natural. As circunstâncias da Revolução tiveram também<br />

um aspecto de liberação. Quando tudo estava em jogo, as<br />

mulheres puderam inventar novos papéis para si<br />

próprias.<br />

Há registros da boa acolhida das mulheres-soldados<br />

por parte dos companheiros de armas. O capitão Dubois<br />

e sua mulher combateram juntos no 7º Batalhão de Paris.<br />

Ao ser ferido, sua esposa foi designada vice-capitã pelos<br />

outros soldados. Aos 19 anos, Liberté Barreau serviu<br />

com o marido no Regimento dos Pirineus Ocidentais. Foi<br />

intrépida na batalha: perseguiu os inimigos até sua<br />

debandada, e depois voltou para transportar o marido<br />

ferido para o hospital militar com a ajuda dos<br />

companheiros. Liberté impressionou pela coragem e pela<br />

devoção ao esposo. Rose Bouillon não foi menos<br />

heroica: continuou lutando na batalha mesmo após a<br />

morte do marido. Depois pediu dispensa do Exército para<br />

cuidar dos filhos do mesmo modo como havia se<br />

dedicado ao marido e à pátria. A Convenção Nacional<br />

lhe concedeu uma pensão de 300 libras e mais 150 para<br />

cada um de seus filhos em agosto de 1793.<br />

Mas havia vozes discordantes: alguns cidadãos<br />

se queixavam abertamente das mulheres promovidas a<br />

oficial, alegando que os soldados tinham vergonha de<br />

receber suas ordens. Diminuindo o mérito das<br />

combatentes, explicavam aquela coragem como exceção,<br />

atribuindo-a ao milagre da Liberdade. Apesar de seus<br />

serviços, as soldadas foram incluídas em decreto<br />

governamental que dispensava e excluía do Exército<br />

todas as “mulheres inúteis” ao esforço de guerra, isto é,<br />

todas que não eram cantineiras nem lavadeiras. Lazare<br />

Carnot (1753-1823), membro da Convenção Nacional<br />

que organizou o recrutamento em massa de 1793,<br />

lamentava o flagelo que destruía os exércitos<br />

revolucionários: as mulheres que acompanhavam as<br />

tropas. Elas atrapalhavam a marcha dos batalhões,<br />

consumiam uma parte necessária dos alimentos,<br />

quebravam a disciplina e eram fonte da dissolução dos<br />

costumes de todos os militares.<br />

O decreto nunca foi cumprido: as esposas e<br />

companheiras dos soldados continuaram seguindo as<br />

tropas, e a maioria das combatentes permaneceu no<br />

Exército como se nada tivesse acontecido. O capitão da<br />

sra. Fartier, canhoneira no 10º batalhão dos Federados<br />

Nacionais de Paris, autorizou-a por escrito a continuar<br />

servindo na companhia em junho de 1793, após a<br />

promulgação da lei. Em 26 de fevereiro de 1794, Ana<br />

Quatro-vinténs foi aplaudida no Clube dos Jacobinos,<br />

que fizeram uma coleta em seu favor. O Conselho<br />

Militar não viu razões para excluir do Exército a cidadã<br />

Felicité Vai-de-bom-coração, devido ao seu<br />

comportamento irrepreensível. Houve mulheres-soldados<br />

até nas guerras napoleônicas (1799-1815). Um exemplo<br />

desse período foi Madame Xaintrailles, que se tornou<br />

ajudante de campo do general Menou (1750-1810) com a<br />

recomendação do próprio Lazare Carnot em 1795, dois<br />

anos depois da lei de exclusão.<br />

O número expressivo de prêmios e aplausos às<br />

soldadas atesta a boa vontade dos chefes militares e até<br />

dos governantes em Paris. Mesmo levando-se em conta<br />

que elas transgrediam as normas de comportamento<br />

feminino, apropriando-se de atributos inerentemente<br />

masculinos como as armas e o serviço militar. As<br />

mulheres-soldados foram até certo ponto aceitas porque<br />

tinham moral elevada, dignidade e bons costumes; eram<br />

combatentes, e não libertinas. Embora a violência não<br />

seja normalmente associada à mulher, na guerra elas<br />

matavam “os escravos dos tiranos”, prestando um<br />

serviço à nação. Eram discretas, e muitas vezes seu sexo<br />

só era descoberto quando feridas na batalha. Essas<br />

qualidades eram importantes numa época em que o<br />

presidente do Comitê de Segurança Pública declarou que<br />

“sem moral não há República” (outubro de 1793)<br />

Muitas das guerreiras protagonizaram episódios<br />

de coragem incomum, como Marie-Angélique<br />

Duchemin-Brulon (1772-1859). Sargento do 42º<br />

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