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VIII. Comunidades portuguesas dos Estados Unidos

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<strong>VIII</strong> COMUNIDADES PORTUGUESAS NOS ESTADOS UNIDOS...<br />

402<br />

a retomarem na idade adulta, não só reaprendem essa língua com enorme facilidade, como<br />

também conseguem falá-la praticamente sem sotaque, dependendo a perfeição dessa execução<br />

do nível a que falavam a língua enquanto crianças.<br />

45 Uma vez, um aluno a falar com imensa dificuldade, apresentou-se-me no início da primeira<br />

aula de uma cadeira. Disse-me que era surdo-mudo, embora conseguisse fazer-se entender<br />

devido a treinos que recebera em escolas especializadas. Não ouvia absolutamente nada,<br />

mas sabia ler nos lábios e, por isso, pedia-me que, se eu o autorizasse a frequentar a cadeira,<br />

fizesse um esforço para falar sempre voltado para a classe, a fim de ele poder ver-me a boca.<br />

Aceitei-o, naturalmente. No fim da aula, tinha uma grande curiosidade em saber até que<br />

ponto o Eric tinha conseguido perceber-me. «Quase tudo» – respondeu-me. «Tive foi que<br />

prestar muita atenção, pois tive alguma dificuldade com o seu sotaque.» (Referia-se à minha<br />

pronúncia em inglês.)<br />

Não era graça. Era mesmo a sério. O Eric não ouvia nada (nem sequer um telefone a tocar<br />

bem junto dele) e «ouvira» o meu sotaque, isto é, «vira-o» nos meus lábios.<br />

Nesse momento, eu apercebi-me de algo completamente novo e que nunca ouvira em parte<br />

alguma: as diferenças de pronúncia, os sotaques, resultam pelo menos em grande parte, de<br />

diferentes colocações <strong>dos</strong> músculos da boca. Daí que o sotaque tenha implicações mais<br />

fundas, já que as movimentações da boca não estão desligadas do resto do corpo. (Mas isto<br />

é tema para um outro artigo.)<br />

46 Tratei em pormenor a definição desse conceito no ensaio «Meio cultural e criação literária»,<br />

que vem incluído no meu livro Açores, Açorianos, Açorianidade (Ponta Delgada, Signo, 1989).<br />

47 Escrevi noutro lado sobre o conceito de língua: «Lusofonia – o que a língua não é», in<br />

Carlos CEIA, Isabel LOUSADA e João R. AFONSO (orgs.), Estu<strong>dos</strong> Anglo-Portugueses. Livro de<br />

Homenagem a Maria Leonor Machado de Sousa (Lisboa, Edições Colibri, 2003), pp. 545-551.<br />

48 Um outro escritor açoriano, José Martins Garcia, captou magistralmente esse retorno do<br />

emi grante aos hábitos culturais do país de origem aquando do seu regresso, num texto de<br />

antologia intitulado «Pátria», em que o autor narra uma viagem de autocarro de emigrantes<br />

vin<strong>dos</strong> de Paris para Portugal. Constrangi<strong>dos</strong> e pouco à vontade no meio cultural francês,<br />

eles adaptam-se tanto quanto possível aos condutores franceses que dirigem o autocarro em<br />

território de França. O seu comportamento muda um pouco com os ares de Espanha, em<br />

au to carro espanhol e com condutores espanhóis. Ao entrarem na fronteira portuguesa,<br />

transferi<strong>dos</strong> para um autocarro português e com um condutor português, os passageiros<br />

comportam-se portuguesissimamente com o à-vontade de quem está na sua casa. (Ver<br />

Receitas para Fritar a Humanidade, Lisboa, Edições Montanha, 1978, pp. 59-69.) Quem não<br />

reconhece nesse trecho o que se passa nas viagens aéreas e nos aeroportos entre as Lajes e<br />

Boston ou San Francisco?<br />

49 Capitão António CORREIA, Poucos Conhecem os Açores (Lisboa, Gráfica Lisbonense,<br />

1942), pp. 38-40. A ortografia foi actualizada.<br />

50 Insisto no carácter não universal de todas estas generalizações. Não existem leis universais<br />

em ciências sociais, mas de tendência. Poderá falar-se em termos de «maioria de casos».<br />

Depois, há que ter em conta que essa atracção inicial pelas pessoas que connosco compartilham<br />

o mesmo pano cultural de fundo pode passar a ser menos importante se essas pessoas<br />

possuem também outras características que chocam com as nossas.

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