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Iracema, mon amour - Cabine Cultural

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17º Dia – Dia besta<br />

Estrada/Arequipa, 13/01/05.<br />

Caro leitor, estimada leitora. O presente capítulo realmente não acrescenta<br />

absolutamente nada ao desenrolar da narrativa. Sintam-se à vontade para pulá-lo<br />

e não ler. Não haverá revelações deslumbrantes e nem constatações pertinentes.<br />

Salvo um pequeno e insólito episódio ocorrido na madrugada, não aconteceu mais<br />

nada de interessante. Bom, que fique por sua conta e risco. Quem avisa, amigo é.<br />

Lutando e resistindo contra o calor, eu dormia a prestações, suando muito.<br />

Pelas frestas das escotilhas superiores entrava muita poeira e meus olhos já<br />

estavam irritados. Minhas lentes de contato pareciam duas lixas. Meu nariz estava<br />

seco, assim como minha garganta. Da minha testa minava um suor espesso e<br />

viscoso, tão salgado quanto às águas do Pacífico. Acordava a cada 10 minutos e<br />

abria olhos para um pesadelo. As janelas estavam embaçadas das respirações<br />

ofegantes das quase cinqüenta pessoas que também suavam. O que no início era<br />

uma sauna seca, com algumas horas de viagem, virou uma sauna a vapor. O<br />

ônibus parecia envolto numa neblina nefasta de calor e odores sudoríparos. Sem<br />

um motivo aparente, o ônibus parou no meio da estrada. Quando iniciou sua<br />

reduzida na velocidade, eu pensei que iríamos passar por um pedágio, parar num<br />

posto, sei lá. Parou também o movimento de ar que entrava pelas aberturas no<br />

teto. O calor atingiu níveis insuportáveis, despropositais para a vida humana. Já<br />

havia muita gente do lado de fora do busão, então resolvi descer também.<br />

Estávamos na beira de um vilarejo pobre e poeirento, e, por algum motivo<br />

desconhecido, estava acontecendo um protesto há quilômetros de distância. O<br />

suficiente para paralisar a rodovia toda. Tudo parado. A fila de veículos era<br />

desanimadora, não dava para ver o fim.<br />

Muito cansados, suados e com o saco pra lá de cheio, eu e o Anselmo<br />

sentamos na mureta de uma casa e ficamos praguejando o infortúnio. Vimos que<br />

aquilo tudo iria se estender por horas. Cachorros latiam, crianças saídas dos<br />

ônibus gritavam e corriam por todos os lados, alguns imbecis inutilmente<br />

buzinavam e nós dois lá, parados no meio do nada. Tirei as meias e os calçados,<br />

tirei a camiseta e deitei na mureta tentando descansar e espantar o calor. “O que<br />

mais nos falta acontecer?” – indagamos. Em determinados momentos, há certas<br />

perguntas que devem ser cautelosamente evitadas, a questão há pouco formulada<br />

era uma delas. Catapowrwr! Um estrondo rápido e vibrante pipocou no ar.<br />

Barulhos elétricos e toda a luz elétrica do vilarejo se foi. Um apagão! Não nos<br />

restou outra opção a não ser rir. Rir muito. Gargalhamos até escorrerem lágrimas.<br />

Com calor, com sono, cansados, fodidos, famintos, sujos e rindo. Rindo como não<br />

se fosse nada. Rindo uma boa risada. O estrondo e o apagão serviram para<br />

amedrontar e calar as crianças. Muitos outros barulhos também se cessaram. Foi<br />

uma piada da providência divina. Deus tem um ótimo senso de humor. Depois de<br />

quase três horas parados, o fluxo de carros começou a esboçar uma lenta<br />

movimentação. Entramos no busão e tentei dormir. Até consegui por curtos<br />

espaços de tempo, mas pessimamente, muito incomodado pelo calor. Logo depois<br />

do raiar do dia, paramos exatamente no mesmo local imundo que já havíamos<br />

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