vésperas do terceiro milênio, o lápis vermelho ainda seja o “instrumento de trabalho favorito”de alguns professores.Fanny conta que saiu daquela escola quando terminou o primário e voltou anos maistarde, para concluir o Normal. E lembra que reencontrou dona Linda, sem reconhecê-Ia,pois a professora aparecia “destituída do tamanho-do-medo”.Deixo aos leitores o prazer de ler o conto inteiro. Quero guardar aqui, para iniciaralgumas considerações sobre a presença da ética no espaço da avaliação, o registro quedestaquei - o tamanho-do-medo provocado pelo lápis vermelho, símbolo de uma forma deavaliar radicalmente oposta àquela que se tem procurado realizar na perspectiva de umaeducação progressista e libertadora - uma avaliação sem medo, dialógica, democrática,para a qual se busca a contribuição da ética.O recurso à filosofiaO espaço em que me situo para trazer minha palavra é o de minha formação e deminha prática - de professora, professora de filosofia, de filosofia da educação. É “à modada filosofia da educação” que tenho procurado desenvolver meu trabalho. Recorro, portanto,à reflexão filosófica para abordar, ainda que brevemente, nos limites deste artigo, a questãoda avaliação no contexto escolar e suas múltiplas dimensões.Na filosofia, busco referência ao esforço de um exercício permanente de crítica, deum olhar que procura voltar-se para a realidade no sentido de vê-Ia com clareza, profundidadee abrangência. Ver claro, para evitar os elementos que prejudicam nosso olhar, evitar asarmadilhas que se acham instaladas em nós e em torno de nós, nas situações quevivenciamos. Ver fundo, não se contentando com a superficialidade, com as aparências - aatitude crítica é uma atitude radical, não no sentido de ser extremista, mas de ir às raízes,buscar os fundamentos do que se investiga. Ver largo, na totalidade, o que implica procurarverificar o objeto no contexto no qual se insere, com os elementos que o determinam e osdiversos ângulos sob os quais se apresenta. Temos o vício de julgar que nosso ângulo é,senão o único, pelo menos o melhor, quando consideramos a realidade. Com humildade,devemos reconhecer que a contradição é uma característica fundamental do real. Ele seapresenta multifacetado e exige um esforço de abrangência para seu conhecimento.A filosofia se caracteriza como uma busca amorosa de um saber inteiro. O filósofoorienta-se num esforço de compreensão, isto é, de desvelamento da significação, do sentido,do valor dos objetos sobre os quais se volta. A compreensão éuma atividade interminável, por meio da qual, em constantemudança e variação, aprendemos a lidar com nossa realidade,conciliamo-nos com ela, isto e: tentamos nos sentir em casa no mundo(ARENDT,1993:39)Enquanto busca amorosa do saber, o gesto filosófico abriga uma articulação entreuma dimensão epistemológica e uma dimensão afetiva da relação dos seres humanoscom o mundo e com os outros, uma idéia de prender-com, de apropriar-se junto, reveladorade um “coração compreensivo, e não a mera reflexão ou o mero sentimento”, como apontaARENDT (1993:52). Guarda, ainda, como busca, um sentido de movimento, de caminharconstante. E se o saber pretendido é um saber inteiro, faz-se necessária uma atitude deadmiração diante do conhecido, de surpresa diante do habitual, a fim de conhecer mais emelhor.51
Pesquisa e PráticaPedagógica <strong>IV</strong>O que se costuma solicitar à Filosofia é que ilumine osentido teórico e prático daquilo que pensamos e fazemos,que nos leve a compreender a origem das idéias e valoresque respeitamos ou odiamos, que nos esclareça quanto àorigem da obediência a certas imposições e quanto ao desejode transgredi-Ias; enfim, que nos diga alguma coisa acercade nós mesmos, que nos ajude a compreender como, por que,para quem, por quem, contra quem ou contra o que as idéiase os valores foram elaborados e o que fazer deles.”(CHAUI,1981)A filosofia é sempre filosofia de, volta (re-flexão) sobre os problemas que nos desafiam.Como filosofia da educação ela buscará, ao lado de outras perspectivas de conhecimento,compreender o fenômeno educacional em todas as suas dimensões, procurará olharcriticamente a tarefa dos educadores e a da escola enquanto instância educativa. Desdejá, podemos verificar que, num trabalho de avaliação, sua contribuição - que se reveste deuma feição ética - será no intuito de estabelecer um questionamento contínuo de todos oselementos envolvidos no processo avaliativo, procurando, revendo e ampliando seusignificado.A avaliação no contexto escolarA instituição escolar tem uma tarefa prioritária: servir à sociedade, construindo esocializando a cultura, formando cidadãos criativos, realizando um trabalho de ampliaçãoconstante de uma boa qualidade. É comum utilizarmos o conceito de qualidade como seele já guardasse uma conotação positiva - dizemos que algo “tem qualidade”, querendoafirmar que é bom. Ora, a qualidade é um atributo essencial da realidade. Há boa e máqualidade nos seres com que nos relacionamos, nas situações que vivenciamos. Portanto,há que estabelecer com clareza o que se qualifica como bom. Definir parâmetros, referênciaspara que se avaliem as práticas e relações.Avaliar é apontar para o valor. E só se fala em valor no “departamento do humano”,que é o campo do simbólico, da atribuição de significado, de sentido. Falar em avaliarimplica reportar-se a um olhar que distingue, que rompe com a indiferença, que estabelecepontos de referência para apreciação da realidade. É importante chamar atenção paraisto: conferir valor significa manifestar-se em relação a algo, não ficar indiferente. Se não háindiferença, a manifestação se dá em relação não a um valor qualquer, mas a um determinadovalor. Quando se afirma, por exemplo, que algo é bom, é preciso indagar o que se querdizer com isto – bom por quê, para quem?Avaliar pressupõe definir princípios, em função de objetivos que se pretendemalcançar; estabelecer instrumentos para a ação e definir caminhos para atingir o fim; verificarconstantemente a caminhada, de forma crítica, levando em consideração todos os elementosaí envolvidos. A avaliação tem, portanto, um caráter processual, dinâmico, que faz parte deuma dinâmica mais ampla, a da prática educativa e a da convivência social.No processo avaliativo, vamos encontrar sempre uma dimensão técnica e umadimensão político-moral. Há sempre a necessidade do domínio de determinados52
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