Homenagens - Academia Brasileira de Letras
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Afonso Arinos, filho<br />
Palavras que disse há três décadas po<strong>de</strong>riam ser <strong>de</strong> hoje: “O terrorismo é um<br />
fenômeno bem mais complexo do que po<strong>de</strong>ríamos supor. [...] Quando se comete<br />
uma injustiça, promove-se, inevitavelmente, uma reação contrária. [...] O<br />
que está acontecendo hoje no mundo é apenas uma resposta do terrorismo <strong>de</strong><br />
baixo ao terrorismo <strong>de</strong> cima; a resposta do terrorismo bárbaro ao terrorismo<br />
civilizado. Assim, estamos procurando combater o terrorismo nos seus efeitos,<br />
quando nos esquecemos <strong>de</strong> combatê-lo em suas causas. Enquanto houver minorias<br />
oprimidas, minorias que não tenham voz ativa nos governos dos povos,<br />
persistirão as condições que geram o protesto, a violência e o <strong>de</strong>sespero.”<br />
Alceu procurava “chamar nossa atenção para essa terrível realida<strong>de</strong> que é o<br />
hábito da convivência com a injustiça. Numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> violentos <strong>de</strong>sníveis<br />
sociais, a justiça é sempre esquecida em favor <strong>de</strong> outros valores. Passamos a<br />
conviver com a injustiça como coisa comum. [...] Os instalados na vida não<br />
vêem a miséria que os cerca, e, se vêem, <strong>de</strong>la não tomam conhecimento, preferindo<br />
simplesmente ignorá-la. [...] Aqui no Brasil, tornou-se absolutamente<br />
normal, nos gran<strong>de</strong>s centros, conviver com a miséria das favelas.” Porém, “com a<br />
disseminação da educação, a maioria da população tomou conhecimento dos seus<br />
direitos. É natural que queira lutar por eles, reclamando participação ativa e racional<br />
na vida da socieda<strong>de</strong>. [...] É preciso que nos compenetremos <strong>de</strong> que, enquanto<br />
houver con<strong>de</strong>scendência para com a institucionalização da injustiça<br />
praticada pelas gran<strong>de</strong>s potências, tanto do ponto <strong>de</strong> vista político como econômico,<br />
e enquanto concordarmos com a marginalização das pequenas nacionalida<strong>de</strong>s<br />
e com a existência <strong>de</strong> classes oprimidas, estaremos estimulando o terrorismo.<br />
Sem que haja a reintegração do primado da justiça e do direito, tanto<br />
nas relações internacionais como na vida social dos povos, a violência persistirá,<br />
como manifestação <strong>de</strong> protesto dos oprimidos contra os opressores.”<br />
Alceu Amoroso Lima não chegou a ver o fim da ditadura que tanto combatera.<br />
Faleceu em Petrópolis, a 14 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1983, aos 89 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. Livre,<br />
como sempre vivera. Liberto, inclusive, das peias que o atavam ao leito <strong>de</strong><br />
dor. Na gran<strong>de</strong>za moral e na coragem cívica, na humanida<strong>de</strong> profunda, ele foi<br />
a consciência ética do seu tempo. Viveu, para Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>,<br />
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