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153<br />

que o defloramento seria delito se estivesse relacionado a mulheres honestas menores de 21 anos,<br />

sendo a perda da virgindade – no seu aspecto físico – um elemento fundamental para a existência do<br />

processo criminal. Ainda segundo a legislação republicana, as mulheres adultas seriam, a partir<br />

daquele momento, responsáveis por controlar a sua própria vida sexual – retirando a punição do ato<br />

de corromper moralmente uma viúva honesta, ou até mesmo o estupro de uma prostituta. Em casos<br />

de defloramento, aspectos físicos passaram a ser considerados dentro do processo, posto que provas<br />

como o rompimento do hímen e ausência de flacidez no corpo feminino eram indispensáveis para<br />

garantir a procedência de um crime. 343 O discurso médico surgiria então, como um segundo<br />

elemento para a realização de um controle da sexualidade. A sua inserção nos autos de um processo<br />

criminal, sob a forma de um laudo científico, consistia em um reconhecimento social da importância<br />

da ciência médica para o cotidiano da população. Uma legitimidade que era desenvolvida desde<br />

meados do século XIX, pois, segundo Jurandir Freire Costa, apenas os meios jurídico-legais não<br />

mais davam conta da iniciativa de adequar as famílias às novas condutas higienizadas pelo novo<br />

estado burguês. 344<br />

O caso de Maria Lopes de Jesus inscreve-se na situação descrita acima: a defesa da<br />

honra feminina, circunscrita à manutenção do valor moral da família, foi delineada a partir da<br />

promoção de debates científicos que relacionavam o espaço social do lar à existência de indivíduos<br />

devidamente disciplinados moralmente. E, assim, por conseqüência, este seria um lugar formador de<br />

uma força de trabalho adequada ao projeto de um “trabalhador dócil, submisso, mas<br />

economicamente ativo”. 345 Não obstante, justiça e medicina, dentre outras instituições, como a<br />

imprensa, Estado e Igreja complementavam suas ações para prescrever normas que viessem a<br />

interferir no comportamento moral da sociedade, criando dispositivos de regulação para conceituar<br />

aquilo que se entendia por normal dentro do âmbito do discurso.<br />

O discurso na forma de uma linguagem médica e jurídica, afetava a forma como os<br />

envolvidos em um crime sexual poderiam ser apresentados perante a sociedade. 346 Compreendida<br />

como uma atividade concreta que possui a intencionalidade de construir um texto, que irá exercer<br />

um poder sobre um espaço social particular, o ato de escrever tem a possibilidade de se apresentar<br />

como um jogo complexo, no qual, evidenciam-se elementos que contribuem para essa operação.<br />

Medicina, imprensa e justiça prescreviam formas de conceituar os comportamentos, elaborando<br />

343 CAULFIELD, Sueann. Em defesa da honra: moralidade, modernidade e nação no Rio de Janeiro. Campinas:<br />

UNICAMP, 2000. p. 76.<br />

344 COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Graal, 1979. p. 63.<br />

345 RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar: 1890-1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.<br />

p. 12.<br />

346 CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano. Artes de fazer. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2005, v. 1.

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