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Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras

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Gilberto Freyre em contexto: algumas reflexões<br />

A miscigenação <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um problema e a pureza <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser condição<br />

para a civilização, pois, como ele <strong>de</strong>scobriu, não havia base científica para louvar<br />

uma e opor outra, dado que os problemas do país não eram raciais e sim sociais<br />

e ambientais. A Antropologia, como Roquette-Pinto convenceu Freyre, mostrava<br />

que a população do Brasil precisava ser educada e não substituída.<br />

Na nova interpretação <strong>de</strong> Freyre, os males e os vícios atribuídos anteriormente<br />

aos negros e à população miscigenada não podiam mais ser consi<strong>de</strong>rados<br />

como sendo “inatos” à sua “raça” – as causas se encontravam no sistema<br />

social e no sistema econômico da escravatura. Na verda<strong>de</strong>, “nem brancos nem<br />

negros agiam por si próprios como indivíduos, e muito menos como raças”,<br />

segundo Freyre. Era o sistema econômico que dividia os brasileiros, que os<br />

fazia – brancos e não-brancos – agir como agiam; em resumo: era o sistema<br />

econômico que os dividia em senhores e escravos.<br />

Para esse “novo” Freyre, falar em inferiorida<strong>de</strong> ou superiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> raça era<br />

tão absurdo como seria negar o patrimônio cultural dos índios e dos negros<br />

que enriqueceram o Brasil pela interpenetração <strong>de</strong> culturas – cozinha, agricultura,<br />

mineração, música, arquitetura e assim por diante. Em todos esses campos<br />

se revelava a função civilizadora tanto <strong>de</strong> negros como <strong>de</strong> índios. Desse<br />

modo, Freyre oferecia uma resposta tanto à solução pelo embranquecimento<br />

anteriormente proposta no Brasil como à solução segregacionista proposta<br />

nos Estados Unidos. Em vez <strong>de</strong> igualar a mistura <strong>de</strong> raças com <strong>de</strong>generação,<br />

Freyre a associou com o enriquecimento e o <strong>de</strong>senvolvimento das culturas. Em<br />

sua interpretação, o maior aporte adveio da influência “amaciadora” da miscigenação<br />

na socieda<strong>de</strong> brasileira; a mistura racial era o óleo que lubrificava o<br />

sistema econômico e a fonte da relativa harmonia social que se tornara característica<br />

do país. Em poucas palavras: ser miscigenado não era um obstáculo<br />

para o <strong>de</strong>senvolvimento do Brasil ou um obstáculo para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> brasileira positiva – era, antes, a própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

Virando <strong>de</strong> ponta cabeça a visão convencional sobre o Brasil, Freyre trazia<br />

a público algo que não era corrente em sua época e foi recebida com choque<br />

ou como sendo uma novida<strong>de</strong> bem-vinda e fascinantemente subversiva. Quando,<br />

após a publicação <strong>de</strong> seu livro, Freyre expressou sua visão no Congresso<br />

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