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Prosa - Academia Brasileira de Letras

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“Uns braços”: nenhum abraçoE vai assim o nosso Inácio aos poucos <strong>de</strong>sesperando, sobretudo quandopercebe que a única solução para aquele impasse será fugir da casa <strong>de</strong> D. Severina,on<strong>de</strong> resi<strong>de</strong> e <strong>de</strong> cujo marido é empregado. Mas não o consegue, hipnotizadoque está por aqueles braços que, todavia, não o abraçam:“Não foi; sentia-se agarrado e acorrentado pelos braços <strong>de</strong> D. Severina.Nunca vira outros tão bonitos e frescos. A educação que tivera não lhe permitiaencará-los logo abertamente, parece até que a princípio afastava osolhos, vexado. Encarou-os pouco a pouco, ao ver que eles não tinham outrasmangas, e assim os foi <strong>de</strong>scobrindo, mirando e amando.”E tanto os mirou e amou que D. Severina começou a <strong>de</strong>sconfiar. E a gostar,pelo visto, pois escreve o narrador:“Tudo parecia dizer à dama que era verda<strong>de</strong>; mas essa verda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sfeita aimpressão do assombro, trouxe-lhe uma complicação moral, que ela só conheceupelos efeitos, não achando meio <strong>de</strong> discernir o que era.”Paralelamente, Inácio continua a sofrer e a cogitar <strong>de</strong> sua fuga, o que <strong>de</strong>fato acontece no final do conto, coroando assim todo o tortuoso processoda interdição moral. Não se dá, pois, o tão <strong>de</strong>sejado abraço, embora durantetodo esse tempo os braços <strong>de</strong> D. Severina lhe fechem um parêntese naimaginação. Mas o fato é que, antes da fuga, algo acontece, algo que Machado<strong>de</strong> Assis, mercê <strong>de</strong> sua inexcedível habilida<strong>de</strong> ficcional, empurrapara uma região fronteira entre o sonho e a realida<strong>de</strong>, pois somente aí caberiaalguma forma <strong>de</strong> ação, e essa ação, como sempre, é iniciativa da mulher,<strong>de</strong>ssa mulher que, na ficção machadiana, parece ignorar a existência <strong>de</strong> quaisquerinterrogações <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m moral, jamais cogitando <strong>de</strong> outra forma <strong>de</strong> remorsoalém das inevitáveis interdições impostas por seu <strong>de</strong>coro. Lembre-se,a propósito, a personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Capitu, na qual subsiste um vertiginososubstrato <strong>de</strong> amoralida<strong>de</strong> que tangencia as raias da inocência animal e47

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