Dossiê Jorge Amado - Academia Brasileira de Letras
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Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke<br />
Mas antes disso, umas poucas palavras à guisa <strong>de</strong> introdução sobre Gilberto<br />
Freyre. 7 Freyre, nascido em 1900 falecido em 1987, era um homem <strong>de</strong> muitos<br />
interesses e uma personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> muitas facetas – um “homem-orquestra”,<br />
como ele <strong>de</strong>screvia algumas pessoas a quem admirava – que costumava <strong>de</strong>screver<br />
a si mesmo como uma “combinação <strong>de</strong> eus”: revolucionário e conservador,<br />
cosmopolita ainda que <strong>de</strong>votado a sua região nativa, Pernambuco, e assim<br />
por diante. Em resumo: Gilberto Freyre continha muitas contradições, o que<br />
torna difíceis as generalizações a seu respeito. “Cada vez que pensamos po<strong>de</strong>r<br />
apanhá-lo numa re<strong>de</strong>, ele escapa pelos buracos como se fosse geleia”, escreveu<br />
Darcy Ribeiro, um <strong>de</strong> seus mais preeminentes críticos.<br />
Freyre é mais conhecido como sociólogo e como historiador social do<br />
Brasil, mas mesmo na <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> não é fácil acondicioná-lo em um compartimento<br />
disciplinar. Ele escreveu uma introdução à Sociologia e também<br />
um ensaio sobre o tópico “por que sou e não sou um sociólogo”. Nesse li vro,<br />
ele se auto<strong>de</strong>nomina um sociólogo que, ao mesmo tempo, é um antiso ciólogo<br />
e um anarquista, até on<strong>de</strong> concerne as puras teorias sociais e técnicas<br />
ortodoxas.<br />
Por consi<strong>de</strong>rar a realida<strong>de</strong> social e a experiência humana complexas, ambivalentes,<br />
fragmentárias e esquivas, Freyre era cético no que diz respeito<br />
à rigi<strong>de</strong>z do método, afirmando ser conscientemente antimetódico e impressionista,<br />
abordando seu material como o que ele chamava <strong>de</strong> “método<br />
não-sistemático” dos ensaístas ingleses a quem ele tanto admirava. É por isso<br />
que ele <strong>de</strong>fendia o papel da intuição, da poesia e da literatura para o entendimento<br />
das socieda<strong>de</strong>s, vendo Proust, por exemplo, como um gran<strong>de</strong> sociólogo<br />
e <strong>Amado</strong> e José Lins do Rêgo como praticamente “historiadores sociais<br />
disfarçados <strong>de</strong> romancistas”. 8<br />
Freyre também publicou um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> ensaios sobre Antropologia<br />
e seus interesses em Folclore, Geografia, Ecologia e Psicologia foram também<br />
importantes para seu trabalho como intérprete do Brasil, embora esse estilo<br />
7 A discussão em torno <strong>de</strong> Gilberto Fryre é retirada <strong>de</strong> dois livros da autora sobre Freyre: Gilberto<br />
Freyre, um vitoriano dos trópicos e (com Peter Burke), Gilberto Freyre, Social Theory in the Tropics.<br />
8 G. Freyre, Dois livros, 1944.<br />
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