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Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras

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Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke<br />

já que ele mesmo fala <strong>de</strong> “um anseio romântico por um futuro imaginário” no<br />

caso dos romancistas <strong>Amado</strong>, Lins do Rêgo e Rachel <strong>de</strong> Queiroz.<br />

Parece justo dizer que o que <strong>Amado</strong> fez na ficção, Freyre fez em seu trabalho<br />

histórico e sociológico. Sua utopia não era uma utopia grandiosa, daquele<br />

tipo que Zygmunt Bauman chamou <strong>de</strong> “utopia dos extirpadores”, os gran<strong>de</strong>s<br />

assassinos do século XX que queriam arrancar da Terra todos os elementos<br />

que eles acreditavam estar bloqueando o caminho rumo a um futuro melhor.<br />

Sua utopia era do tipo que García Marquez chamava <strong>de</strong> “utopias menores”, a<br />

obra <strong>de</strong> pessoas que suspeitam <strong>de</strong> soluções universais para os males do mundo<br />

e simplesmente propõem melhores modos <strong>de</strong> vida em um mundo imperfeito.<br />

Essas pessoas imaginam melhorias numa escala menor – transformações<br />

parciais do mundo, das quais o conflito social e a opressão não po<strong>de</strong>m ser<br />

jamais completamente eliminados. A elas faltam as ambições monumentais e<br />

as cruelda<strong>de</strong>s dos grandiosos projetos utópicos, que po<strong>de</strong>m matar milhões em<br />

seus esforços para transformar o mundo radicalmente.<br />

Essa i<strong>de</strong>ia foi ilustrada <strong>de</strong> forma muito bonita pela trilogia <strong>de</strong> Tom Stoppard,<br />

on<strong>de</strong> se apresentam as i<strong>de</strong>ias do socialista russo do século XIX Alexan<strong>de</strong>r<br />

Herzen. Na peça, Herzen encoraja vigorosamente seu filho, Sacha, a<br />

distanciar-se <strong>de</strong> projetos que reivindicam soluções completas para os problemas<br />

humanos. Eles são “obsoletos e fraudulentos”, ele contestava. Pelo<br />

contrário, Sacha <strong>de</strong>veria velejar rumo à “costa da utopia”, mas sem se iludir<br />

que para além da costa exista um paraíso a ser <strong>de</strong>scoberto.<br />

Assim, é justo dizer que tanto <strong>Amado</strong> como Freyre acreditavam que o<br />

reconhecimento das contribuições das diferentes culturas para a Humanida<strong>de</strong><br />

representa um gran<strong>de</strong> passo, não na direção <strong>de</strong> um mundo perfeito, mas rumo<br />

à “costa da utopia”.<br />

Referências<br />

J. AMÉRICO DE ALMEIDA, “Gilberto Freyre, nova forma <strong>de</strong> expressão”, in G. <strong>Amado</strong> et<br />

al., ed,. Gilberto Freyre – sua Ciência, sua Filosofia, sua Arte, J. Olympio, 1962.<br />

AMADO, Tenda dos milagres (1969), 45. a ed., Record, Rio <strong>de</strong> Janeiro, 2006.<br />

_____, O país do carnaval,1930.<br />

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