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Historia da medicina - História da Medicina - UBI

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e reciclagem, inúteis, pesados aos filhos e mais ain<strong>da</strong><br />

às noras e aos genros. Pesos mortos que têm de ser<br />

alimentados, vestidos, alojados, suportados. E há<br />

quem julgue que tem lugar no céu só porque os<br />

alimenta, os veste, os aloja, os suporta.(...) Esperam<br />

portanto ao sol, quando há sol. Se chove têm a parede<br />

em frente, ou o écran em frente, ou ain<strong>da</strong> o transistor<br />

ou um jornal lido, esquecido, lido de novo. Há quanto<br />

tempo os reformou a vi<strong>da</strong>? Sem ordenado por inteiro,<br />

naturalmente. Sem nenhum ordenado tantas vezes.<br />

Pô-los de parte, só isso. São os velhos, os<br />

imprestáveis. Uma espécie de disposables deste<br />

mundo que ca<strong>da</strong> vez venera menos os velhos”.<br />

VELHOS, O Homem no Arame.<br />

A última estrofe de O Guar<strong>da</strong>dor de Rebanhos<br />

(Alberto Caeiro, Fernando Pessoa) teima numa<br />

jura de amor à vi<strong>da</strong>, renova<strong>da</strong> em ca<strong>da</strong> instante: “É<br />

talvez o último dia <strong>da</strong> minha vi<strong>da</strong>. / Saudei o Sol<br />

levantando a mão direita, / Mas não o saudei, dizendolhe<br />

adeus, / Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais<br />

na<strong>da</strong>”.<br />

São ain<strong>da</strong> os velhos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Lisboa, que pode<br />

traduzir outra ci<strong>da</strong>de qualquer, que falam nas palavras<br />

do poeta Alexandre O’Neill:<br />

Em suma: somos os velhos.<br />

cheios de cuspo e conselhos.<br />

velhos que ninguém atura<br />

a não ser a literatura<br />

e outros velhos. (Os novos<br />

afirmam-se por maus modos<br />

com os velhos). Senectude<br />

é tempo não é virtude...<br />

Decorativos? Talvez...<br />

Mas por dentro “era uma vez...”<br />

(...)<br />

(Tomai lá do O’Neill)<br />

Como em Velhos / 4, o poeta nos fala de Azeredo,<br />

representativo de muitos outros Azeredos, um outro<br />

sem nome - “Pouco a pouco arrumaram-no - é a vi<strong>da</strong>!<br />

- / “num trabalho muito mais consentâneo / com as<br />

suas possibili<strong>da</strong>des actuais.” Que é o não-trabalho.<br />

É este pôr de lado que transforma o homemconsiderado-um-velho<br />

num marginalizado, sentindo o<br />

sabor acre <strong>da</strong> inutili<strong>da</strong>de. Alguns (e sobretudo os que<br />

tiveram uma vi<strong>da</strong> intelectual intensa, que neste transe<br />

os alimenta) sabem defender-se e protestar e ocupar<br />

o seu lugar na vi<strong>da</strong> até ao fim. Constata-se a<br />

produtivi<strong>da</strong>de e criativi<strong>da</strong>de de grandes homens na<br />

considera<strong>da</strong> terceira i<strong>da</strong>de: recordemos Sófocles,<br />

Platão, Cícero, Kant, Goethe, Cervantes, Verdi,<br />

Stravinsky, Miguel Ângelo, Ticiano, Goya, entre outros.<br />

Como diz Cícero, “os grandes empreendimentos não<br />

62<br />

se levam a cabo por meio <strong>da</strong> força ou <strong>da</strong> veloci<strong>da</strong>de<br />

ou <strong>da</strong> agili<strong>da</strong>de do corpo, mas sim pela sabedoria,<br />

pela autori<strong>da</strong>de e pelos bons conselhos”.<br />

Outros homens há: os que sentem a tortura de se<br />

sentir a mais, de serem desprezados e esquecidos,<br />

de apenas ouvirem palavra-grito: “veja o que está a<br />

fazer!; Olhe que suja tudo!; Eu não aguento com este<br />

trabalho!” e sei lá que mais...<br />

Nos humanos Bichos de Torga, é um cão, Nero,<br />

que exprime a aflição de estar velho e às portas <strong>da</strong><br />

morte: “Que para chegar à miséria presente, antes<br />

tivesse morrido também. Ao menos, deixava<br />

sau<strong>da</strong>des. Assim, acabava de velhice, podre por<br />

dentro, a meter fastio a to<strong>da</strong> a gente. (...) Agora lia<br />

nos olhos de todos o desejo de que partisse o mais<br />

depressa possível (...)”.<br />

Os homens consideram outros homens na terceira<br />

i<strong>da</strong>de, esquecendo que o tempo é cavalo louco que<br />

também os vai derrubar, esquecendo que esses que<br />

consideram velhos poderiam ser socialmente<br />

produtivos (já que os seus negócios são sempre<br />

números..) com activi<strong>da</strong>des menos duradoiras (e a<br />

ideia não é minha), proporcionando continui<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

sua integração e colhendo frutos do saber de<br />

experiência feito e <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de decorrente. Mas o<br />

que acontece? No final <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, o homem sente-se<br />

despojo - <strong>da</strong> família, <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, dos outros<br />

homens. Um extremo de horror pode ler-se em O beco<br />

onde mora o rei Lear, de Eça de Queirós (Farsas,<br />

Prosas Bárbaras).<br />

Alberoni diz que o reconhecimento está sempre<br />

presente na moral e esta não existe sem amor, não<br />

lhe bastando a razão que a sustentava em Kant. Se<br />

os Centros de Dia e os Lares de Terceira I<strong>da</strong>de<br />

cumprem prestimosa e prestigiosa missão, quando<br />

equipados, não com luxos materiais, mas com seres<br />

humanos preparados e capazes de <strong>da</strong>r amor, são ain<strong>da</strong><br />

insuficientes qualitativamente (para além <strong>da</strong><br />

insuficiência do seu número): nunca passarão dum<br />

meio, que terá de completar-se com a presença<br />

assídua dos que povoaram o coração do homem velho:<br />

os familiares, os amigos, os que amou.<br />

Um mundo perturbadoramente desumanizado nos<br />

envolve: tentáculos dum polvo quotidiano, de corri<strong>da</strong>s,<br />

de máquinas, de competição selvática. E o que é<br />

preciso é ter tempo para o amor. Furar os olhos do<br />

tempo (como diz Torga), se necessário. Mas também<br />

é preciso este necessário, que passa por uma<br />

educação.<br />

Nuno Grande dizia no Jornal de Notícias (6/03 /94)<br />

que “os povos que não respeitam os velhos destroem<br />

a respectiva identi<strong>da</strong>de, porque não reconhecem a<br />

própria memória” e que “é imperativo voltar a colocar<br />

os idosos na cúpula <strong>da</strong> família portuguesa”. Um pouco<br />

por to<strong>da</strong> a Europa se debate este problema.<br />

Sem pretender demagogia, refiro um texto dum<br />

poster <strong>da</strong> Multinova, divulgado há alguns anos:

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