Marcele Regina Nogueira Pereira - Unirio
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As exposições, seus circuitos, textos e legendas requeriam de seus visitantes um tipo de<br />
comportamento que pertencera até então somente às camadas ilustradas. Os modelos mais<br />
antigos de estrutura arquitetônica de galerias e museus são aqueles em que o percurso do<br />
visitante é totalmente dirigido. A estrutura arquitetônica apresentada pelos museus<br />
certamente contribuiu para que um novo padrão de normas e atitudes se impusesse sobre<br />
o comportamento usual encontrado em tavernas, circos, feiras livres e festas populares.<br />
Os museus europeus, ao abrirem suas portas a um grande público, detinham uma estrutura<br />
que trazia certo constrangimento aos que não estavam acostumados com ela (SANTOS,<br />
1999, p. 110).<br />
É interessante perceber como os museus europeus, os norte-americanos ou os<br />
brasileiros, segundo (SANTOS, 1989, 1992, 1999) contribuíram com o surgimento de novos<br />
hábitos e costumes, em que práticas consideradas incivilizadas – risos, gargalhadas, gestos<br />
descomedidos, gritos e correrias – foram postos de lado. Estes hábitos “não civilizados”<br />
significavam justamente a liberdade dentro dos museus, a livre escolha de percursos, trajetos e<br />
interpretações intoleráveis. Tais hábitos ficavam sob controle dos profissionais dos museus<br />
que determinavam e controlavam todo o acesso ao museu. Os visitantes não tinham<br />
alternativa ao que era ofertado. Santos nos aponta que, além disso, a divulgação de uma arte<br />
erudita ou cultura de elite no espaço do museu implicou a autodisciplina do corpo e do olhar e<br />
a rejeição generalizada a gestos descomedidos, aglomerações e manifestações populares.<br />
Os museus foram um dos locais responsáveis pela formação de uma esfera pública, polida<br />
e educada, mas, evidentemente, o poder que detinham neste sentido atrelava-se a<br />
capacidade de atrair um público numeroso. Sem público, qual o poder disciplinador dos<br />
museus? (SANTOS, 1999, p. 103)<br />
Outro aspecto importante para o entendimento da educação em museus e sua dimensão<br />
cívica são as teorias evolucionistas que podem ser identificadas em diversos estudos<br />
publicados na Europa e Estados Unidos acerca da superioridade da raça branca em detrimento<br />
da miscigenação entre as raças entendidas por inferiores, notadamente, negras e indígenas. Os<br />
conceitos de progresso e civilização aparecem intimamente ligados à teoria evolucionista 9 e os<br />
museus tornam-se, em certa medida, a casa da memória a serviço da construção dos ideais de<br />
progresso e civilidade. Em artigo publicado nos Anais do MHN, <strong>Regina</strong> Abreu (1995)<br />
descreve a relação entre o Museu Histórico Nacional e as teorias evolucionistas, de como<br />
podem estar associadas ao surgimento do Museu. Nas palavras de Abreu, “o museu assume a<br />
função de espaço civilizatório aos moldes do que a elite letrada compreende a civilização”. O<br />
MHN é criado na perspectiva de difundir, ilustrar e perpetuar a memória nacional construída<br />
9 SCHWARCZ, Lilia K. M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-<br />
1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.<br />
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