2 8ELENCO DAS RAZÕES PELAS QUAIS AUNIVERSIDADE DEVE RECUSAR A DICOTOMIADIREITA/ESQUERDA (1)1. De on<strong>de</strong> proviria a hipótese <strong>de</strong> Bobbio relativa ao conteúdo dadicotomiaNorberto Bobbio (1909/2004) insistiu na valida<strong>de</strong> da dicotomia(2)tomando por base a tese, <strong>de</strong> sua autoria, segundo a qual a direita enfatizaria aliberda<strong>de</strong> enquanto a esquerda o faria em relação à igualda<strong>de</strong>. Quem se <strong>de</strong>bruçousobre o texto do eminente sábio, <strong>de</strong> cujo convívio recentemente nos privamos -mas viveu uma longa e profícua existência - sabe perfeitamente que não advoganenhum dogmatismo no confronto, admitindo nuanças. Ainda assim, não háevidências empíricas <strong>de</strong> que os liberais, em qualquer momento <strong>de</strong> sua trajetóriahistórica, tivessem se oposto à ascensão social dos operários. Tenho presente quea Revolução Industrial atribui nova conotação ao tema tradicional da pobreza.Des<strong>de</strong> então, notadamente na Inglaterra que a experimentou em primeira mão, aquestão social quer dizer sobretudo questão operária.É plausível supor que, ao conceber o confronto, Bobbio tivessepresente a experiência soviética. Com efeito, a abolição da liberda<strong>de</strong> na RússiaSoviética <strong>de</strong>u-se em nome da igualda<strong>de</strong>. Naturalmente, a posição diante da UniãoSoviética durante largo período representou um ponto <strong>de</strong>licado para os socialistasem toda parte do Oci<strong>de</strong>nte e não apenas na Europa. Era perfeitamente natural queencarassem com <strong>de</strong>sconfiança os relatos da chamada "imprensa burguesa". ORelatório Krushov (1956), se comprovou a valida<strong>de</strong> das <strong>de</strong>núncias, ao mesmotempo criava uma esperança <strong>de</strong> correção. Por sua vez, a documentação examinadapor Hanah Arendt (1906/1975),(3) certamente evi<strong>de</strong>nciou que o regime soviéticoconsistia numa forma totalitária <strong>de</strong> exercício do po<strong>de</strong>r. Contudo, dizia respeito aum passado que, aparentemente, a nova geração <strong>de</strong> dirigentes soviéticos <strong>de</strong>sejavamudar.Tudo isso justifica plenamente a admissão da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> queBobbio tivesse levado em conta a experiência soviética como uma situação limite,permitindo apresentar o confronto em toda a sua radicalida<strong>de</strong>. Não havia porquerecusar aquela experiência a partir do pressuposto <strong>de</strong> que não po<strong>de</strong>ria serassociada ao i<strong>de</strong>ário socialista. Esse tipo <strong>de</strong> questionamento, durante largoperíodo, somente era sustentado por pensadores isolados, ainda quepersonalida<strong>de</strong>s respeitabilíssimas, a exemplo do conterrâneo <strong>de</strong> Bobbio, RodolfoMondolfo (1877/1976).Presentemente, o quadro é muito diverso. A experiência soviéticaredundou em fracasso. O suposto empenho em prol da igualda<strong>de</strong> não passava -como a Kolakowski compraz dizer - <strong>de</strong> uma Gran<strong>de</strong> Mentira. A imensa maioriada população saiu daquela experiência numa condição <strong>de</strong> extrema pobreza,justamente o que tornou patente que a distribuição <strong>de</strong> renda é uma invenção docapitalismo.2. Em que termos discute-se presentemente a questão da igualda<strong>de</strong>Po<strong>de</strong>-se dizer que a igualda<strong>de</strong>, no período recente, é discutida <strong>de</strong>maneira distinta em dois planos: no plano acadêmico e na arena política.
