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Fazer download PDF - Fundação Cultural do Estado da Bahia

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RUY TAPIOCAlá an<strong>da</strong>!», vocifera<strong>do</strong> em alto bra<strong>do</strong>, pela senhora pragueja<strong>do</strong>ra, a destravar amalva<strong>da</strong>, isto é, a soltar a língua.Sou um ser abúlico por natureza - isto não é um supor -, além de criaturadesabitua<strong>da</strong> a li<strong>da</strong>r com situações corriqueiras <strong>do</strong> cotidiano, avalie-se às voltascom embaraçosos contratempos de trânsito, em logra<strong>do</strong>uros públicos.«És mais bem li<strong>do</strong> <strong>do</strong> que ouvi<strong>do</strong>, meu caro», sussurrou-me certa feita, nomeu ouvi<strong>do</strong>, o Sá-Carneiro, quan<strong>do</strong> este sau<strong>do</strong>so poeta ain<strong>da</strong> morava nestemun<strong>do</strong>.É por essas e outras que jamais consegui entender a ín<strong>do</strong>le e atavismos <strong>do</strong>smeus patrícios: vocaciona<strong>do</strong>s a heroicas ousadias transoceânicas, com a intençãode conquistar mun<strong>do</strong>s ignotos, no passa<strong>do</strong> grandioso e sau<strong>do</strong>so; ao passo quebulhentos e intolerantes, de tamancos à mão e praguejamentos à ponta <strong>da</strong> língua,por qualquer dá cá aquela palha, nestes tempos modernos, sáfaros e frustres.No interior <strong>do</strong> Martinho, o Alma<strong>da</strong> acenou-me de uma mesa ao fun<strong>do</strong>, senta<strong>do</strong>na companhia <strong>do</strong> Montalvor.Cumprimentei-os com um meneio de cabeça e um sorriso sem graça, a jádesvestir-me <strong>da</strong> gabardina e <strong>do</strong> chapéu, os quais pendurei num gancho <strong>do</strong> cabide,ao pé de um bengaleiro, onde encostei o guar<strong>da</strong>-chuva.Ajeitei a gravatinha, no espelho <strong>da</strong> parede, antes de sentar-me.Em dias de chuva, de ordinário sou parcimonioso em cumprimentos, comode resto sovina em conversas, avaro em comentários, posto me mantenha poli<strong>do</strong>e afável, desde que não estrondeiem trovões no céu.Se calhar de ocorrer trovoa<strong>da</strong>s nas Altiplanuras, assalta-me, inelutavelmente,me<strong>do</strong> pânico e absoluta incapaci<strong>da</strong>de de falar.Quan<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong> a maça<strong>da</strong>s dessa natureza, habitualmente procuro, diaforéticoe abugalha<strong>do</strong>, refúgio debaixo <strong>da</strong>s mesas.A que estiver mais perto, ao primeiro trovão.O Alma<strong>da</strong> tinha aberta sobre a mesa <strong>do</strong> restaurante uma página <strong>do</strong>bra<strong>da</strong> <strong>do</strong>Diário de Lisboa.Antes que eu me acomo<strong>da</strong>sse na cadeira de assento de pele, ele principioua leitura de um trecho de artigo muito instrutivo e provocativo - «As AssociaçõesSecretas: Análise Serena e Minuciosa a um Projeto de Lei apresenta<strong>do</strong> ao Parlamento»- que escrevi para aquele vespertino politicamente independente:– «... como a maioria <strong>do</strong>s antimaçons, o autor deste projeto é totalmente desconhece<strong>do</strong>r<strong>do</strong> assunto Maçonaria. O que sabe dele é até, porventura, pior quena<strong>da</strong>, pois, naturalmente, terá nutri<strong>do</strong> o seu antimaçonismo <strong>da</strong> leitura <strong>da</strong> imprensachama<strong>da</strong> católica, onde, até nas coisas mais elementares <strong>da</strong> matéria, errosse acumulam sobre erros, e aos erros se junta, com a má vontade, a mentira e acalúnia, senhoras suas filhas...».Ao cabo <strong>da</strong> leitura, Alma<strong>da</strong> retirou os óculos, fechou o jornal, e rezingou:– Como não bastasse chamar o autor <strong>do</strong> projeto de parvo, você ain<strong>da</strong> teve alata de mimoseá-lo com o epíteto de aldrabão! Não satisfeito, ain<strong>da</strong> ofendeu a be-116

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