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F&N #201

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MUNDO<br />

jornalistas, ele praticamente demitiu<br />

o Presidente do BNDES, por meio de<br />

um recado ríspido direcionado a Joaquim<br />

Levy. A surpresa vem daqueles<br />

que avaliam as dificuldades enfrentadas<br />

pelo governo e da necessidade<br />

de ampliar o seu suporte político no<br />

seio dos representantes do sistema<br />

financeiro.<br />

Tirar Levy para extinguir o BN-<br />

DES - Mas não foi assim, não. Não<br />

teve muita conversa. Bolsonaro foi<br />

duro e directo, passando por cima da<br />

hierarquia, uma vez que Levy havia<br />

sido sugerido para o cargo por Paulo<br />

Guedes, seu superior na própria estrutura<br />

do Ministério da Economia.<br />

A desculpa esfarrapada para tal acto<br />

foi a nomeação por Levy de um ex-<br />

-assessor da presidência do banco<br />

ainda na gestão do PT. Outros lembram<br />

ainda as dificuldades encontradas<br />

para abrir a tal da “caixa preta”<br />

dos empréstimos do banco, com a<br />

intenção explícita de promover uma<br />

devassa persecutória nas gestões anteriores.<br />

Ora, essas razões não se sustentam<br />

de pé. O próprio Joaquim Levy,<br />

apesar de seu perfil conservador, é<br />

um oriundo das administrações petistas.<br />

Foi aproveitado lá trás ainda<br />

por Palocci, em 2003, que nomeou<br />

o antigo colaborador das gestões<br />

tucanas para o estratégico cargo<br />

da Secretaria do Tesouro Nacional.<br />

Antes de Levy ser nomeado por Dilma<br />

para o Ministério da Fazenda<br />

no estelionato eleitoral de 2015, o<br />

economista havia também ocupado<br />

cargos no FMI e no Banco Mundial<br />

representando o governo brasileiro.<br />

Nessas condições, fica difícil atribuir<br />

à nomeação de um assessor a razão<br />

para sua demissão.<br />

Lembremos que Levy tem uma<br />

passagem muito fácil no interior do<br />

financismo, em razão da extensa ficha<br />

de bons serviços prestados à nata da<br />

elite. Essa identidade de interesses<br />

deu-se nos momentos em que o ocupante<br />

de cargos públicos formulava<br />

políticas governamentais que agradavam<br />

plenamente aos desejos da<br />

banca. Ou então em períodos que o<br />

próprio Levy actuava como dirigente<br />

do capital privado. Aliás, foi na condição<br />

de indicado pelo Bradesco que<br />

ele chegou ao Ministério no segundo<br />

mandato de Dilma.<br />

“(…) “Como liberais,<br />

somos contrários a empresas<br />

estatais. Com excepção<br />

do Banco Central, bancos<br />

públicos deveriam ser<br />

privatizados e o BNDES extinto.<br />

A Petrobras também<br />

deveria ser privatizada<br />

“<br />

Assim, imagina-se que demitir<br />

Levy é comprar dificuldades, ao menos<br />

momentâneas, com o povo da<br />

finança. Por que haveria Bolsonaro<br />

avançado esse sinal, em momento tão<br />

crucial para o avanço da proposta da<br />

Reforma da Previdência no interior<br />

da Câmara dos Deputados? É bem<br />

provável que o enredo teatral todo<br />

tenha sido articulado com o próprio<br />

Paulo Guedes, que também passou<br />

a apresentar nos últimos tempos<br />

algum desconforto com Levy no comando<br />

do BNDES.<br />

BNDES incomoda privados - Uma<br />

das dificuldades refere-se à exigência<br />

de que ele promovesse a devolução<br />

para os cofres do Tesouro Nacional<br />

de valores próximos a R$ 130 bilhões.<br />

Essa é a soma que o governo federal<br />

havia transferido ao banco, para que<br />

o mesmo pudesse desenvolver suas<br />

actividades de financiamento do desenvolvimento<br />

e de empréstimos de<br />

longo prazo a juros subsidiados. Assim,<br />

não faz sentido essa devolução<br />

que impacta de forma perigosa e negativa<br />

o património do BNDES.<br />

A bem da verdade, essa estratégia<br />

não faz “sentido” para aqueles que<br />

consideramos essencial que o Estado<br />

brasileiro conte com uma agência<br />

robusta para dar conta das tarefas<br />

de fomento do desenvolvimento. O<br />

problema é que Paulo Guedes tem<br />

uma visão totalmente oposta. Para o<br />

monetarista conservador, que nunca<br />

havia ocupado um cargo público até<br />

então, a principal tarefa é aquela associada<br />

à demolição.<br />

Ele não se cansa de deixar isso clara<br />

quando fala em privatizar todas as<br />

empresas estatais ou quando remete<br />

ao projeto de eliminação do modelo<br />

de previdência social pública.<br />

Ocorre que pouca gente atentou<br />

para uma declaração sua a respeito<br />

do próprio BNDES. Não nos esqueçamos<br />

jamais de que Guedes é oriundo<br />

do sistema financeiro, onde passou<br />

boa parte de sua vida profissional.<br />

Assim, além do viés “natural” do rentismo<br />

parasitário, ele vê nos bancos<br />

públicos um enorme obstáculo à ampliação<br />

dos negócios e das margens<br />

de lucro do capital financeiro privado.<br />

(...)<br />

*Em Berlim | Correio do<br />

Brasil/*Paulo Kliass é doutor em<br />

economia e membro da carreira de<br />

Especialistas em Políticas Públicas<br />

e Gestão Governamental do governo<br />

federal.<br />

Figuras&Negócios - Nº 201 - JUNHO 2019 59

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