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162<br />

exercício da maternidade. Rachel Soihet, ao estudar a elaboração de teses médicas, no início do<br />

século XX, observou que era senso comum entre as dissertações científicas, a noção de que a<br />

mulher seria naturalmente menos propensa a impulsos sexuais, sendo, a amamentação reconhecida<br />

como o verdadeiro momento de prazer feminino 362 . O afastamento da referida jovem de um modelo<br />

familiar a condenava a ser considerada desmerecedora de uma tutela jurídica retirando-lhe o<br />

conceito de moça honesta, o que, por conseqüência, livrava o acusado de uma punição. Acrescente-<br />

se, ainda, o fato de que esta estigmatizaçao feita em torno de Maria foi tão destacada, que não foi<br />

encontrado dentro do processo o depoimento de Doroteu ou de algum familiar seu. É possível que a<br />

suposição de uma conduta irregular da jovem deva ter provocado, na autoridade policial,<br />

desinteresse em ouvir as declarações do acusado.<br />

Não eram somente os populares que engrossavam os números de casos de crimes<br />

sexuais. As famílias de grupos alto e médio também eram surpreendidas por ocorrências<br />

semelhantes, que poderiam resultar em raptos consentidos, casamentos apressados e até mesmo<br />

vinganças por questão de honra – assassinato do sedutor pelo pai ou irmãos da vítima. Em geral, as<br />

famílias preferiam evitar a publicização do fato, tanto que em Teresina eram raras as citações de<br />

crimes deste tipo. Entretanto, alguns casos ganhavam notoriedade quando estavam relacionados a<br />

denúncias da imprensa. Em 18 de julho de 1918, o Jornal de Notícias divulgava o escândalo que<br />

envolvia um integrante do corpo policial. Segundo a notícia, um rapaz chamado Cristino estava<br />

sendo acusado injustamente de ser o deflorador da menor Joana Gaudencia da Silva, enquanto que o<br />

verdadeiro ofensor, o 2° suplente de delegado de polícia, Modesto Gonçalves da Silva, andava<br />

livremente pelas ruas do bairro Poti Velho, acompanhado de Joana. A notícia, apesar de ser<br />

caracterizada como denunciativa, era dada em tom sarcástico, considerando o título da nota, “A<br />

menor Joana perdeu a sua coroa de virgem que o subdelegado do Poti Velho achou.” Acrescentando<br />

ainda, que seria “um trabalhão” repor a moralidade ao aparelho policial, justamente com a presença<br />

de um sedutor de moças honestas, pois, segundo o jornal, Joana não teria sido a primeira 363 .<br />

Nesse sentido, seria interessante afirmar que a tentativa de moralizar as condutas<br />

sexuais partia não apenas de setores do Estado, a imprensa também surgia como um agente contra<br />

as práticas irregulares, apontando casos de homens e mulheres que se desviavam de papéis sexuais<br />

higienizados e que a principio, não estivessem voltados para a formação de uma família. O jornal<br />

não atacava somente Modesto como um sedutor em potencial, mas também a jovem Joana por<br />

362 SOIHET, Rachel. Condição feminina e formas de violência: mulheres pobres e ordem urbana: 1890-1920. Rio de<br />

Janeiro: Forense Universitária, 1989. p. 116.<br />

363 A MENOR Joana perdeu a sua coroa de virgem que o subdelegado do Poti Velho achou. Jornal de Noticias,<br />

Teresina, ano 1, n. 47, 18 jul. 1918.

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