Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras
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A vida e a vida <strong>de</strong> <strong>Jorge</strong> <strong>Amado</strong><br />
e altivo intensifica as instâncias <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>. Ele é também o trunfo dos<br />
vencidos, antes voltado para contestar do que para homologar. O riso é ainda<br />
a recusa sem violência.<br />
<strong>Jorge</strong> <strong>Amado</strong> é um heterodoxo. E todo heterodoxo é subversivo. Mesmo<br />
os livros <strong>de</strong> militância estão vazados <strong>de</strong> fortes impulsos heterodoxos. Ele foi<br />
escritor antes <strong>de</strong> ser político. As ilusões, ainda não perdidas, nunca <strong>de</strong>sencantadas,<br />
o conduziram à busca por novas solidarieda<strong>de</strong>s, em um cenário político<br />
curvilíneo, no qual as relações <strong>de</strong> produção davam forma à criação <strong>de</strong> relações.<br />
A narrativa, o conto, o drama na verda<strong>de</strong>, recusa a pantomima crepuscular,<br />
para instaurar – para além do puritanismo divisor, do fantasma do pecado,<br />
ou da simples culpabilida<strong>de</strong> – a naturalida<strong>de</strong> do corpo. Mas evitando cair<br />
nas armadilhas do exotismo. Para ficar mais claro, é preciso dizer, o exotismo<br />
não existe. É uma invenção do olhar autoritário do mesmo diante do outro.<br />
O exótico é um produto artificial, a maquinação infernal <strong>de</strong> um dispositivo<br />
autocentrado. E, porque autocentrado, solitário.<br />
A ficção <strong>de</strong> <strong>Jorge</strong> <strong>Amado</strong> vai exatamente em sentido contrário: representa o<br />
significado da partilha, da aliança, da cumplicida<strong>de</strong> salutar. Em uma palavra,<br />
da mestiçagem. Não há opção para nós. As apostas foram feitas: ou somos<br />
mestiços, ou não somos. Ele encarna em toda a sua obra, e até predica, em<br />
Pequena cabotagem, o mais transparente sincretismo cultural da terra <strong>de</strong> todos os<br />
santos e todos os orixás. Não só nenhum preconceito, porém nenhum racismo<br />
revanchista. Soube operar com precisão antagonismos inconciliáveis, no<br />
empenho <strong>de</strong> reconhecimento <strong>de</strong> um sincretismo construtivo.<br />
Neste carnaval <strong>de</strong> 2012, <strong>Jorge</strong> <strong>Amado</strong> foi amplamente festejado, ele e os<br />
seus companheiros <strong>de</strong> viagem. Nos <strong>de</strong>sfiles <strong>de</strong> Escolas <strong>de</strong> Samba, nos Blocos<br />
<strong>de</strong> bairros, nos Trios elétricos. No Rio <strong>de</strong> Janeiro, em Salvador da Bahia, em<br />
São Paulo. Foi a <strong>de</strong>ferência coletiva ao intérprete da alma nacional.<br />
Estou certo <strong>de</strong> que, quando a notícia <strong>de</strong> toda essa celebração chegar a <strong>Jorge</strong>,<br />
ele vai ficar muito feliz.<br />
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