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Fazer download PDF - Fundação Cultural do Estado da Bahia

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Há alguns meses atrás, chegamos a pensar que a festa era algum tipo deconspiração contra nós, porque somente nós é que não podíamos freqüentá-las. Mas soubemos logo que não: eles ficaram muito tristes quan<strong>do</strong> revelamosisso. E até disseram que nós somos felizar<strong>da</strong>s por não entrarmos na festa. Convivemos– assim como nossas ancestrais, que já ouviram <strong>do</strong>s seus contemporâneosas mesmas ressalvas – longas <strong>da</strong>tas com uma ilusória felici<strong>da</strong>de de queéramos especiais, que a exceção é sempre uma dádiva, mas não. Há exceçõesfelizes e exceções tristes. Mas não sabemos se participar <strong>da</strong> festa onde matamé uma exceção alegre ou triste.Seria uma exceção triste se na festa matassem formigas. Porque nós, mulheresazuis, gostaríamos de fazer parte de um ritual onde se matam formigas.Falamos sobre rituais a poucos dias com alguns deles e eles entristeceram-se.E como, às vezes, também respondem às mulheres azuis, disseram: “gostamos<strong>do</strong>s rituais de escovar os dentes depois <strong>da</strong>s refeições”. Aquela resposta foi obastante para fazer com que nós nos reuníssemos para desven<strong>da</strong>r o oculto <strong>da</strong>frase. Não conseguimos e deduzimos que também aqueles que freqüentam afesta onde matam, assim como nós, que não frequentamos, gostamos <strong>do</strong> ritualde escovar os dentes. Somos um povo higiênico.E seria uma exceção alegre se na festa matassem onças. Não somos extermina<strong>do</strong>rasde espécies. Não apoiamos este tipo de sacrifícios. Será que épela falta <strong>do</strong> nosso apoio que não nos convi<strong>da</strong>m para a festa onde matam? Epor que eles continuam a frequentar a festa onde matam, se também não sesentem alegres com isso? Novas perguntas, que nós, mulheres azuis, fazemosconstantemente ao observarmos os olhos sorumbáticos <strong>da</strong>queles que presenciama festa onde matam. Eles se calam. Olham para os nossos olhos e dizemapenas com suas bocas “tem que ser assim” e nós seguimos com mais perguntas,que passam a soar como rebeldes questionamentos. Não nos sentimos privilegia<strong>da</strong>spor não participarmos na festa onde matam. Tu<strong>do</strong> o que queremos époder fazer parte <strong>da</strong> festa, mesmo que não saiamos felizes dela. Dissemos issoe agora eles sorriem e falam que não sabemos de absolutamente na<strong>da</strong>, quedesconhecemos. Que desconhecemos, já sabemos. E finalmente dizem algo,que para nós, que estamos tão afoitas por respostas, nos vem como uma revelação:“A questão não é estarmos felizes ou não na festa onde matam. Somosfelizes ou não somos. Estamos felizes e logo depois já não estamos. <strong>Fazer</strong> parte<strong>da</strong> festa ou não, não mu<strong>da</strong>rá isso”. E nós, que nunca entramos na festa e nemnunca entraremos, não soubemos comensurar a porção de ver<strong>da</strong>de e lucidez<strong>da</strong>quela afirmação advin<strong>da</strong> <strong>da</strong>queles que frequentam a festa onde matam. Porque eles seriam leais conosco?Que eles matam onças ou formigas são apenas suposições nossas. Idealizamosum referencial de crenças. Na ver<strong>da</strong>de, já criamos manifestos e libelosa respeito <strong>da</strong> festa onde matam. Acho que nós fun<strong>da</strong>mentamos, teorizamos erefletimos mais sobre a festa <strong>do</strong> que eles próprios. Fizemos compêndios e tra-ADELICE SOUZA19

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