O sonho de mendeleiev
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era imerecido: sua abordagem era científica (pelos padrões da época) e ortodoxa (aceitava os<br />
preceitos limitadores estabelecidos por Aristóteles). Na alquimia, tendia a duvidar da<br />
possibilida<strong>de</strong> da transmutação <strong>de</strong> metais inferiores em ouro, embora mantivesse a mente<br />
aberta – talvez porque Aristóteles não se pronunciara sobre essa matéria. Fez muito trabalho<br />
pioneiro habilidoso em seu gabinete <strong>de</strong> alquimista e suas notas <strong>de</strong> laboratório indicam que foi<br />
quase certamente o primeiro a isolar o elemento arsênio.<br />
Apesar <strong>de</strong> seus aspectos heréticos e mágicos, a alquimia atraía Alberto, e muitas outras<br />
cabeças genuinamente indagadoras, porque parecia ser uma maneira nova e única <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir<br />
a verda<strong>de</strong>. Tratava-se da única ativida<strong>de</strong> intelectual que buscava <strong>de</strong>scobrir verda<strong>de</strong>s sobre os<br />
elementos do mundo. Muito simplesmente, nesse período a alquimia era a única verda<strong>de</strong>ira<br />
ciência da matéria. Até então, a mudança fora consi<strong>de</strong>rada apenas em suas formas aristotélicas<br />
– o movimento <strong>de</strong> projéteis, o processo <strong>de</strong> envelhecimento, as estações do ano e assim por<br />
diante. Alberto Magno foi talvez o primeiro a apreen<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a mudança química era<br />
algo inteiramente diferente.<br />
Alberto Magno parece ter convivido facilmente com as coerções do aristotelismo. O mesmo<br />
não ocorreu com seu eminente contemporâneo científico, Roger Bacon. Nascido em c.1214,<br />
Roger Bacon fez-se monge franciscano e estudou em Oxford e Paris, on<strong>de</strong> também ensinou.<br />
Como Alberto, tinha um conhecimento excepcional tanto em abrangência quanto em<br />
profundida<strong>de</strong>. Chegou até a tentar escrever uma enciclopédia que conteria todo o<br />
conhecimento humano, mas foi obrigado a se <strong>de</strong>clarar vencido. Essa foi uma ocasião rara,<br />
porque Bacon era um homem <strong>de</strong> autoconfiança imperiosa e estava constantemente <strong>de</strong>preciando<br />
os outros por seus <strong>de</strong>slizes intelectuais. Não era um temperamento monástico: com a pobreza e<br />
a castida<strong>de</strong> conseguia se enten<strong>de</strong>r intermitentemente, mas a obediência estava totalmente<br />
acima <strong>de</strong> seu alcance.<br />
O brilhantismo <strong>de</strong> Bacon era tal que ele atraiu a atenção do papa Clemente IV, que se tornou<br />
seu protetor. Quando Clemente morreu, o inimigos <strong>de</strong> Bacon se <strong>de</strong>sforraram. Finalmente o<br />
chefe da or<strong>de</strong>m franciscana o manteve preso em Paris durante 15 anos e or<strong>de</strong>nou que todas as<br />
suas obras fossem <strong>de</strong>struídas. Felizmente algumas foram escondidas por monges com i<strong>de</strong>ias<br />
afins, embora sua Opus majus não fosse ser publicada até 1733, quase 450 anos <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua<br />
morte.<br />
As i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> Bacon exibem notável semelhança com muitas das que Leonardo da Vinci<br />
esboçou em seus ca<strong>de</strong>rnos – embora antecedam Leonardo em 200 anos, e em muitos casos vão<br />
além <strong>de</strong>le. Bacon previu barcos a vapor, automóveis, submarinos e até máquinas voadoras.<br />
Sugeriu que um dia as pessoas iriam circunavegar o globo. Uma <strong>de</strong> suas cartas contém até a<br />
primeira referência europeia à pólvora. (Como resultado, pensou-se por muitos anos que ele a<br />
inventara. Mais tar<strong>de</strong> historiadores sustentaram que a pólvora veio da China. Estudos recentes<br />
sugerem que é possível que ela tenha sido inventada in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente na Europa, caso em<br />
que Bacon teria mais probabilida<strong>de</strong> do que ninguém <strong>de</strong> ter sido o autor <strong>de</strong>sse feito.) Tais<br />
foram os <strong>de</strong>vaneios excepcionais <strong>de</strong> uma mente original. Mais mundana, mas mais<br />
significativa, foi sua ênfase em experimentos como o único caminho verda<strong>de</strong>iro para o avanço<br />
na ciência. (A personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Bacon lhe assegurava a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> passar muito tempo<br />
sem ser perturbado em seu laboratório <strong>de</strong> Oxford.) Ele enfatizou também a aplicação da<br />
matemática como a senda para a verda<strong>de</strong> exata no experimento científico. Ambas essas i<strong>de</strong>ias<br />
só se estabeleceram com Galileu, quase quatro séculos <strong>de</strong>pois.)