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Nos movimentos, as articulações são premiadas com quebras e ondulações. O corpo<br />
estabelece apoios como mãos, joelhos, quadris, ombros, cabeça, corpo do outro, além<br />
<strong>dos</strong> pés. Pegadas que procuram encaixes entre partes do corpo de seus parceiros.<br />
Quedas e rolamentos. Exploração das passagens entre os níveis baixo, médio e alto. A<br />
movimentação vai devagarzinho ganhando distância de suas fontes formadoras, que<br />
neste caso são o jazz, o break e o balé clássico. O espaço da platéia, bem como o espaço<br />
aéreo do palco, é ocupado. Parte da trilha sonora é executada ao vivo. O risco e a violência<br />
são trata<strong>dos</strong> como motivos coreográficos. Textos e poesias são microfona<strong>dos</strong>. Sonoridades<br />
são articuladas com o movimento. Exploração de limites. Efeitos para chamar a atenção.<br />
O uso das mídias e tecnologias integra a estética e dá forma ao movimento. Carne viva.<br />
Violência e ternura.<br />
A violência e a ternura aparecem nos corpos que se chocam. A guitarra acelera os corpos<br />
que se dinamizam em paradas de mão, pequenos saltos, molejos, gritos, quebras de<br />
articulações. Música clássica de Vivaldi para movimentos de jazz, paradas de mão e<br />
quedas, rolamentos, linhas do balé que se quebram, pegadas e giros. Os bailarinos saem<br />
do palco andando. Mais subversões.<br />
A Quem a Criatividade Possa Interessar aconteceu como uma espécie de coreografia-<br />
estudo que coabitou com a criação e a montagem do espetáculo Respostas sobre Dor.<br />
Por isso, encontramos muitas similaridades entre eles. De acordo com o programa, o<br />
espetáculo foi dividido em seis cenas. Dramaturgicamente, as respostas sobre dor passam<br />
pela introdução (I), descoberta (II), descrição (III), solidão por excesso de ausência (IV),<br />
sensação e prazer (V) e, por fim, página em branco (VI).<br />
Em termos evolutivos, Respostas sobre Dor expande<br />
A Quem a Criatividade Possa Interessar. Corredor do<br />
teatro e palco são ocupa<strong>dos</strong> ao mesmo tempo quando<br />
o espetáculo inicia. Bailarino entra pelo lugar do<br />
público para subir ao palco. Surgem os figurinos que<br />
se parecem com roupas do dia-a-dia: vesti<strong>dos</strong>, calças<br />
e camisas. Uma canção de Marisa Monte embala a<br />
abertura: “Se ela me deixou, a dor é minha só não é de<br />
mais ninguém. Aos outros eu devolvo a dó”.<br />
Outros figurinos fazem referência às roupas de<br />
sadomasoquismo, especialmente àquelas utilizadas<br />
em Laranja Mecânica (A Clockwork Orange), filme de<br />
Stanley Kubrick (1928-1999) de 1971. “Figurino sensual, cuidado com os cabelos, tapa-seios,<br />
suspensórios, shorts e botas pretas. Violência, gritos e sons produzi<strong>dos</strong> pela voz e pelos pés.<br />
Influências clássicas nas piruetas. Luzes piscando por trás do cenário de radiografias. Muitas<br />
1 Conforme descrição<br />
realizada pela autora, durante<br />
apresentação do espetáculo<br />
Respostas sobre Dor, dentro<br />
do Projeto TAC Seis e Meia.<br />
Teatro Álvaro de Carvalho,<br />
Florianópolis, 1995.<br />
vozes ao mesmo tempo. Rápido e difícil de assimilar. Ao mesmo tempo, suave e grotesco.<br />
Doído. Índia Mendes e Alejandro Ahmed <strong>dança</strong>m tentando expulsar a dor. Na maquilagem,<br />
lágrimas negras em caminhos de espinhos.” 1 (GUTIERREZ, 1998)<br />
A cena se reorganiza com o músico Eduardo Serafin tocando baixo, a cantora Hedra<br />
Rockenbach ao microfone, o bailarino Alejandro Ahmed com sua poesia microfonada.<br />
Bailarinas falam ao microfone do fundo do palco, ao lado do cenário de radiografias.<br />
Bailarino vindo da coxia corta o espaço aéreo pendurado numa corda. Muitas coisas<br />
acontecem ao mesmo tempo, mostrando simultaneidade de acontecimentos, uma questão<br />
do mundo contemporâneo. O ambiente se transforma. Vozes, sonoridades e movimentos<br />
se sobrepõem. Constroem camadas.<br />
A descrição acima nos faz constatar a preocupação com um conjunto de detalhes, que passam<br />
pelo movimento, pelo cenário, pela pintura do rosto, pelo cuidado com a escolha do figurino. É o<br />
Cena 11 fazendo a sua seleção, aquilo que vai compor o seu universo de escolhas, o seu subsistema<br />
dentro do sistema maior chamado <strong>dança</strong>. Tudo com o objetivo de transmitir, com to<strong>dos</strong> esses<br />
recursos de comunicação, a idéia da violência da dor. Quem assistir ao registro deste trabalho<br />
poderá constatar que a composição das cenas, bem como o desenrolar de suas diversas ações,<br />
foi projetada e elaborada com cuidado para organizar um ambiente coerente de idéias. Como<br />
se sabe, em <strong>dança</strong>, tempo e espaço são eixos fundamentais de consideração. Em que momento<br />
acontecerá tal ação? Em que lugar do espaço? De que forma o corpo se manifestará no tempo<br />
e no espaço? A irrupção dessas perguntas, em cada ponto durante a construção do espetáculo,<br />
começa a ser traduzida numa estrutura de rede, onde há conectividade e simultaneidade.<br />
56 Reprodução do programa criado por Fernando Rosa para o espetáculo Respostas Sobre Dor.<br />
Figurinos remetem-se ao filme Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick.<br />
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