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O sonho de mendeleiev

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obras mais importantes <strong>de</strong>sse período foi produzida por um alquimista que se auto<strong>de</strong>nominava<br />

“Geber”, em homenagem a Djabir, o alquimista árabe do século VIII. Esse a<strong>de</strong>pto do século<br />

XIV, que era provavelmente um monge espanhol, é hoje conhecido em geral como o “Falso<br />

Geber”.<br />

Outros eram menos reticentes. Alguns alquimistas chegaram a publicar suas memórias, um<br />

<strong>de</strong>les tendo até <strong>de</strong>scrito sua busca bem-sucedida. Em sua Exposição das figuras hieroglíficas,<br />

o copista parisiense Nicolas Flamel conta como empreen<strong>de</strong>u uma peregrinação alquímica<br />

através da França e da Espanha, on<strong>de</strong> encontrou um certo Mestre Canches, um médico ju<strong>de</strong>u.<br />

Antes <strong>de</strong> morrer, Canches transmitiu uma pista do segredo da transmutação: “os primeiros<br />

princípios, embora não sua primeira preparação, que é coisa dificílima, acima <strong>de</strong> tudo que há<br />

no mundo. Mas no fim consegui isso também, após longos três anos <strong>de</strong> erros, ou cerca disso;<br />

tempo durante o qual nada fiz senão estudar e trabalhar.” Finalmente, “no ano da restauração<br />

da humanida<strong>de</strong>, 1382”, ele registra, “fiz projeção da pedra Vermelha sobre quantida<strong>de</strong> igual<br />

<strong>de</strong> Mercúrio nos dias cinco e vinte <strong>de</strong> Abril ... por volta das cinco horas da Tar<strong>de</strong>; que<br />

transmutei verda<strong>de</strong>iramente num Ouro quase tão puro, certamente melhor que Ouro comum,<br />

mais brando, e mais maleável”. Infelizmente, a explicação anexa <strong>de</strong> como precisamente fez<br />

isso está expressa na forma alegórica tradicional, que permaneceu impenetrável a todos os<br />

ávidos leitores que <strong>de</strong>sejaram emular seu toque <strong>de</strong> Midas científico. Quer acreditemos ou não<br />

em Flamel, não há como duvidar do fato <strong>de</strong> que, apesar <strong>de</strong> suas origens humil<strong>de</strong>s, ele logo se<br />

tornou um homem muito rico, renomado por suas generosas doações às igrejas <strong>de</strong> Paris. (Uma<br />

placa <strong>de</strong> mármore da época que registra uma <strong>de</strong>ssas dádivas ainda po<strong>de</strong> ser vista no Museu <strong>de</strong><br />

Cluny em Paris.)<br />

Mas Flamel não esteve sozinho em seu sucesso. Segundo a tradição, novamente sustentada<br />

por registros da época, o monge catalão Raimondo Lúlio também teve êxito na “Gran<strong>de</strong><br />

Obra”, como passou a ser conhecida. Lúlio foi ao mesmo tempo um místico ascético e um<br />

alquimista bem-sucedido. Diz-se que com seu ouro ele pagou as dívidas <strong>de</strong> Eduardo II, o<br />

<strong>de</strong>vasso rei homossexual da Inglaterra, cujo reinado foi gasto em gran<strong>de</strong> parte no combate a<br />

seus barões homofóbicos. É bem possível que Lúlio tenha partilhado a predileção <strong>de</strong> Eduardo<br />

durante seu próprio período <strong>de</strong> <strong>de</strong>vassidão, antes <strong>de</strong> se tornar monge. Desmentidos disso e <strong>de</strong><br />

seu pendor alquímico tornaram-se uma espécie <strong>de</strong> tradição entre estudiosos protetores – mas o<br />

fato é que, na época, acreditava-se firmemente em tudo isso, bem como em seu sucesso como<br />

alquimista. História não é o que realmente aconteceu, mas o que acreditamos que aconteceu.<br />

Apesar da charlatanice generalizada, não há dúvida <strong>de</strong> que muitos alquimistas <strong>de</strong>sse período<br />

eram honestos em seus esforços. Acreditavam inteiramente no que estavam fazendo. E tinham<br />

boas razões para isso. A partir da filosofia original <strong>de</strong> Aristóteles, os filósofos medievais<br />

haviam <strong>de</strong>senvolvido seu próprio aristotelismo. Segundo este, o busca da perfeição pela<br />

Natureza tinha lugar também entre os minerais sob a superfície da terra. Pedras tornavam-se<br />

rochas, rochas tornavam-se metais. Um processo <strong>de</strong> evolução estava ocorrendo<br />

constantemente. Ao longo dos anos metais inferiores, em seu empenho, galgavam lentamente a<br />

escada da perfeição – tornando-se estanho, <strong>de</strong>pois prata e finalmente ouro.<br />

Esse pensamento não é tão forçado quanto po<strong>de</strong>ria parecer. Quando fundido, mineral<br />

grosseiro produz metal puro. E esse era um processo simples se comparado a outras<br />

transformações observadas por cientistas medievais. Não era mais difícil explicar a<br />

transformação aparente <strong>de</strong> carne podre em vermes, ou <strong>de</strong> lagartas em borboletas, sementes em

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