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Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras

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Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke<br />

Recentemente, fiquei sabendo <strong>de</strong> uma visão do país <strong>de</strong> certa forma semelhante,<br />

<strong>de</strong>ssa vez <strong>de</strong> um motorista <strong>de</strong> táxi afro-americano em Nova York, em<br />

uma experiência que sei ser partilhada por outros quando vão para fora do<br />

país. Tão logo ele <strong>de</strong>scobriu ser eu brasileira, <strong>de</strong>ixou para trás seu mau humor<br />

e abriu um sorriso largo, dizendo: “Ah, Brasil, está aí um lugar on<strong>de</strong> eu adoraria<br />

viver. Tenho pensado bastante em ir para Salvador” – que, curiosamente, é<br />

o mesmo lugar escolhido por Dionne Warwick para ser seu novo lar.<br />

Essa visada positiva no tocante ao hibridismo cultural – que é tão intimamente<br />

associado ao Brasil hoje – não se restringe ao estrangeiro, tendo-se tornado<br />

parte da imaginação coletiva, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> ser periodicamente <strong>de</strong>nunciada,<br />

no Brasil e alhures, como pura i<strong>de</strong>alização, ou uma “enorme mentira”, ou ainda<br />

uma “piada”, como se percebeu recentemente. 2 Em 2009, o presi<strong>de</strong>nte brasileiro<br />

Luiz Inácio Lula da Silva, falando como porta-voz do sentido brasileiro <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, apresentou essa visão para uma audiência estrangeira nos seguintes<br />

termos: “Um Brasil <strong>de</strong> homens e mulheres <strong>de</strong> todos os continentes: americanos,<br />

europeus, africanos, asiáticos, todos orgulhosos <strong>de</strong> suas origens e mais orgulhosos<br />

<strong>de</strong> se sentirem brasileiros. Não só somos um povo misturado, mas um povo<br />

que gosta muito <strong>de</strong> ser misturado. É o que faz nossa i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.”<br />

Até o final dos anos 1930, no entanto, a visão positiva da miscigenação<br />

e do hibridismo não era regra. Então, como se alcançou essa visão do Brasil<br />

como um paraíso ou quase-paraíso?<br />

Uma das formas possíveis <strong>de</strong> se respon<strong>de</strong>r tal pergunta é levar em conta<br />

uma longa tradição minoritária <strong>de</strong> visão positiva sobre as relações raciais,<br />

cujas origens, pelo menos nos Estados Unidos, remontam ao século XIX,<br />

quando a “solução brasileira” para o chamado problema racial começou a ser<br />

reconhecida e louvada, – inicialmente pelos lí<strong>de</strong>res da comunida<strong>de</strong> negra, e<br />

<strong>de</strong>pois pela florescente imprensa negra. Não apenas o país era <strong>de</strong>scrito como<br />

“um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> cal<strong>de</strong>irão a que a América <strong>de</strong>veria seguir”, como um artigo<br />

do New York Times coloca, em julho <strong>de</strong> 1926, como também esquemas para a<br />

2 Abdias Nascimento, em conversa com o Prof. Henry Louis Gates, em Black Latin America. Brazil: a racial<br />

<strong>de</strong>mocracy?<br />

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