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O Cena 11 tem sujeitos e verbos, nomes maiúsculos e ações de combate.<br />
Alejandro Ahmed, Anderson Gonçalves, Cristiano Prim, Eduardo Serafin, Fernando<br />
Rosa, Gregório Sartori, Hedra Rockenbach, Karin Serafin, Karina Barbi, Kiko<br />
Ribeiro, Letícia Lamela, Marcela Reichelt e Mariana Romagnani fazem toda a<br />
diferença quando os verbos são correr, rastejar, subverter, agarrar, segurar, abraçar,<br />
rolar, chocar, desenhar, pular, desarticular, derrubar, falar, engatinhar, girar, cantar,<br />
lincar, samplear, arremessar, cair, projetar, escorregar, animar, jogar, bater, ajoelhar,<br />
brincar, violentar, deslizar.<br />
Como o garotinho do filme As Coisas Simples da Vida (2000), de Edward Yang, que tirava<br />
fotografias das pessoas de costas “para mostrar o que elas não podem ver”, o Cena<br />
11 exibe ao que não assistimos facilmente. Sua <strong>dança</strong> é uma atitude diante da vida (e<br />
não uma ilustração de temas), onde a ação é mais importante do que a forma. Aliás, o<br />
que motiva a forma já é forma. O limite é alavanca e o bailarino deve, acima de tudo,<br />
superexpor o ser humano que mora nele.<br />
O Cena 11 pertence a uma rede de informação. Habita uma região de fronteiras no mapa<br />
da <strong>dança</strong>-tecnologia, fazendo contatos e flexibilizando seus limites.<br />
O grupo é do Brasil mas sua <strong>dança</strong> pertence ao mundo.<br />
Este livro surgiu a partir de uma pesquisa acadêmica que considerou, em suas<br />
premissas gerais, os seguintes instrumentos teóricos, para compreensão do corpo que<br />
<strong>dança</strong>: a Teoria da Evolução Cultural, a Teoria Geral <strong>dos</strong> Sistemas e os estu<strong>dos</strong> liga<strong>dos</strong><br />
ao CorpoMídia.<br />
Não adentraremos em longas explicações a respeito da Teoria <strong>dos</strong> Sistemas e da Teoria<br />
da Evolução, apenas citarei algumas dissertações e teses 1 que conseguiram excelentes<br />
resulta<strong>dos</strong> na aplicabilidade dessas ferramentas teóricas na <strong>dança</strong>.<br />
Entre essas pesquisas, A Improvisação em Dança: um Processo Sistêmico e Evolutivo,<br />
desenvolvida por Cleide Martins (1999), abordou a <strong>dança</strong>, como o próprio título diz, com<br />
uma visão sistêmica e evolutiva. Do mesmo modo, consideramos o Grupo Cena 11 Cia. de<br />
Dança um sistema aberto, que vem se modificando no eixo do tempo, “perturbando a<br />
estrutura do espaço/tempo à volta deles em seu meio ambiente, o qual, por sua vez, pode<br />
também perturbá-los” (Martins, 1999:24).<br />
Segundo esta teoria, na visão do filósofo e teórico da física Mário Bunge (1979), a<br />
18 Bailarinos do elenco atual do Cena 11.<br />
1 IMPARATO, Maria Gabriela<br />
C. T. P. Morse de sangue<br />
(1999); MARTINS, Cleide. A<br />
improvisação em <strong>dança</strong>: um<br />
processo sistêmico e evolutivo<br />
(1999) ; MARTINS, Cleide.<br />
Improvisação, Dança, Cognição:<br />
os processos de comunicação<br />
no corpo (2002); KATZ, Helena.<br />
Um, Dois, Três: a <strong>dança</strong> é o<br />
pensamento do corpo (1994);<br />
AQUINO, Dulce. A <strong>dança</strong><br />
como tessitura do espaço<br />
(1999); MACHADO, Adriana<br />
B. Natureza da permanência:<br />
processos comunicativos<br />
complexos e a <strong>dança</strong> (2001);<br />
BRITTO, Fabiana Dultra.<br />
Mecanismos de Comunicação<br />
entre Corpo e Dança:<br />
parâmetros para uma história<br />
contemporânea (2002).<br />
2 “[...] é admitida uma<br />
realidade, preenchida de<br />
‘coisas’ ou sistemas. Sistemas<br />
