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clientes’, e eles serão assim simbolizados a partir do momento, não em que, necessariamente,<br />
pagam bem pelo programa, mas preponderantemente se este possui a distinção de durante o<br />
programa fazerem-nas vivenciar experiências para além das utilitárias, que sugerem gestos de<br />
carinho, beijos, afagos, conquistas e romance, servindo para amenizar a atmosfera de perigo e<br />
erotismo envolvida em tal exercício:<br />
Olhe, por que na prostituição tem os dois lados. Pra curtir, namorar e tem o lado de<br />
ganhar dinheiro. Todo dia é dia branco... O que não mata, engorda. Tem dia que<br />
você pega um cliente bom, sai, ganha dinheiro, ganha carícias, ganha beijos, pra<br />
arrebentar. Mas tem uns, minha filha, que vai direto ao assunto, olha pra você<br />
como você fosse um objeto. Me sinto horrível, né? Sua auto-estima fica logo baixa.<br />
A prostituição é triste, você tem que ter muito peito. Pra você tá exposto numa<br />
avenida, numa rua, no mundo em que se vive hoje de violência. É assim mesmo,<br />
tem o lado bom e o lado ruim. Vou falar pra você, eu não vou mentir não. Eu gosto<br />
da prostituição. Eu gosto de me prostituir, para os clientes bons 125<br />
Este possível abandono do caráter utilitário pode ainda revelar uma valorização de si,<br />
em oposição às transações impessoais mediadas pelo dinheiro 126 , através da possibilidade de ser<br />
desejada e cortejada, mesmo que no fugaz momento de um programa, (re) significando a<br />
prostituição com um sentido mais profundo.<br />
Ao parodiar não apenas uma profissão que historicamente foi destinada às mulheres,<br />
como também (re) significando-a através de operações muito próprias, mesclando abjeção e prazer,<br />
significando o ato de trabalhar via habilidades sexuais não puramente em seu conteúdo utilitário e<br />
trazendo o vivenciar de prazeres e sentimentos, não de degradação, mas de exaltação, para<br />
preencher a prostituição de outros sentidos, as travestis promovem os esquemas de (re) elaboração<br />
na citação característica do ato parodístico, como refletido por Butler 127 .<br />
Torna-se, neste sentido, necessário observar o fenômeno da prostituição, através da<br />
multiplicidade de motivações e opiniões dentro da mesma experiência, como um elemento que se<br />
125 Carol, 36 anos, travesti.<br />
126 BUTLER. Problemas de Gênero: Feminismo e sub<strong>versão</strong> da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,<br />
2003.<br />
127 Idem.