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Ou você faz algo que mereça ser lembrado, ou não pode querer isso. Acho<br />
que se tudo morrer comigo, não tem problema. Brecht dizia: quem morre é<br />
o morto. E, para citar novamente o dramaturgo, Cida segue à risca as palavras<br />
ditas por ele em 1929: O verdadeiro progresso não está no ter progredido,<br />
mas no progredir.<br />
Daí os trabalhos de Brecht terem sempre sido escritos não apenas em parcerias<br />
e colaborações de outras pessoas, mas também ao longo dos anos, durante<br />
os quais o dramaturgo alterou situações históricas, perfis psicológicos de<br />
personagens e até mesmo a direção ideológica tomada pela narrativa. Esta<br />
postura esteve sempre de acordo com as novas visões do autor e com as<br />
necessidades de transformação que o mundo, em períodos de crise como<br />
o da 1ª Guerra Mundial, por exemplo, ia lhe impondo. Basta lembrarmos<br />
que Mahagonny trata-se, na verdade, de um grande estudo sobre o tema da<br />
cidade paradisíaca. Muito foi reescrito, alterado e ampliado, até se chegar à<br />
<strong>versão</strong> da ópera Ascensão e Queda da Cidade Mahagonny (1930).<br />
Como tão bem definiu Zé Rodrix, certa vez, ao escrever sobre o disco Cida<br />
Moreyra interpreta Brecht, a decisão de procurar no fundo o que seja verdadeiro<br />
passa forçosamente pela reobservação do que seja básico entre nós.<br />
Ou seja, retomar o essencial para seguir em direção ao real. A própria capa<br />
do disco já é uma retomada do personagem que Cida viveu na montagem<br />
de Mahagonny, em suas características essenciais 60 .<br />
Brecht é, portanto, para Cida, referência das mais reveladoras. Transpostos<br />
para a sua realidade e sua arte, os principais fundamentos do espírito brechtiano<br />
e de suas teorias cênicas estão presentes na música de Cida que, cada vez<br />
mais, depura sua personalidade fundindo todo esse conhecimento com sua<br />
vida prática. Esse aproveitamento, por sua vez, também constitui um dos<br />
principais pilares da proposta de atuação sugerida por Brecht, segundo a<br />
qual o ator deve construir cada cena utilizando traços da personagem reconhecíveis<br />
em si mesmo. Assim, representa-se o papel escrito sem que,<br />
em momento nenhum, sua real identidade seja abandonada.<br />
Com isso, torna-se viável para o ator exercer um olhar crítico sobre a própria<br />
personagem, ao mesmo tempo que a vive. Em cena, Cida representa claramente<br />
uma persona – talvez a trágica dona de bordel em seu espírito<br />
exuberante, decadente, marginal e belo – sem nunca deixar, contudo, de se<br />
parecer com ela mesma.<br />
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