em sua imensa maioria sendo<br />
abertos sofrem perturbações<br />
através do meio ambiente<br />
e podem também perturbálo.<br />
Tais perturbações,<br />
quando, por um <strong>dos</strong> nossos<br />
critérios de observação, são<br />
percebidas como unitárias,<br />
são os eventos, que em cadeia<br />
geram os processos. E estes,<br />
quando percebi<strong>dos</strong> por um<br />
determinado sujeito, são os<br />
fenômenos” (VIEIRA, 1994, p.<br />
23). Consideramos também a<br />
noção de sistemas abertos<br />
formulada pelo biólogo<br />
Ludwig von Bertalanffy, em<br />
1940 (HEYLIGHEN, 1998).<br />
realidade 2 é formada por sistemas abertos que, ao longo do tempo, sofrem transformações.<br />
O sistema “implica a coisa (uma espécie de agregado que possui características de espaço,<br />
tempo, matéria e energia), o meio ambiente e também dois tipos de relações: as da<br />
própria coisa e aquelas entre a coisa e o meio” (Martins, 1999:28).<br />
Sistemas abertos estão permanentemente em interação com o meio ambiente,<br />
internalizando informações e devolvendo-as transformadas ao mundo, que os modifica,<br />
e assim sucessivamente. A <strong>dança</strong> não existe sem um corpo que necessariamente, por<br />
condição de existência, prossegue através de relacionamentos com o mundo por processos<br />
coevolutivos.<br />
“[...] dentro do sistema <strong>dança</strong>, um corpo que <strong>dança</strong> recebe essas informações do mundo<br />
do sistema <strong>dança</strong>, que já está carregado de informações do mundo, informações estas que<br />
passam a ser internalizadas pelo corpo que <strong>dança</strong>. Esse corpo manda informações para<br />
o sistema <strong>dança</strong>, que as manda para o mundo. Todo o tempo as trocas são permanentes<br />
entre o interno e o externo e isso se chama coevolução” (MARTINS, 1999, p.29).<br />
Todo organismo vivo pretende sobreviver e, para tanto, precisa trocar informações. Um<br />
corpo que, por exemplo, recebeu a informação “andar de patins” e não volta a praticá-<br />
la condena-a à descontinuidade. Para permanecer, um sistema se alimenta das trocas de<br />
informações que faz, alterando-se e alterando seu ambiente. O corpo humano como um<br />
sistema aberto tem a habilidade, a possibilidade de receber e selecionar informações,<br />
complexificando-se e tornando-se cada vez mais apto à sobrevivência. Nesse sentido, a<br />
<strong>dança</strong> pode ser entendida como uma maximização desta relação, dada sua complexidade.<br />
A partir do momento em que o Grupo Cena 11 passou a existir como um organismo,<br />
formando um núcleo de pessoas e delimitando uma membrana, um dentro e um fora, foi<br />
viabilizado o seu processo evolutivo, sua capacidade de trocar e selecionar informações<br />
com o meio ambiente do qual faz parte.<br />
Entendemos o grupo como um sistema aberto, complexo, em transformação e formado<br />
pela relação com os subsistemas: movimento, corpo + cultura, de acordo com a<br />
formulação desenvolvida por Martins (1999:32). De acordo com a autora, <strong>dança</strong> é um<br />
sistema formado pelo movimento, que opera no meio ambiente, composto da adição<br />
corpo + cultura, através de relações estabelecidas entre movimento e meio ambiente e<br />
dentro do movimento e do meio ambiente.<br />
Ou seja, D = {M, corpo + cultura}<br />
Desta forma, “[...] coreógrafo, quando demarca uma coreografia, planeja um conjunto<br />
de movimentos no espaço/tempo, relaciona<strong>dos</strong> ao corpo + cultura, e o <strong>dança</strong>rino, ao<br />
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