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2º Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero - CNPq

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<strong>2º</strong> PRÊMIO CONSTRUINDO A IGUALDADE DE GÊNERO<br />

O trabalho noturno para estas mulheres, parece representar uma escolha, que estrategicamente<br />

possibilitaria uma forma <strong>de</strong> gerenciar o cotidiano atribulado, já que além <strong>de</strong> exercerem o trabalho<br />

profissional necessitam <strong>de</strong>sempenhar seus papéis como mãe, dona <strong>de</strong> casa e mulher. Apesar dos<br />

comentários <strong>de</strong>stas profissionais sobre cansaço e sobrecarga <strong>de</strong>vido à forma como vivenciam<br />

suas ativida<strong>de</strong>s cotidianas, percebe-se que optam por “pagar um preço” para não ficar em<br />

“dívida” diante da função social que consi<strong>de</strong>ram importante exercer enquanto mulheres.<br />

A <strong>de</strong>ssincronização em termos <strong>de</strong> horário <strong>de</strong> trabalho para estas trabalhadoras significa, por<br />

vezes, possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> convivência em alguns momentos com seus entes queridos, e em outros<br />

momentos pressupõe rearranjos e negociações para que possam compartilhar do tempo <strong>de</strong><br />

lazer e festa <strong>de</strong> amigos e familiares.<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Neste trabalho procurei apresentar elementos que contribuíssem para a reflexão acerca do<br />

“tempo” <strong>de</strong> mulheres profissionais <strong>de</strong> enfermagem que exercem plantão noturno. As mulheres<br />

entrevistadas apresentaram em seus discursos a noção <strong>de</strong> obrigatorieda<strong>de</strong> na execução <strong>de</strong><br />

atribuições socialmente <strong>de</strong>stinadas à mulher e revelam uma concepção <strong>de</strong> tempo que reflete<br />

valores <strong>de</strong> nossa cultura, on<strong>de</strong> o tempo <strong>de</strong> lazer e <strong>de</strong> cuidados consigo mesma estão em<br />

segundo plano quando comparados com o tempo para a manutenção do lar e para família. Em<br />

seus relatos apresentam queixas quanto à escassez <strong>de</strong> tempo para conviver com seus amigos e<br />

familiares e para executar tudo o que preten<strong>de</strong>m.<br />

Ao consi<strong>de</strong>rar essas mulheres como inseridas no grupo das profissionais <strong>de</strong> enfermagem,<br />

não foram observadas diferenças quanto ao discurso <strong>de</strong> técnicas <strong>de</strong> enfermagem e enfermeiras.<br />

Em seus relatos surgem queixas e especificida<strong>de</strong>s com relação à organização do dia-a-dia <strong>de</strong>vido<br />

aos horários <strong>de</strong> trabalho. Entretanto apesar <strong>de</strong>stas queixas observa-se entre elas uma espécie<br />

<strong>de</strong> naturalização do tempo <strong>de</strong> trabalho, já que consi<strong>de</strong>ram que isso “faz parte do ofício”. Ao<br />

mesmo tempo, lançam mão <strong>de</strong> estratégias no sentido <strong>de</strong> favorecer a sintonia <strong>de</strong> seus horários<br />

com os <strong>de</strong> sua família e da socieda<strong>de</strong> em geral.<br />

As entrevistadas alegam “pagar um preço” por trabalharem à noite, já que em sua visão,<br />

este é o tempo do convívio com a família e do recolhimento. Para elas, as vantagens e/ou<br />

recompensas advindas por trabalhar em um horário não usual convivem com esse “preço a ser<br />

pago”. As vantagens surgem nas falas das trabalhadoras, ao consi<strong>de</strong>rar “prático” o trabalho<br />

noturno, já que facilita a conciliação com um outro emprego, ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudo e/ou favorece a<br />

<strong>de</strong>dicação aos filhos (<strong>de</strong> dia). Quanto ao “preço”, relatam cansaço, <strong>de</strong>sgaste físico e dificulda<strong>de</strong>s<br />

em relação ao ato <strong>de</strong> dormir, parecendo atribuir ao trabalho noturno alguns efeitos sobre o<br />

“organismo”, além <strong>de</strong> repercussões na vida familiar e social.<br />

No transcorrer <strong>de</strong>ste artigo, busquei apresentar a percepção das profissionais <strong>de</strong> enfermagem<br />

quanto à vivencia <strong>de</strong> seus horários e à organização do que avaliam como o seu “tempo”,<br />

sendo este tempo entendido como um conceito construído socialmente, utilizado pelas pessoas<br />

segundo seus valores sócio-culturais. Em aparente oposição a este “tempo subjetivo”, po<strong>de</strong>rse-ia<br />

pensar em um tempo “objetivo” medido através <strong>de</strong> instrumentos, que correspon<strong>de</strong>ria<br />

ao “tempo físico” nas palavras <strong>de</strong> Szalai ( 966). Este autor consi<strong>de</strong>ra o tempo físico como,<br />

provavelmente, a única “coisa” igualitariamente distribuída entre os seres humanos, a única da<br />

qual todos recebem a mesma quantida<strong>de</strong> e da qual todos po<strong>de</strong>m gastar o mesmo montante:<br />

horas por dia, nem mais, nem menos. Nesse sentido, é interessante observar o discurso <strong>de</strong> uma<br />

das entrevistadas em relação ao tempo <strong>de</strong>dicado à dupla jornada:<br />

“...O dia em vez <strong>de</strong> ter horas, podia ter mais, podia ter 0 horas mas mesmo assim<br />

acho que não resolveria porque a gente é tão viciada em trabalho que eu acho que ia<br />

acontecer a mesma queixa <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> tempo...” (Rose – Enfermeira)<br />

Ao avaliar que po<strong>de</strong>ria se beneficiar <strong>de</strong> um dia <strong>de</strong> 0 horas, ela imediatamente reconhece<br />

que a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “esticar” o dia <strong>de</strong> para 0 horas não resolveria o problema da<br />

escassez <strong>de</strong> tempo. Assim, através <strong>de</strong>sta fala po<strong>de</strong>-se apreen<strong>de</strong>r que a queixa não se refere<br />

propriamente à falta <strong>de</strong> tempo, já que um dia com “mais horas” significaria mais horas para<br />

trabalhar. Nas palavras <strong>de</strong>sta enfermeira, se trata <strong>de</strong> um “vício em trabalho”, uma noção<br />

ligada à obrigatorieda<strong>de</strong> do trabalho, que permeou o conjunto <strong>de</strong> discursos das mulheres aqui<br />

estudadas.

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