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Dissertação - Programa de Pós-graduação em Educação / UEM

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Se por um lado o Almanaque serviu para propagar novos comportamentos,<br />

por outro, ao representar o sertanejo como “<strong>de</strong>snutrido, barrigudo e pobre”<br />

contribuiu para criar uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sertanejo a partir do Jeca Tatuzinho.<br />

Assim diz outra leitora:<br />

Eram folhetos ilustrados com a imag<strong>em</strong> do Jeca Tatu cagando no<br />

matinho, a barriga inchada <strong>de</strong> vermes, o amarelão, a inércia. Na<br />

minha cabeça <strong>de</strong> menina, a idéia cresceu assim: nunca ser como<br />

o Jeca Tatu. Depois, já vivendo <strong>em</strong> São Paulo, a figura do Jeca<br />

confirmou-se na <strong>de</strong>rivação cômica <strong>de</strong>la: Mazzaropi. Só muito mais<br />

tar<strong>de</strong> me surpreendi ao <strong>de</strong>scobrir que o interior paulista, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />

vinham Jeca Tatu e Mazzaropi, era outra coisa. Mas essa<br />

passag<strong>em</strong>, a transformação do Jeca Tatu <strong>em</strong> novo rico, não ficaria<br />

b<strong>em</strong> elaborada na minha cabeça (PARK, 1998, p. 91).<br />

Volto as atenções para as alternâncias das situações econômicas e física<br />

da personag<strong>em</strong>. A princípio o que parece <strong>de</strong>stacar na m<strong>em</strong>ória do leitor é a<br />

primeira versão caricatural do Jeca, enquanto ele ainda era pobre e doente, mas<br />

porquê? Pelos <strong>de</strong>poimentos po<strong>de</strong>-se observar que o Almanaque Biotônico<br />

Fontoura como um material <strong>de</strong> leitura, <strong>em</strong> que sujeitos, <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r aquisitivo e <strong>de</strong><br />

acesso cultural diferenciados, tiver<strong>em</strong> uma experiência <strong>de</strong> leitura e, como tal, algo<br />

imprevisível, um caminho para o <strong>de</strong>sconhecido, uma aventura que produziu<br />

subjetivida<strong>de</strong> e seus efeitos não pu<strong>de</strong>ram ser controlados ou previstos. Essa<br />

afirmação torna-se mais consistente quando consi<strong>de</strong>rada a perspectiva teórica <strong>de</strong><br />

Chartier (1999), que pensa a leitura como pratica inventiva, resultado não <strong>de</strong> uma,<br />

mas <strong>de</strong> várias maneiras <strong>de</strong> ler. Desse modo, o simples fato <strong>de</strong> pegar um livro e<br />

manuseá-lo já torna a prática da leitura algo particular <strong>de</strong> características<br />

peculiares, o próprio uso do livro é uma variante individual.<br />

Uma vez escrito e saído das prensas, o livro, seja ele qual for,<br />

está suscetível a uma multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> usos. Ele é feito para ser<br />

lido, claro, mas as modalida<strong>de</strong>s do ler são, elas próprias,<br />

bmúltiplas, diferentes segundo as épocas, os lugares, os<br />

ambientes [...] a leitura não é uma invariante histórica – mesmo<br />

nas suas modalida<strong>de</strong>s mais físicas –, mas um gesto, individual ou<br />

coletivo, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das formas <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, das<br />

representações do saber ou do lazer, das concepções da<br />

individualida<strong>de</strong> (CHARTIER, 2004, p. 173).

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