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Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras

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Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke<br />

quando muito jovem no final da década <strong>de</strong> 1910 e início dos anos 1920,<br />

e a experiência <strong>de</strong> <strong>Amado</strong> no Leste Europeu no final dos anos 1940 e nos<br />

anos 1950, permitiu aos dois escritores que vissem seu próprio país a partir<br />

<strong>de</strong> uma perspectiva mais ampla, tanto <strong>de</strong> fora como <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro. “Às vezes eu<br />

penso e mesmo sinto em inglês”, certa vez admitiu Freyre, explicando que vira<br />

Portugal pela primeira vez com “olhos <strong>de</strong> inglês”.<br />

Um profundo interesse em cultura popular e um amor pela Bahia era partilhado<br />

por <strong>Amado</strong> (ali nascido) e Freyre (que se via como “um cidadão da<br />

Bahia” e estava convencido <strong>de</strong> que as “tradições e valores genuinamente brasileiros”<br />

podiam ser ali encontrados, mais do que em todas as outras regiões do<br />

país. 10 Ambos concordavam que intelectuais “livrescos”, que não se misturam<br />

com as “classes baixas” e a “negralhada” não po<strong>de</strong>riam, nem remotamente,<br />

enten<strong>de</strong>r o país.<br />

Freyre e <strong>Amado</strong> passaram por uma fase <strong>de</strong> repúdio à composição racial<br />

do país, sugerindo em dado ponto, como fizeram muitos brasileiros e estrangeiros<br />

que não se po<strong>de</strong>ria esperar nada <strong>de</strong> positivo <strong>de</strong> um país povoado por<br />

uma “raça mestiça” e dirigida por um “governo mulato”, como asseverava<br />

o estereótipo <strong>de</strong> Brasil. Freyre, em certa ocasião, admitiu ficar horrorizado<br />

com a aparência dos marinheiros brasileiros, que a ele pareciam “caricaturas<br />

<strong>de</strong> homens”. De igual forma, <strong>Amado</strong> se refere, em seu primeiro romance, à<br />

“raça doente e preguiçosa” que estava a emergir da “gran<strong>de</strong> confusão <strong>de</strong> raças”<br />

existente no país. 11<br />

A preocupação com os <strong>de</strong>stituídos e os <strong>de</strong>sfavorecidos, ou as “marias-borralheiras<br />

da história”, para usar a expressão memorável <strong>de</strong> Freyre – em outras<br />

palavras, com os protagonistas da “história vista <strong>de</strong> baixo”, numa época em<br />

que isso ainda não era a ortodoxia – e o compromisso com reformas sociais<br />

também eram partilhados por Freyre e <strong>Amado</strong>, que se elegeram <strong>de</strong>putados<br />

em 1946: Freyre, pela União Democrática Nacional, e <strong>Amado</strong>, pelo Partido<br />

Comunista, que logo entraria na ilegalida<strong>de</strong>. Embora não fosse um comunista,<br />

10 G. Freyre, Bahia e baianos, pp. 51-53.<br />

11 J. <strong>Amado</strong>, 1930.<br />

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