O sonho de mendeleiev
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aramente sentia necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> registrar o que conseguira. E outros, que o faziam, tendiam a<br />
se arrogar resultados espúrios, fantasiosos ou metafísicos. Nenhuma ciência podia ser<br />
construída sobre esses fundamentos fantásticos.<br />
Afirmou-se, porém, que Galileu sequer foi o primeiro a conduzir experimentos <strong>de</strong> estilo<br />
mo<strong>de</strong>rno, com matemática e física combinadas. Vários contemporâneos, alguns anos antes <strong>de</strong><br />
Galileu, teriam começado a usar métodos experimentais similares. Esta afirmação tem alguma<br />
base. Como vimos, toda a disposição mental do mundo medieval estava <strong>de</strong>smoronando. As<br />
velhas certezas atribuídas a autorida<strong>de</strong> (isto é, Aristóteles) estavam sendo vistas como cada<br />
vez mais incertas, o que estimulava todo tipo <strong>de</strong> novas i<strong>de</strong>ias para substituí-las. A aplicação<br />
da matemática à realida<strong>de</strong> foi apenas uma <strong>de</strong>ssas novas i<strong>de</strong>ias. Essas noções estavam “no ar”,<br />
e muitos estavam pensando em linhas similares. A ciência mo<strong>de</strong>rna estava nascendo por toda a<br />
Europa, a criação <strong>de</strong> vários indivíduos que pensavam, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente, <strong>de</strong> maneira<br />
científica.<br />
É comum dizer-se que esse pensamento estava “à frente <strong>de</strong> seu tempo”. Isso não faz justiça<br />
ao que, precisamente, estava acontecendo no início do século XVII na Europa. Esses<br />
pensadores e experimentadores científicos individuais, muitas vezes trabalhando isolados uns<br />
dos outros, estavam não tanto à frente <strong>de</strong> seu tempo quanto criando um tempo inteiramente<br />
novo. Por toda a Europa, da Polônia ao sul da Itália, uma nova disposição mental estava se<br />
plasmando. Uma indicação disso é que várias <strong>de</strong>scobertas importantes foram feitas, quase<br />
simultaneamente, por diferentes indivíduos que não teriam podido ter conhecimento do<br />
trabalho uns dos outros, muito menos recorrido ao plágio. Ali estava realmente um novo<br />
<strong>de</strong>senvolvimento. A ciência não avançou meramente em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scobertas<br />
<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s homens. Tão importante quanto esses gênios individuais foi o advento <strong>de</strong> um novo<br />
modo <strong>de</strong> pensar – que podia levar vários pensadores à mesma <strong>de</strong>scoberta ao mesmo tempo.<br />
(Ao passo que, sem um novo modo <strong>de</strong> pensar, não teria sido possível fazer nenhum avanço<br />
<strong>de</strong>finido: como os quatro elementos já haviam sido <strong>de</strong>scobertos, não havia necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
mais exploração nesse campo.) Sem esse novo pensamento, qualquer indagação sobre coisas<br />
tais como os elementos estava moribunda. Com ele, as mentes científicas logo estavam<br />
fazendo toda sorte <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobertas simultâneas.<br />
Um exemplo bastará. Galileu concluiu seu setor geométrico para o cálculo da trajetória <strong>de</strong><br />
projéteis (balas <strong>de</strong> canhão) em 1579. Apenas um ano <strong>de</strong>pois, um instrumento<br />
extraordinariamente semelhante foi produzido em Londres pelo matemático elisabetano<br />
Thomas Hood, embora isso não o tenha livrado da penúria. Nesse meio tempo o matemático<br />
holandês Dirk Borcouts, que se correspondia com Descartes, estava também trabalhando em<br />
seu próprio setor <strong>de</strong> bronze para o cálculo <strong>de</strong> projéteis. (Ele ainda po<strong>de</strong> ser visto no museu<br />
local.)<br />
Por que então Galileu é tão importante? Foi como se uma chusma <strong>de</strong>ssas diferentes<br />
tendências se reunisse em sua mente – que se revelou superior em qualida<strong>de</strong> e em alcance. A<br />
aplicação que Galileu fez da análise matemática a seus experimentos, sua originalida<strong>de</strong><br />
conceitual (por exemplo, a noção <strong>de</strong> força), sua habilida<strong>de</strong> técnica consumada, para não falar<br />
<strong>de</strong> seus golpes <strong>de</strong> gênio – foi isso que o distinguiu <strong>de</strong> seus contemporâneos. Galileu não foi<br />
sempre o primeiro a chegar a uma i<strong>de</strong>ia (mesmo quando pensava genuinamente que fora), mas<br />
a sua mente em geral o fazia da maneira mais exímia. E isso se revelava nos resultados. Nada<br />
o ilustra melhor que o uso que Galileu fez do telescópio.