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Outra possibilidade de controle do comportamento feminino estaria na prática da<br />
maledicência e da delação 352 . A inserção de novos lazeres e sociabilidades 353 na sociedade<br />
teresinense das primeiras décadas do século XX disponibilizava a presença de ambos os sexos no<br />
espaço público, por razões que não se resumiam apenas ao aspecto do trabalho. Os comentários de<br />
amigos, conhecidos e vizinhos sobre algum comportamento indisciplinado eram também formas de<br />
vigilância eficaz, principalmente, para uma cidade de proporção populacional pequena como<br />
Teresina. E foi justamente este tipo de estratégia de controle moral que fez dar início ao processo<br />
policial sobre o defloramento de Maria Lopes, pois foi a dona da casa, para quem Maria prestava<br />
serviços, na noite do encontro com Doroteu, quem denunciou à família da jovem o fato ocorrido.<br />
Deste modo, é possível perceber que não era apenas a família quem se dispunha a cercar de<br />
cuidados a honra feminina, pessoas que mantinham certa proximidade, a exemplo da patroa de<br />
Maria Lopes, poderiam intervir diretamente, quando considerassem a existência de uma situação de<br />
risco moral.<br />
Interessante destacar o quanto o elemento matrimônio era considerado de fundamental<br />
importância para as vítimas. O compromisso formal de um casamento vindouro simbolizava a<br />
consistência de um relacionamento, pois estava constituído por uma troca mútua de virtudes e<br />
sentimentos, como o respeito e a confiança entre o casal. Entretanto, a importância atribuída ao<br />
compromisso de casamento poderia ser acompanhada pela compreensão de que não seria amoral<br />
manter relações sexuais antes da oficialização da relação. É dessa forma que poderia ter pensado<br />
Zacarias Pereira de Souza, lavrador de vinte anos, ao responder, na polícia, a acusação que recaía<br />
sobre ele de ter sido o autor do defloramento de Maria Mônica de Jesus, dezesseis anos, vivendo de<br />
seus trabalhos domésticos 354 . Zacarias confirmou ter sido o responsável pelo crime, acrescentando<br />
que, assim procedera, justamente, por ser noivo da jovem, sendo que o compromisso já era<br />
reconhecido pela família de Maria Mônica. Logo, de acordo com o seu depoimento, para o jovem<br />
lavrador, havia o interesse em contrair matrimônio e não de enganar sua pretendente com promessas<br />
falsas.<br />
No entanto, para o Secretário de Polícia, Fenelon Ferreira Castelo Branco, que<br />
acompanhava o processo, os argumentos de Zacarias dificilmente se sustentariam, pois seu caso era<br />
excepcional: havia duas acusações de sedução sexual direcionadas para ele, ao mesmo tempo. Além<br />
352 CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Mulheres plurais: a condição feminina em Teresina durante a Primeira<br />
República. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1996.<br />
353 QUEIROZ, Teresinha. Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as tiranias do tempo.<br />
Teresina/ João Pessoa: EDUFPI/EDUFPB, 1998.<br />
354 PIAUÍ. Secretaria de Estado da Polícia. Inquérito policial. Auto de perguntas feitas a ofendida Maria Mônica<br />
de Jesus. Processo Maria Mônica de Jesus. 11 jul. 1910. Casa Anísio Brito , caixa autos crimes, n. 237.