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Historia da medicina - História da Medicina - UBI

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Cuspir-lhe o corpo, que vi<br />

E era como um pomar!...<br />

Senhor, eu então comi.<br />

Miguel Torga, Relato (Coimbra, 27 de Fevereiro de<br />

1939), Ant. Poética<br />

E os poetas são amantes <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>:<br />

É o amor que me inspira.<br />

Amo a vi<strong>da</strong>, esta bela prostituta.<br />

Esta mulher tão pura e dissoluta<br />

No mesmo instante,<br />

Que não dá tréguas a nenhum amante.<br />

(...)<br />

Miguel Torga, Ditirambo (Coimbra,<br />

25 /06/1958), Ant. Poét.<br />

Por isso, o mesmo poeta reitera este amor no Madrigal<br />

dos cinquenta anos (18 de Julho de 1957,<br />

Coimbra):<br />

Com as mesmas palavras do passado,<br />

Digo que te desejo, vi<strong>da</strong>!<br />

E como um namorado<br />

Que desmede a paixão, já desmedi<strong>da</strong>,<br />

Prometo<br />

Ser-te fiel sem esperança.<br />

Fiel à consciente<br />

Temeri<strong>da</strong>de<br />

De amar intensamente<br />

Sem moci<strong>da</strong>de...<br />

No homem renasce continuamente aquele Ícaro que<br />

queria chegar ao céu, mesmo com asas de cera, que<br />

o calor do sol iria derreter e precipitar no mar... O sol<br />

dos sonhos queima, mas a tentativa é váli<strong>da</strong>. E no<br />

homem há sempre asas de Ícaro, substitutas de outras<br />

asas já derreti<strong>da</strong>s...<br />

Mas o Tempo espreita ca<strong>da</strong> minuto <strong>da</strong> sua espera:<br />

ESPERA<br />

Aguardo as minhas mãos, aguardo<br />

enfim a forma deseja<strong>da</strong><br />

na espera longa permiti<strong>da</strong><br />

e tão sonha<strong>da</strong>, tão sonha<strong>da</strong>.<br />

Quebro o meu ser no fogo em que ardo,<br />

em cinza eterna a minha vi<strong>da</strong><br />

se desfaz!... Que frio sustém<br />

no entanto a longínqua hora<br />

para que eu me perca no tempo<br />

que me parece haver lá fora?<br />

Ah! Tempo que o tempo retém<br />

sem permitir que chegue o Tempo!<br />

António Salvado, Recôndito.<br />

É a cruel<strong>da</strong>de do tempo sádica e masoquista em<br />

simultâneo: faz sofrer pela agressão concreta do gosto<br />

60<br />

do efémero e provoca a dor de ca<strong>da</strong> ser por ser o<br />

próprio culpado do sofrimento, quando constata,<br />

tardiamente, que foi abdicando e adiando. O adiado<br />

nunca mais é vivido com a força dum certo tempo<br />

marcado no fio de Lâquesis:<br />

Constrói com as tuas mãos o dia de hoje<br />

que amanhã veloz o tempo não será<br />

igual à força do momento agora...<br />

(...)<br />

António Salvado,<br />

Difícil Passagem, p.51.<br />

Uma contínua aprendizagem do homem se<br />

concretiza no seu viver, uma aprendizagem tanto mais<br />

formativa, quanto mais ele tem consciência <strong>da</strong>s suas<br />

que<strong>da</strong>s, quanto mais corajoso for, não desistindo <strong>da</strong><br />

luta, afirmando-se com autentici<strong>da</strong>de. Porque viver é<br />

estar desperto e atento. “Quanto mais profun<strong>da</strong>mente<br />

se dorme, mais estremunhado se acor<strong>da</strong> com a<br />

reali<strong>da</strong>de. Ninguém vive indefini<strong>da</strong>mente entre<br />

parêntesis” (Miguel Torga, Diário XV, p.95).<br />

O homem colhe <strong>da</strong> plenitude de ser e de se afirmar<br />

na pertinácia de não desistir nunca <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Porém...<br />

subtilmente, o corpo começa a <strong>da</strong>r o sinal duma<br />

espécie de juro pago na totali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> entrega:<br />

VÉNUS ENVELHECIDA<br />

Arrefeceu a cor dos teus cabelos.<br />

O tempo tudo apaga e desfigura...<br />

Que palha triga, sensual, madura,<br />

O loiro resplendor que rememoro!<br />

Chove ou sou eu que choro<br />

Desiludido?<br />

Como era quente o oiro <strong>da</strong> seara!<br />

Ah, deusa sem tiara,<br />

Mito desvanecido!<br />

Miguel Torga (Miramar, 16 de Agosto<br />

de 1963), Ant. Poét.,<br />

numa angústia, mesmo Pesadelo, como diz Raúl<br />

de Andrade: “Coisa estranha como a cor / Arranca<strong>da</strong><br />

duma tela, / A alma absorta na dor / De não ter corpo<br />

p’ra ela (Pontos de Vista - Poemas).<br />

Aquela consciência de que Átropos está sempre<br />

atenta ao fio, para o cortar, torna-se incisiva e<br />

acutilante. Muitos homens apercebem-se sempre <strong>da</strong><br />

sua sombra. Têm mais mérito na teimosia <strong>da</strong> sua<br />

luta. Porque é lógico a presença <strong>da</strong> morte gerar o<br />

homem absurdo. Mas o coração e a alma têm a lógica<br />

<strong>da</strong> sua força: teimar na esperança de ca<strong>da</strong> instante,<br />

poética <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, no sussurro do carpe diem...<br />

A socie<strong>da</strong>de, exigente de produção material à vista,<br />

estipulou que o homem tem uma terceira i<strong>da</strong>de e tornou<br />

necessário reformar o homem. Estipulou-se a velhice<br />

como uma doença... “ Não há nenhuma doença<br />

chama<strong>da</strong> envelhecimento, como não há nenhuma

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