No plano acadêmico o tema em apreço foi amplamente revigorado pelatese <strong>de</strong> John Rawls segundo a qual a eqüida<strong>de</strong> seria o princípio a partir do qual<strong>de</strong>ver-se-iam estruturar as instituições.A obra <strong>de</strong> Rawls teve naturalmente gran<strong>de</strong>s méritos notadamente o<strong>de</strong>spertar do interesse pelo kantismo nos Estados Unidos. O rebento principal doutilitarismo - a ciência política norte-americana - havia resultado numa hipótesealheia ao valor, em resultado do que seria abandonado o estudo dos fatoresculturais na vida política. (4) Mais recentemente, recolhe-se a impressão <strong>de</strong> que aconsi<strong>de</strong>ração dos ingredientes culturais no processo político voltou a ser mais oumenos generalizada (Peter Berger, Robert Dahl, Huntington, Fukuyama, etc.),sendo provável que o interesse por Teoria da Justiça (1971) tenha muito a vercom esse <strong>de</strong>sfecho.Entretanto no que se refere à hipótese central, subscrevo asobservações <strong>de</strong> Robert Nisbet: "Como historiador e cientista social, não <strong>de</strong>sejariaproclamar a superiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma virtu<strong>de</strong> sobre as outras, notadamente que issopu<strong>de</strong>sse ser apreendido intuitivamente. Mas, se especular em relação àquilo que amaioria <strong>de</strong> nós apreen<strong>de</strong>ria "intuitivamente", parece-me que não seria a Justiça,qualquer que seja a forma como a <strong>de</strong>finamos. Mais provavelmente seria proteçãoou segurança, seguida <strong>de</strong> perto por conservação (no sentido <strong>de</strong> perpetuação <strong>de</strong>normas e estilos <strong>de</strong> vida). É certo não haver dúvidas <strong>de</strong> que nossos mais remotosancestrais hajam expressado concepções <strong>de</strong> justiça, ainda que ru<strong>de</strong>s. Concedoainda que poucas pessoas, hoje como no passado, disponham-se a manifestar umapreferência positiva pela injustiça uma vez que esse valor lhe seja apresentadocomo opção e convenientemente <strong>de</strong>scrito. Mas <strong>de</strong>clarar, como argumento-chave<strong>de</strong> um livro <strong>de</strong> 600 páginas sobre moral, que a Justiça é a virtu<strong>de</strong> que se alcançaintuitivamente como elemento primeiro das instituições sociais, correspon<strong>de</strong> adar as costas à história e também, segundo entendo, aos sentimentos concernentesà segurança e à conservação presentes à nossa vida cotidiana".(5)No plano político, a discussão está centrada na opção entre igualda<strong>de</strong><strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s e igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> resultados. Certamente que ainda há quem<strong>de</strong>fenda esta última. Mas fazê-lo <strong>de</strong>pois do fracasso brutal da experiênciasoviética, mostrando que pouco ou nada se avançou na matéria, trata-se <strong>de</strong> umaverda<strong>de</strong>ira sandice. Tanto mais se tivermos presente a disseminação <strong>de</strong> melhorespadrões <strong>de</strong> renda no Oci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>senvolvido e o <strong>de</strong>saparecimento da indigência.Tomo aqui o exemplo dos Estados Unidos: no exercício fiscal2002/2003, consi<strong>de</strong>rava-se pobre a família com rendimento anual inferior a US$18.392 (família <strong>de</strong> quatro pessoas). No mesmo exercício fiscal, esse contingentecorrespondia a 12,1% da população (34,6 milhões <strong>de</strong> pessoas). A renda médiaalcançou US$ 42.409. A classe média continua <strong>de</strong>tendo a parcela substancial <strong>de</strong>renda (em torno <strong>de</strong> 70%). Os mais ricos (2,8 milhões <strong>de</strong> pessoas) ficam com15,5%. Os padrões para aferir pobreza na França e na Inglaterra acham-se muitopróximos dos <strong>de</strong>scritos.Os <strong>de</strong>fensores da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> resultados situam o tema da distribuição<strong>de</strong> renda em termos morais. Na verda<strong>de</strong>, o enfoque moral prevaleceu quando osliberais estabeleceram a distinção entre indigência e pobreza, acrescentando queos primeiros não po<strong>de</strong>m ficar à mercê da exclusiva carida<strong>de</strong> privada, <strong>de</strong>vendo seramparados com recursos retirados do orçamento. A distribuição <strong>de</strong> rendaverificada nos países <strong>de</strong>senvolvidos não se <strong>de</strong>veu a nenhuma inspiração moral.Henry Ford, na década <strong>de</strong> vinte do século passado, <strong>de</strong>scobriu que, para ven<strong>de</strong>rautomóveis, <strong>de</strong>via elevar substancialmente o salário <strong>de</strong> seus operários, mesmo em2 9
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