josé oiticica: itinerários de um militante anarquista - Universidade ...
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porque assim completava logo meu conhecimento das prisões <strong>de</strong><br />
Bernar<strong>de</strong>s. 301<br />
Ao falar ironicamente das formas repressivas do Estado, Oiticica possivelmente<br />
tentava mostrar que sua teoria e suas i<strong>de</strong>ias eram maiores do que as instituições mantidas<br />
pelo Estado e pela socieda<strong>de</strong> capitalista e, como já vimos no Segundo Capítulo, as leis e a<br />
força militar faziam parte <strong>de</strong>las. A construção do homem que não se abala mesmo tendo<br />
sofrido as injustas penalida<strong>de</strong>s do Estado acaba por lembrar as imagens <strong>de</strong> heróis que<br />
nunca <strong>de</strong>sistem <strong>de</strong> lutar pela justiça. Logo, o <strong>militante</strong> que luta e resiste, mesmo com todas<br />
as adversida<strong>de</strong>s impostas pelo governo, passa a ser visto também como <strong>um</strong> herói. Tal<br />
mitificação da figura do <strong>militante</strong> serve <strong>de</strong> inspiração para que a luta contra o capital<br />
sempre permaneça.<br />
Adhemar Lourenço da Silva Junior, citando Raoul Girar<strong>de</strong>t, ao falar da criação <strong>de</strong><br />
―Heróis Operários‖, afirma que ―a mitificação das condutas <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados personagens<br />
ten<strong>de</strong> a dissociá-los do tempo cronológico, <strong>de</strong> forma a produzir relatos que tem, ou<br />
<strong>de</strong>veriam ter, sempre força presente‖. 302<br />
Assim, os sofrimentos causados pelas leis do<br />
Estado passam a ser usados como <strong>um</strong> incentivo à continuação da luta, portanto revigoram<br />
o inconformismo contra o capitalismo, ao contrário <strong>de</strong> o arrefecer. Oiticica apresenta este<br />
sentimento em seu poema intitulado A Prisão:<br />
As gran<strong>de</strong>s provações tornam as causas gran<strong>de</strong>s!<br />
Nada sofro! Meu sonho há <strong>de</strong> ser sempre o que é.<br />
Do alto do meu Sinai fito areias e lan<strong>de</strong>s<br />
E prossigo a buscar Canaan, como Josué<br />
Tenho orgulho, alma sã, das espadas que bran<strong>de</strong>s!<br />
Vieram todas <strong>de</strong> heróis que morreram <strong>de</strong> pé;<br />
E hoje, em prol do teu povo, entre o Atlântico e os An<strong>de</strong>s.<br />
Melhor refulgirão, núncias da tua fé.<br />
Bendita esta prisão que anima eu surto,<br />
Faz <strong>de</strong>sta Via-Sacra o caminho mais curto<br />
E enfeita a minha cruz ao toque dos clarins!<br />
Bendita a provação que me ergue aos superiores,<br />
Justifica o meu ato, unge os meus dissabores,<br />
301 CAMARINA, Mario. Confissões <strong>de</strong> <strong>um</strong> <strong>anarquista</strong> Emérito. Revista O Cruzeiro, Ano XXV,<br />
N.32, 23/05/1953.<br />
302 SILVA JUNIOR, Adhemar Lourenço da. O herói no movimento operário. In OTERO, Loiva;<br />
ELMIR, Claudio. Mitos e heróis: construção <strong>de</strong> imaginários. Porto Alegre: Ed. Da UFGRS, 1998,<br />
p.116.<br />
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