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executar uma coreografia (considerada aqui apenas no seu aspecto motor), trabalha<br />
com cadeias unidirecionadas de espaço/tempo, ou seja, com movimentos relaciona<strong>dos</strong><br />
seqüencialmente” (Martins, 1999, p.39).<br />
Embora o corpo humano tenha limitações biomecânicas, por exemplo, a impossibilidade de<br />
girar o pescoço 360 graus, muitos coreógrafos exploram diferentes maneiras de desenvolver<br />
o movimento. David Zambrano, professor venezuelano e criador da técnica conhecida por<br />
Flying Low Tecnique, é um destes investigadores. Devido a uma impossibilidade de mover<br />
parte da perna, acabou por criar um modo de <strong>dança</strong>r e movimentar o corpo mesmo<br />
com essa limitação. A “técnica de voar baixo” é um exemplo disso.<br />
O mesmo pode ser dito da construção do movimento nas coreografias de Alejandro Ahmed.<br />
Além de uma série de contaminações, o seu corpo precisou aprender e desenvolver uma<br />
maneira de se movimentar e <strong>dança</strong>r com base em sua fragilidade óssea.<br />
A discussão sobre o corpo que <strong>dança</strong> como um representante de sua situação cultural vai<br />
encontrar subsídios na Teoria Evolutiva, abordada a seguir.<br />
o corpo como lugar de trânsito ou o corpo como mídia<br />
Como nos alerta o biólogo William Durham, antes de mais nada, convém esclarecer, ao<br />
contrário da crença e do uso popular, três coisas que a evolução não é: “[...] progresso<br />
ou melhora (é simplesmente mu<strong>dança</strong> cumulativa e transmissível); seleção genética ou ‘a<br />
teoria de Darwin’ (são, ao invés, idéias sobre os mecanismos de evolução num contexto<br />
específico, a saber, evolução orgânica); ou uma propriedade exclusiva <strong>dos</strong> sistemas<br />
genéticos (onde muitas coisas podem e estão envolvidas)” (DURHAM, 1991, p.21). 3<br />
Foi o naturalista e biólogo inglês Charles Darwin (1809-1882) o responsável por uma polêmica<br />
que dura até hoje, ao publicar seus 30 anos de pesquisas em On the Origin of Species, em 24<br />
de novembro de 1859. O principal motivo de tamanha perturbação foi a sua sugestão de que<br />
seres humanos e chimpanzés dividiam a mesma ancestralidade e que qualquer espécie viva<br />
poderia transformar-se ao longo do tempo devido ao acúmulo de pequenas mu<strong>dança</strong>s.<br />
Apesar das resistências e mal-entendi<strong>dos</strong>, os estu<strong>dos</strong> de Darwin, como podemos perceber<br />
hoje, têm sido extremamente profícuos. Uma quantidade enorme de pesquisas dentro da<br />
genética moderna, etologia, biologia, paleontologia, psicologia, sociologia, antropologia,<br />
das ciências cognitivas e, agora, da cultura vêm demonstrando muitas de suas hipóteses.<br />
Numerosos são os livros, artigos e pesquisas aos quais os neodarwinistas vêm se dedicando<br />
ao longo das últimas décadas. Há um grande debate em torno do assunto. Uma das<br />
3 “[...] progress or<br />
improvement (it is simply<br />
cumulative and transmissible<br />
change); genetic selection<br />
or ‘Darwin’s theory’ (these<br />
are instead ideas about the<br />
mechanisms of evolution in<br />
a specific context, namely,<br />
organic evolution); or an<br />
exclusive property of genetic<br />
systems (many things can<br />
and do evolve)” (DURHAM,<br />
1991, p. 21).<br />
4 “An information pattern,<br />
held in na indiviual’s memory,<br />
which is capable of being<br />
copied to another individual’s<br />
memory” (HEYLIGHEN, 1998).<br />
Conforme artigo disponível<br />
no endereço eletrônico http://<br />
pespmc1.vub.ac.be/MEMES.<br />
html.<br />
teorias mais discutidas, surgida na década de 1970, trabalha no sentido de relacionar os<br />
estu<strong>dos</strong> genéticos (submeti<strong>dos</strong> à ação da evolução) aos estu<strong>dos</strong> da cultura, utilizando<br />
princípios semelhantes ao da evolução biológica. Da mesma forma que há a Teoria da<br />
Evolução das Espécies, segundo estes autores, entre os quais destacamos Richard Dawkins<br />
(1941), haveria analogamente a Teoria da Evolução Cultural.<br />
O biólogo neodarwinista Richard Dawkins publicou em 1976 The Selfish Gene (O Gene<br />
Egoísta), em que explora a validade da Teoria da Evolução proposta por Darwin e funda<br />
o conceito de meme, como se vê a seguir. Para realizar isso, desenvolve uma reflexão<br />
em torno da complexificação da vida: do caldo biótico, na origem da vida, com átomos<br />
flutuando, perdi<strong>dos</strong>, e que vão, por agrupamento, tornando-se cada vez mais complexos,<br />
passando pelos constituintes básicos para gerar a formação da enorme variedade de seres<br />
vivos que se conhece hoje e mesmo <strong>dos</strong> que já estão extintos. A evolução, através da<br />
Seleção Natural, sempre foi uma parceira, regente cega, neste caminho.<br />
Para Dawkins, “a unidade fundamental da seleção e portanto do interesse próprio não<br />
é a espécie, nem o grupo, nem mesmo o rigor do indivíduo: é o gene, a unidade da<br />
hereditariedade” (Dawkins, 1989, p.31).<br />
Desta forma, o biólogo lançou o conceito de meme como a unidade mínima da informação<br />
cultural, semelhante ao gene, a unidade mínima da informação biológica. Tal qual os<br />
genes, que são moléculas replicadoras, os memes são os replicadores da informação.<br />
“O novo caldo é o caldo da cultura humana. Precisamos de um nome para o novo<br />
replicador, um substantivo que transmita a idéia de uma unidade de transmissão cultural,<br />
ou uma unidade de imitação. ‘Mimeme’ provém de uma raiz grega adequada, mas quero<br />
um monossílabo que soe um pouco como ‘gene’. Espero que meus amigos helenistas me<br />
perdoem se eu abreviar mimeme para meme. [...] Da mesma forma como os genes se<br />
propagam no ‘fundo’ pulando de corpo para corpo através <strong>dos</strong> espermatozóides ou <strong>dos</strong><br />
óvulos, da mesma maneira os memes propaguem-se no ‘fundo’ de memes pulando de<br />
cérebro para cérebro por meio de um processo que pode ser chamado, no sentido amplo,<br />
de imitação” (DAWKINS, 1989, p.214).<br />
Na definição de Heylighen (1998) meme seria “um padrão de informação, contido em<br />
uma memória individual, que é capaz de ser copiado para outra memória individual”<br />
(HEYLIGHEN, 1998). 4<br />
Se o gene é “um pedaço de cromossomo, curto o bastante para durar, potencialmente, o<br />
suficiente para funcionar como uma unidade significante da seleção natural” (DAWKINS,<br />
1989, p.57), meme seria um pedaço mínimo de informação cultural suficiente para ser<br />
propagado e contaminar outros cérebros. Na continuidade das idéias, se os padrões<br />
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