Iracema, mon amour - Cabine Cultural
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imunda onde ninguém sabia dar uma informação que não contrariasse a<br />
informação anteriormente recebida. Todo mundo queria tirar proveito do nosso<br />
aspecto de turistas. Depois de nos desvencilhar de alguns aproveitadores de<br />
plantão, conseguimos pegar um ônibus até a ruína de Tambomachay. Este<br />
passeio foi indicação do Pedro, que já o conhecia. Proporcionava-nos a<br />
possibilidade de visitar quatro ruínas. Iríamos de ônibus por uma estradinha que<br />
ligava Cuzco a Pisaq, desceríamos perto da ruína de Tambomachay, e depois<br />
andaríamos de volta até Saqsaywaman, já bem perto de Cuzco, passando por<br />
Pukapukara e Q’enqo. A caminhada teria algo em torno de 7 km.<br />
Tambomachay é um conjunto de ruínas com umas fontes que funcionam até<br />
hoje, e a água é potável. O complexo era usado para banhos e rituais religiosos.<br />
Parece-me que as maiores construções incas eram usadas para rituais religiosos,<br />
foi uma impressão que tive na viagem. Como se ninguém se divertisse e mundo<br />
era trabalhar e rezar. Desconfio seriamente que não era assim. É evidente que a<br />
vida cotidiana inca era orientada pela religiosidade marcante e pela fé nas crenças<br />
míticas. Tudo era feito respeitando os deuses, seguindo presságios e através de<br />
oferendas. Desde os plantios rotineiros, até construções complexas ou guerras.<br />
Mas em meio a tudo isso, tinha vida normal: brigas de casais, paqueras, crianças<br />
brincando, adolescentes se achando, passeios, descansos, tudo. Portanto, duvido<br />
dessa historinha que Tambomachay era usado apenas para banhos e rituais<br />
religiosos. Eles devem ter se divertido à beça lá. Quem sabe não rolou até umas<br />
orgias incas.<br />
No caminho de volta nós atravessamos um pobre vilarejo cheio de crianças<br />
simpáticas que carregavam filhotes de cachorros. Senti que iniciei uma purificação<br />
pessoal logo após atravessar o povoado. Tudo convergia para isto, o clima<br />
ensolarado e frio, o silêncio espectral, a cor exuberante do céu e das <strong>mon</strong>tanhas,<br />
as ruínas geometricamente construídas, a confiança nas minhas companhias,<br />
tudo. Comecei a refletir sobre minha vida de rápidos 25 anos. Comecei a viajar<br />
sobre como havia chegado até aquele dia, e o que iria fazer dali pra frente.<br />
Pensava na minha família, nos meus amigos, em minha carreira. Pensava mais no<br />
passado que no futuro. Vivia o presente. E que presente! Meia hora depois e<br />
estávamos em outra ruína, Pukapukara.<br />
Depois de visitar a ruína de nome mais simpático e infantil da viagem,<br />
entramos na parte mais longa e bela da jornada. Foram quase duas horas de<br />
caminhada passando por entre <strong>mon</strong>tanhas de todos os tons de verdes possíveis,<br />
por vales alagadiços e floridos. Por caminhos milenares, sempre pensando nos<br />
significados da vida, da minha especificamente. Acho que são justamente as<br />
questões que movem a humanidade, qual é a origem da vida? Qual é o seu<br />
significado? E como é fim? São as três questões metafísicas talvez mais<br />
discutidas em nossa efêmera existência e vã filosofia, blá, blá, blá. O Anselmo<br />
falou algo que procede, disse que estava se sentindo no cenário do Senhor dos<br />
Anéis. É verdade, as paisagens lembravam sim a Terra Média evocada e cantada<br />
por Tolkien. Teve até um cavalo branco que, do nada, passou correndo pela<br />
gente. Era o próprio Scadufax, o cavalo branco de Gandalf (puta observação<br />
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