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Historia da medicina - História da Medicina - UBI

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As Sortes e o Grupo de I<strong>da</strong>de<br />

Os rapazes <strong>da</strong>s povoações inseri<strong>da</strong>s na região <strong>da</strong><br />

Serra <strong>da</strong> Gardunha, nascidos no mesmo ano, dos<br />

finais do século passado até meados deste século,<br />

ao completarem vinte anos de i<strong>da</strong>de, entravam nas<br />

Sortes, ritual pré-liminar para a entra<strong>da</strong> no serviço<br />

militar, constituindo-se em grupo informal, o Grupo de<br />

I<strong>da</strong>de ou Conjunto de I<strong>da</strong>de (1) , em que o essencial <strong>da</strong><br />

coesão grupal era fun<strong>da</strong>mentado no factor i<strong>da</strong>de,<br />

espaço físico <strong>da</strong> aldeia e no espaço social <strong>da</strong><br />

comuni<strong>da</strong>de rural. A mesma i<strong>da</strong>de,em pessoas do<br />

mesmo sexo, fun<strong>da</strong>menta a ideia de que as pessoas<br />

são semelhantes, agrupando-se por laços de afini<strong>da</strong>de.<br />

Os elementos deste grupo informal ficavam ligados,<br />

tradicionalmente, por uma forte analogia de<br />

sentimentos de pertença ao grupo, interiorizados por<br />

uma grande relação comunicabili<strong>da</strong>de e de<br />

soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de que fortalecia a coesão, manifestando-se<br />

por comportamentos festivos ritualisados, como o<br />

“baile <strong>da</strong>s sortes”, descantes pelas ruas e refeições<br />

colectivas, com os componentes individualizados,<br />

durante as manifestações, por uma flor ou um ramo<br />

de manjerico, na lapela do casaco ou na orelha, ou<br />

por uma fita na lapela, segundo os valores e os costumes<br />

<strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de.<br />

O facto de pertencer a um grupo social, mesmo<br />

informal, encorajava a fortes laços de amizade entre<br />

pessoas e contribuía para diferenciação entre os<br />

rapazes que tinham i<strong>da</strong>de militar e os que tinham<br />

i<strong>da</strong>des inferiores. As Sortes promoviam uma amizade<br />

institucionaliza<strong>da</strong> quase sempre para to<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong>,<br />

desenvolvendo soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de de grupo, com<br />

experiências partilha<strong>da</strong>s, entre membros <strong>da</strong><br />

comuni<strong>da</strong>de não ligados pelo parentesco, grupos que<br />

se sucediam anualmente, enquanto durou a tradição,<br />

hoje em extinção.<br />

A i<strong>da</strong>de militar, como em to<strong>da</strong>s as outras i<strong>da</strong>des do<br />

homem, era marca<strong>da</strong> por atitudes e comportamentos<br />

culturais que podem ser considerados como “ritos de<br />

passagem” (2) , como uma fase de um ciclo que se<br />

desejava marcar e revelar. Por exemplo, “<strong>da</strong>r o nome”,<br />

indo à Secretaria <strong>da</strong> Câmara Municipal ou do Registo<br />

Civil, era o primeiro dos rituais em que o rapaz <strong>da</strong>va a<br />

A IDADE MILITAR E A LITERATURA TRADICIONAL<br />

NO CICLO DA VIDA DO HOMEM DA GARDUNHA<br />

por Albano Mendes de Matos*<br />

confirmação e se prontificava a pertencer,<br />

temporariamente, a uma outra família, a família militar.<br />

Particularizando, descreve-se o ritual, ou conjunto<br />

de ritos, na Aldeia do Alcaide, na primeira metade<br />

deste século, relativo à i<strong>da</strong> à inspecção médica, à<br />

parti<strong>da</strong> para a vi<strong>da</strong> militar e a algumas vivências na<br />

vi<strong>da</strong> militar.<br />

Roubo Ritual <strong>da</strong>s Flores<br />

Alguns dias antes <strong>da</strong> inspecção, os rapazes iam<br />

roubar vasos com flores, em quaisquer casas,<br />

retirando-os <strong>da</strong>s janelas e dos balcões, que eram<br />

guar<strong>da</strong>dos em locais próprios, costume que pode ser<br />

sobrevivência do rito de apropriação (3) , na iniciação<br />

dos rapazes.<br />

Na noite <strong>da</strong> véspera do dia <strong>da</strong> inspecção, os rapazes<br />

<strong>da</strong>s Sortes “arranjavam” o chafariz <strong>da</strong> praça,<br />

ornamentando-o com as flores que tinham roubado,<br />

colocando-as em prateleiras, organiza<strong>da</strong>s em<br />

pirâmide, monta<strong>da</strong>s em volta do chafariz. Em alguns<br />

anos, eram colocado um quadro com as fotografias<br />

de todos os rapazes <strong>da</strong>s sortes, como afirmação social<br />

do grupo ao qual pertenciam.<br />

Pela manhã, muitos alcaidenses deslocavam-se à<br />

praça para observarem o chafariz “arranjado”. Durante<br />

o dia, as mulheres e as raparigas retiravam os vasos<br />

com flores que eram sua proprie<strong>da</strong>de.<br />

O Banho Ritual<br />

Depois do arranjo do chafariz, muitos dos rapazes<br />

iam a um tanque ou à ribeira tomar banho, um banho<br />

colectivo, como que no ritual de purificação, observado<br />

em diversas socie<strong>da</strong>des (4) .<br />

I<strong>da</strong> às Sortes<br />

42<br />

De acordo com o horário do Edital, os rapazes <strong>da</strong>s<br />

sortes caminhavam para o Fundão. Iam a pé, em<br />

grupo ruidoso, com um, dois e, às vezes, três<br />

tocadores de concertina ou de acordeon, à frente,<br />

contratados para tocarem durante os rituais. Todos<br />

levavam ramos de manjerico na lapela do casaco. Até

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