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a dança dos encéfalos acesos

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importantes cineastas da história do cinema da América do Norte, continente para o qual<br />

ela imigrou em 1922.<br />

Foi Maya Deren quem liderou a revolução ocasionada pelo surgimento do equipamento<br />

16mm, que trouxe o nascimento do filme como uma expressão artística pessoal. Com<br />

uma pequena herança que recebeu do pai, ela comprou de segunda mão uma câmera<br />

Bolex e realizou, ao lado do marido, Alexander Hammid, Meshes of the Afternoon. Obra-<br />

prima de 1943, mereceu o Grand Prix International for 16mm Film, na categoria Filmes<br />

Experimentais do Festival de Cannes, em 1947. O reconhecimento veio para confirmar o<br />

experimentalismo e a vanguarda de seu trabalho. Era a primeira vez que uma cineasta<br />

mulher e uma produção cinematográfica originária <strong>dos</strong> Esta<strong>dos</strong> Uni<strong>dos</strong> ganhavam o<br />

prestigiado prêmio.<br />

No filme, o movimento é empregado para provocar uma espécie de pesadelo surrealista, em<br />

que objetos e pessoas aparecem, desaparecem e reaparecem feito mágica. Câmera subjetiva,<br />

plano e contraplano, fusão, sombras, destaque para fragmentos de corpo, dupla exposição<br />

são alguns <strong>dos</strong> recursos que Deren utilizou para criar sua cinematografia, numa época em<br />

que os filmes ainda eram mu<strong>dos</strong>. Memória e sonho constroem narrativa e temporalidade.<br />

Os pés que caminham sobre carpetes, grama, areia, cimento revelam a exploração de uma<br />

conexão visual, como se lugares distantes pudessem se tornar vizinhos.<br />

A produção é maior, mas os filmes de <strong>dança</strong> 10 de Maya Deren mais conheci<strong>dos</strong> são o já<br />

citado Meshes of the Afternoon; Ritual in Transfigured Time (1943), com a <strong>dança</strong>rina Rita<br />

Christiani, Anaïs Nin e Frank Westbrook (que também assina a colaboração coreográfica); e<br />

A Study in Choreography for Camera (1945). Este último feito em parceria com o bailarino<br />

Talley Beatty e descrito por Hella Heyman, a camerawoman do filme, como “inovador e<br />

herético”. Uma espécie de geografia do espaço acontece com base no movimento do<br />

bailarino, característica que também constrói a idéia de tempo.<br />

O quarto e mais recente <strong>dos</strong> filmes de <strong>dança</strong> de Deren é The Very Eye of Night (1952-<br />

1955), realizado em colaboração com os estudantes da Metropolitan Opera Ballet School<br />

e com direção coreográfica de Antony Tudor.<br />

Em Ritual in Transfigured Time, Deren conta uma história sem palavras que não é<br />

propriamente uma história em seu entendimento usual, já que o tempo é o motivo<br />

cinematográfico. 11<br />

Um <strong>dos</strong> recursos de edição experimenta<strong>dos</strong> por Maya Deren, a dupla exposição (que<br />

formata noções de temporalidade), deu origem à idéia da montagem como composição,<br />

o que supostamente transformaria os filmmakers em verdadeiros coreógrafos. Como se ao<br />

editar um filme o cineasta estivesse montando uma coreografia das imagens, trabalhando<br />

10 O volume 2 da série The<br />

History of Dance on Film &<br />

Video traz os filmes de <strong>dança</strong><br />

de Maya Deren.<br />

11 Fotogramas deste filme estão<br />

disponíveis no www.re-voir.com.<br />

Ver www.zeitgeistfilms.com.<br />

com o tempo e o espaço, assim como fazem os orquestradores do corpo.<br />

Artista com múltiplos interesses – ciência política, <strong>dança</strong>, literatura, jornalismo,<br />

antropologia, kickboxing taiwanese e rituais religiosos do Haiti –, Maya Deren também foi<br />

a primeira cineasta a receber a Guggenheim Foundation Fellowship, em 1947, um prêmio<br />

para Creative Work in the Field of Motion Pictures. Com isso, Deren viajou para o Haiti,<br />

onde não só filmou Divine Horsemen, película sobre a <strong>dança</strong> haitiana e a cosmologia<br />

vodu, como também escreveu, em 1953, Divine Horsemen, the Living Gods of Haiti, um<br />

estudo etnográfico sem precedentes sobre a referida religião.<br />

Outro escrito de sua autoria é An Anagram of Ideas on Art Form and Film (1946), uma<br />

espécie de tratado sobre a relação entre arte, ciência e processo criativo. Maya, que<br />

significa véu da ilusão na mitologia hindu, faleceu, aos 44 anos, em Nova York, em 1961,<br />

deixando-nos um legado inestimável.<br />

Outra vertente na investigação do movimento é aquela que reúne fotógrafos como Man<br />

Ray, Walter Ruttmann, Ed Emshwiller (só para citar alguns) e suas imagens <strong>dança</strong>ntes.<br />

Nessa época, múltiplas manifestações surgiram da relação do cinema com a <strong>dança</strong>, o que<br />

despertou o interesse pela experimentação de novas dinâmicas, ritmos e poéticas próprias<br />

do movimento. Cineastas como Jean-Luc Godard e Thierry Knauff foram alguns <strong>dos</strong> que<br />

brincaram com esta idéia, diante da máquina de fazer a montagem.<br />

O caminho da recriação do corpo na tela, aberto por Maya Deren, encontra muitos<br />

adeptos no correr <strong>dos</strong> ventos. Cineastas e coreógrafos passaram a trabalhar juntos e<br />

surgiram as mais diversas contribuições, outrora irrealizáveis. Ao se contaminarem, as<br />

duas artes desembocaram em jeitos de <strong>dança</strong>r e de explorar, tanto no palco como na tela,<br />

novas maneiras de pensar o espaço e o tempo.<br />

A câmera muda o olhar do coreógrafo, o corpo do cinegrafista, o olhar do cineasta, o<br />

corpo que <strong>dança</strong> e a sua reprodução.<br />

rosas danst rosas<br />

Um <strong>dos</strong> exemplos mais instigantes dessa mu<strong>dança</strong> no olhar foi o interesse que a<br />

coreografia Rosas, da belga Anne Teresa De Keersmaeker, despertou em cineastas e<br />

videomakers. Depois de apresentada por dez anos nos palcos, a obra ganhou o nome Rosa<br />

quando foi recriada para a tela pelo artista multimídia Peter Greenaway, em 1992.<br />

Outro colaborador que também se seduziu pelo desafio foi o músico e cineasta Thierry<br />

De Mey. Rosas danst Rosas (1997), realizado em 35mm, está muito longe de ser um mero<br />

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